Um polvo pode ser o segredo para proteger sua pele do sol
Cientistas descobriram que a substância química que os polvos usam para mudar de cor pode ajudar a melhorar os protetores solares – sem prejudicar os corais
Se você viajar para Maui, não poderá comprar – ou usar – protetores solares químicos enquanto estiver lá. A ilha foi uma das primeiras a proibir esses produtos em 2022, após estudos sugerirem que alguns dos ingredientes poderiam prejudicar recifes de corais, peixes, golfinhos e outros seres marinhos.
Estima-se que até 14 mil toneladas de protetor solar acabem nos oceanos a cada ano, quando as pessoas nadam ou mergulham com snorkel. Os produtos químicos também podem chegar ao mar quando tomamos banho. Estudos indicam que alguns deles podem, inclusive, prejudicar a saúde humana.
Uma alternativa “segura para os recifes” é o protetor solar de óxido de zinco. No entanto, por ser feito de um mineral branco, pode deixar a pele com um aspecto esbranquiçado e pouco atraente.
Cientistas da Northeastern University, nos EUA, desenvolveram um novo ingrediente que resolve esse problema, tornando o protetor solar incolor e oferecendo mais proteção. A inspiração veio de uma fonte improvável: polvos e lulas.
[Photo: Matthew Mondoono/Northeastern University]
“Estávamos fazendo pesquisas sobre cefalópodes – polvos, lulas e chocos – para entender como eles conseguem se camuflar tão rapidamente”, conta Camille Martin, que começou o estudo enquanto fazia doutorado em química. Os pesquisadores descobriram uma molécula-chave na pele desses animais que os ajuda a mudar de cor.
Essa molécula era particularmente eficaz em absorver e dispersar a luz solar. Leila Deravi, professora que dirige o laboratório, trabalhou com Martin para explorar como poderiam utilizá-la de outras formas.
Pesquisadores descobriram uma molécula-chave na pele dos animais que os ajuda a mudar de cor. Essa molécula era eficaz em absorver a luz solar.
“Descobrimos que era superfotostável”, afirma Deravi, o que significa que não se degrada quando exposta à luz solar. “Submetemos o composto a várias luzes e condições de processamento diferentes e percebemos que, nas bandas espectrais UV e na luz visível, a molécula se mantinha estável, independentemente de como a manipulávamos.
Na época, por volta de 2019, havia muitas notícias sobre a fotoinstabilidade dos produtos químicos em protetores solares – e a toxicidade induzida pela luz. Pensamos: ‘isso pode ser um avanço para a indústria’.”
Elas fundaram uma startup chamada Seaspire para desenvolver mais o ingrediente – a empresa não o obtém de animais, fabrica uma versão sintética idêntica, chamada “Xantochrome”. Quando adicionado ao óxido de zinco, “nossa formulação permite alcançar um acabamento invisível em todos os tons de pele”, explica Martin, agora CEO da Seaspire.
[Photo: Matthew Mondoono/Northeastern University]
O ingrediente é naturalmente marrom, o que neutraliza o branco do óxido de zinco; futuros produtos também podem aproveitar a capacidade de mudança de cor do composto. O protetor solar aumenta a proteção UV do óxido de zinco em 28%.
\Além disso, oferece proteção contra a luz visível, que não causa câncer de pele, mas pode causar outros problemas, como hiperpigmentação e rosácea. É também um antioxidante, e estudos da empresa mostram que pode ajudar a aumentar a produção de colágeno e a hidratar a pele.
Em um novo estudo, cientistas comprovaram que o ingrediente não danifica nem descolore corais. Outros estudos mostram que ele não é um disruptor endócrino, o que significa que não interfere nos sistemas hormonais humanos.
Alguns compostos comuns em protetores solares, como a oxibenzona, são disruptores endócrinos e podem aumentar o risco de câncer e outros problemas de saúde, como gestações mais curtas.
A startup está negociando com fabricantes de protetores solares o licenciamento de seu produto. Os fabricantes claramente estão procurando maneiras de tornar suas fórmulas mais seguras – o número de protetores solares não minerais que contém oxibenzona, por exemplo, caiu de 60% em 2019 para apenas 13% no ano passado.
A empresa química BASF parou de fabricar octocrileno, um ingrediente que se degrada e se torna um disruptor endócrino e carcinogênico. Quando anunciou a descontinuação em 2021, a multinacional afirmou que estava “ouvindo as preocupações crescentes” e observou que o interesse em protetores solares de óxido de zinco estava “aumentando na América do Norte”.