Felicidade se aprende?
Ser feliz é ter prazer em pequenos momentos do dia a dia, com uma percepção mais profunda de passado, presente e futuro
Vivemos uma alarmante crise de saúde mental, com aumento expressivo nos registros de depressão, ansiedade e casos de síndrome de burnout. Assistimos, estarrecidos, ao crescimento de casos de violência motivada por ódio e perseguição, em um contexto de imediatismo, pressão por correspondência a padrões sociais e likes. À primeira vista, podemos considerar que as pessoas não estão satisfeitas: falta felicidade.
O dicionário explica a felicidade como "estado de espírito de quem se encontra alegre ou satisfeito" ou ainda como "acontecimento ou situação feliz ou alegre". Mas será que a felicidade é apenas momentânea, fugaz?
Segundo a definição da escritora norte-americana Sonja Lyubomirsky, autora do livro "A Ciência da Felicidade", ser feliz passa pela experiência de alegria, contentamento e bem-estar. Mas vai além, combinando uma sensação de que a vida é boa, tem sentido e propósito e que, então, vale a pena. Portanto, uma percepção – e não uma sensação – mais ampla, que mistura um componente afetivo e emocional a um componente cognitivo, de avaliação da vida.
Se percebida como uma emoção apenas, a felicidade tende a ser passageira. Graças a um fenômeno chamado "adaptação hedônica", mesmo que consigamos alcançar o padrão que idealizamos para a "vida perfeita", a tendência é que em muito pouco tempo deixaremos de achar aquele ideal tão perfeito assim. E, por consequência, a vida até então feliz deixa de trazer satisfação.
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Como tudo o que envolve nossa parte cognitiva, em tese, pode ser moldado ou construído, sim, a felicidade pode ser desen- volvida e aprendida, de forma a influenciar o nosso dia a dia.
Ao contrário de como pensa a maioria das pessoas, ser feliz é mais amplo do que apenas "estar" alegre: é ter prazer em pequenos momentos do dia a dia, com uma percepção mais profunda de passado, presente e futuro.
A felicidade não pode ser limitada à crença inconsciente de paraíso, um lugar ou momento perfeito. Ela está muito mais ligada à maturidade: parar de lutar contra os acontecimentos da vida, aceitar o protagonismo que temos sobre ela e exercer as melhores escolhas possíveis, com ações concretas em direção a uma vida melhor.
Além disso, a prática da gratidão, de forma constante, também nos ajuda a combater o viés da negatividade e a criar conexões neurais mais positivas.
Ao ouvir uma música ou ao sentar para brincar com os filhos, realizamos pequenas mudanças em direção a uma vida melhor.
Ao decidir construir um futuro melhor, nos direcionamos à evolução com pequenas ações que nos tornam melhores e melhoram a nossa percepção da realidade, do contexto à nossa volta. É acreditar que, se pudermos ser 1% melhor a cada dia, ao final de um mês teremos, por exemplo, 30% de melhora.
Nesse processo, é importante aceitar que às vezes as coisas não saem como queremos. Sob este prisma, aceitamos que não temos o melhor trabalho do mundo, mas assumimos que ele ajuda a pagar contas e ter uma vida melhor.
Vencemos a ditadura do "ou" e deixamos de lado a crença de que "ou eu moro na praia ou sou feliz em meu casamento". Devemos abraçar a genialidade do "e", enfrentando desafios com uma postura otimista e moldando os dias para uma vida mais plena.
PEQUENAS ATITUDES
São três os principais fatores que nos ajudam a construir a percepção de felicidade e que, sim, podem ser aprendidos: primeiro, as circunstâncias da vida, ou seja, a forma como percebemos a vida hoje. Posso olhar ao meu redor e tentar ser mais grato?
No segundo ponto, temos a influência da genética, um fator que determina se seremos mais propensos à extroversão ou a reclamar demais. Em um terceiro ponto, onde mora a maior oportunidade para evoluir, estão nossas escolhas e comportamentos.
Pequenas ações do dia a dia mudam completamente nossa visão. Como o cérebro é incapaz de perceber uma relação de causa e efeito em processos muito prolongados, precisamos focar no agora.
Hoje posso escolher beber dois litros de água, como orientam os nutricionistas. E, ao final de 30 dias, devo perceber uma melhora na pele, no cabelo. Ao final de 30 anos, uma saúde melhor me aguarda.
Se quero mais saúde, qual foi a ação saudável que pratiquei hoje? Se hoje eu decidir comer duas frutas por dia, já estou mudando minha vida. Se me compro- meto a fazer três caminhadas de cinco minutos cada, ao longo de minha rotina de trabalho, estou mudando o meu dia.
Como obter 1% a mais de leveza? Ao ouvir uma música ou ao sentar para brincar com os filhos, realizamos pequenas mudanças em direção a uma vida melhor, por que a vida boa acontece com pequenas e constantes boas escolhas.
Podemos construir uma vida mais feliz a partir de agora, sem condicioná-la à validação constante. Como protagonistas de nosso próprio bem-estar, temos o poder de mudar nossas conexões neurais e nosso cérebro, que é altamente plástico, molda-se rapidamente à forma como escolhemos enxergar o mundo.
A construção do equilíbrio mental e do bem-estar contínuo é uma escolha que depende de cada um e pode ser desenvolvida com atitudes positivas. Se buscarmos enxergar um "pontinho de luz", mesmo nos dias mais sombrios, perceberemos que ele sempre estará lá.