Carne cultivada em laboratório nem chegou e já está sendo cancelada

Legisladores dos EUA e da Europa estudam legislações que podem até proibir a carne cultivada

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Dee-Ann Durbin 3 minutos de leitura

Neste momento, a carne cultivada em laboratório não está disponível em nenhum supermercado nem restaurante dos EUA. E se alguns parlamentares conseguirem o que querem, ela nunca vai estar.

Os EUA aprovaram a venda de carne cultivada em laboratório pela primeira vez em junho de 2023, permitindo que duas startups da Califórnia, a Good Meat e a Upside Foods, vendessem frango cultivado. 

Dois restaurantes sofisticados adicionaram os produtos em seus cardápios por um curto período. Algumas empresas de carne cultivada começaram a expandir a produção. Um dos produtos da Good Meat chegou a ser vendido em uma mercearia em Cingapura.

Mas logo os políticos começaram a pisar no freio. Legisladores de sete estados estão tentando aprovar uma legislação que proibiria a carne cultivada, de acordo com Kim Tyrrell, diretor associado da Conferência Nacional de Legislaturas Estaduais.

O Senado dos EUA apresentou um projeto de lei em janeiro para proibir o uso de carne cultivada em laboratório nos programas de merenda escolar. E esse tipo de reação não se limitou aos EUA. A Itália proibiu a venda de carne cultivada em laboratório no final do ano passado. Os legisladores franceses também apresentaram um projeto de lei para proibi-la.

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A rejeição está ocorrendo apesar de a carne e os frutos do mar cultivados em laboratório estarem longe de chegar ao mercado de forma significativa, devido ao fato de sua produção ser muito cara. 

Os produtos cultivados são produzidos em tanques de aço usando células de um animal vivo, um óvulo fertilizado ou um banco de armazenamento. As células são alimentadas com misturas especiais de água, açúcar, gorduras e vitaminas. Depois de crescidas, elas são transformadas em costeletas, nuggets ou outros formatos.

As empresas têm se concentrado muito na produção em escala, visando reduzir os custos e obter a aprovação do governo para vender seus produtos. Agora, elas também estão tentando descobrir como reagir às proibições estaduais. A Upside Foods lançou uma petição no Change.org, convidando os simpatizantes a “clamar aos políticos que parem de patrulhar seu prato”.

“É uma pena que eles estejam nos cancelando antes mesmo de entrarmos no mercado”, disse Tom Rossmeissl, chefe de marketing global da Good Meat. Os defensores das proibições dizem que querem proteger os agricultores e os consumidores. A carne cultivada existe há apenas uma década, dizem eles, e há preocupações com relação à sua segurança para consumo humano.

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Mas os integrantes do setor de carne cultivada afirmam que seus produtos devem passar por rigorosos testes de segurança do governo antes de serem colocados à venda. Segundo eles, o setor ainda é incipiente e não está tentando substituir a carne, mas sim buscar maneiras de atender à crescente necessidade de proteína do mundo.

Segundo o executivo da Good Meat, os EUA lideram o esforço para desenvolver carne e frutos do mar cultivados, com 45 empresas no setor. Mas isso pode mudar. Em janeiro, por exemplo, uma empresa israelense recebeu aprovação preliminar para vender os primeiros bifes do mundo feitos de carne bovina cultivada. A China também está investindo pesadamente em carne cultivada em laboratório.

A carne cultivada existe há apenas uma década e há preocupações com relação à sua segurança para consumo humano.

Rossmeissl acredita que o setor de carnes está tentando evitar o mesmo que ocorreu com o de laticínios depois da introdução de alternativas à base de plantas, como o leite de aveia. O leite vegetal representou 15% das vendas de leite nos EUA no ano passado, um aumento em relação aos 6% de uma década atrás, de acordo com o Departamento de Agricultura dos EUA e o Good Food Institute.

Os produtores de carne apoiaram as proibições nos estados da Flórida e do Alabama. Os líderes das associações de pecuaristas desses estados estavam ao lado dos dois governadores quando eles sancionaram as leis.

Mas, nos EUA, o cenário é mais complicado no nível nacional, onde o setor de carnes não apoia a proibição de produtos cultivados. Alguns produtores de carne, como a JBS Foods, estão, inclusive, trabalhando no desenvolvimento de sua própria carne cultivada.

“Não defendemos o caminho da proibição total desses produtos”, declarou Sigrid Johannes, diretora de assuntos governamentais da National Cattlemen's Beef Association (a associação nacional dos pecuaristas dos EUA). “Não temos medo de competir com esses produtos no mercado.”


SOBRE A AUTORA

Dee-Ann Durbin é repórter especializada em indústria alimentícia na Associated Press. saiba mais