Cannes Lions 2024 | Deh Bastos

Deh Bastos é diretora executiva de criação na MAP Brasil

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Redação Fast Company Brasil 5 minutos de leitura

As marcas sempre ditaram conversas e criaram tendências. Agora, também respondem às demandas da sociedade, principalmente em relação a uma pauta ESG. Como você enxerga o papel de agências e empresas na promoção de uma sociedade mais justa e sustentável?

Essa é uma pergunta de milhões. Será que, na verdade, as marcas ditam as conversas ou elas também respondem ao que o público conversa? Toda uma sociedade foi moldada por meio da mídia, quando o nosso modelo de comunicação era diferente, quando a mídia era responsável pela mensagem. Acho que com a democratização da informação, com o uso da internet, essa relação mudou.

Tem o contrário também. Há muita pressão da sociedade que acaba refletindo no mercado. Isso ainda é feito de forma muita rasa. Ainda vemos essas conversas serem levantadas, mas não vemos ações estruturadas e duradouras.

O que eu espero é que a gente tenha cada vez mais pessoas em posição de alta liderança, com poder para fazer mudança, com o letramento real, pessoas menos impulsionadas pelas tendências, pela pressão social e muito mais porque elas de fato entenderam quais são as questões estruturais.

Como ESG, por exemplo, inclusive com todas as suas siglas, inclusive do meio ambiente, da sociedade, da governança, como ESG precisa fazer parte dos resultados e não só de um pedaço da conversa.

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Como você mede o impacto de uma campanha em termos de sustentabilidade e justiça social? Quais são os maiores desafios que as marcas enfrentam ao tentar alinhar suas operações com objetivos socioambientais?

Esse é um desafio de todos os mercados, é um desafio global: como mensurar impacto. Temos um desafio de colocar impacto dentro do modelo de negócio, seja qual for o modelo de negócio. Mas como podemos tangibilizar isso, transformar em métrica e em resultado, há uma grande dificuldade de mensurar impacto.

Sou uma entusiasta da comunicação, uma apaixonada pela comunicação. Acredito que a comunicação pode ajudar a resolver muitos problemas que a gente tem. A comunicação muda as relações e as relações mudam as pessoas e as pessoas mudam o mundo. Eu de fato acredito nisso. Acho que o poder de uma campanha é justamente o de propagar, o poder do alcance.

Temos uma falsa sensação de que todo mundo tem internet, de que todo mundo está na internet, de que todo mundo faz parte da nossa bolha. Em um país como o nosso, de dimensões continentais, há muitos lugares em que a informação só chega através da comunicação de massa, só chega por meio de uma campanha que passa na televisão, que chega aos meios digitais, que chega em lugares onde essas conversas que a gente está tendo sobre sustentabilidade, sobre justiça social, não chegam.

Então quando eu paro para pensar qual é o poder que a gente tem na mão enquanto marketing, enquanto comunicação, enquanto publicidade, é sem dúvida nenhuma o poder do alcance. Como fazemos uso desse poder de forma que a mensagem impacte socioambientalmente pessoas e lugares. 

Acredito que educação é o único caminho. Cada vez mais pessoas em alta liderança, com poder e que têm o letramento, o letramento racial, o letramento sobre justiça climática. As pessoas que de fato têm um entendimento, que se dispõem a estudar, entender o que está acontecendo, quais os desafios e como que a gente consegue juntar isso aos nossos modelos de negócio. Porque como que a gente consegue transformar isso em algum tipo de impacto para os nossos resultados enquanto modelo de negócio.

Como você vê o futuro da publicidade em um contexto de maior demanda por práticas socioambientais? 

Futuro é uma coisa complexa. Eu acho que tem uma máxima dos estudos sociais que dizem que a gente precisa de uns 200 anos para fazer uma evolução social. Certamente não estavam contando com a internet. Temos avanços nos últimos cinco, nos últimos dez anos que a gente não teve nos últimos cem.

Tem uma amiga minha, Tati Fávaro, jornalista, que sempre diz que nós somos uma geração de transição. Eu acho que isso serve para qualquer coisa. Nós somos exatamente a transição, entre essa publicidade tradicional, esse modelo tradicional de mídia, para esse novo modelo, que é o modelo que vai flertar com o digital, o modelo de uma troca de informação muito mais do que uma informação dada. Isso vai mudar completamente a forma de consumo.

Na minha opinião, este modelo tradicional de publicidade está fadado ao fracasso em algum tempo. Não acho que esse tempo seja o tempo da nossa existência. Talvez eu não veja grandes mudanças como o profissional atuando ainda, mas para as próximas gerações eu tenho certeza que o formato será diferente. O formato terá muitas trocas, muita otimização, com pessoas mais conscientes. Boto fé nessa molecada que está vindo aí, que já não aceita muita coisa, que faz muita coisa com muito mais simplicidade.

Acho que essa galera vai ter práticas socioambientais porque vai ter mais consciência sobre o seu papel. Porque não foi moldado nesse modelo tradicional que nós publicitários fomos. Estou com 40 anos e, apesar de cansada, levo a sério demais um ditado erubá que diz que a esperança é o pilar do mundo.

Tenho esperança nessa molecada que continua amando muito a comunicação, a publicidade tanto quanto eu, tanto quanto a minha geração, mas que a vê de outro jeito. Muito mais simples, muito mais dinâmico, com um custo muito menor, de um jeito muito mais coletivo, com muito menos hierarquia e menos controle. Eu acho que esse é o futuro e eu estou ansiosa para assisti-lo.


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