Nova arma para combater a poluição: cogumelos que “comem” químicos tóxicos

Micorremediação – o uso de fungos para decompor contaminantes – se mostrou promissora, mas ainda tem um longo caminho pela frente

Créditos: Pawel Czerwinski/ Timothy Dykes/ Unsplash

Rebecca McCray 4 minutos de leitura

Há 15 anos, Danielle Stevenson, então secretária de agricultura urbana de Victoria, no Canadá, se propôs a ajudar as escolas públicas da cidade a criar hortas. Mas encontrou um grande problema: o solo estava contaminado com chumbo e outros metais, o que tornava o cultivo de alimentos perigoso. O projeto, então, teve que ser interrompido.

O problema da toxicidade do solo despertou a curiosidade de Stevenson. Isso a levou a se dedicar integralmente ao desenvolvimento de métodos ecologicamente regenerativos para descontaminação. Agora, como toxicologista ambiental e micologista, uma de suas ferramentas favoritas são os fungos.

Stevenson é especialista em um campo ainda pequeno, mas em expansão, conhecido como micorremediação, que envolve o uso de micélio para restaurar a saúde do solo ou da água. Certos fungos podem “comer” toxinas; seus micélios produzem enzimas que conseguem decompor alguns plásticos, petróleo e metais pesados.

Micélios são redes subterrâneas de filamentos fúngicos e o potencial desse sistema está sendo explorado em alternativas ao couro e ao plástico, materiais de construção e substitutos de carne.

Embora a aplicação da micorremediação na agricultura mostre grande potencial, ainda existem muitos obstáculos para implementar o método em larga escala. “Muitos estudos já foram realizados, mas em laboratórios e em uma escala muito pequena”, explica Stevenson.

Um desses projetos promissores em pequena escala ocorreu em 2021, no Condado de Marathon, em Wisconsin, nos EUA, liderado pelo departamento de resíduos sólidos local.

Alex Thomas, especialista em compostagem e resíduos perigosos, foi procurado por uma oficina que havia derramado fluido de refrigeração em todo seu estacionamento de cascalho e precisava de ajuda para a limpeza. Thomas e seus colegas estavam esperando por uma oportunidade para testar a micorremediação – e o solo contaminado do estacionamento era a chance perfeita.

Um produtor local interessado em micorremediação, Jerome Segura, doou blocos de cogumelos-ostra azul e rosa que já haviam sido colhidos para o projeto. Esses blocos, que contêm o substrato orgânico onde os cogumelos crescem e o micélio que sobra após a colheita, são um subproduto residual da produção.

Crédito: ttsz/iStock

A equipe espalhou os blocos sobre o solo contaminado que havia sido removido do estacionamento e os dividiu em três lotes: um com cogumelos-ostra rosa, outro com cogumelos azuis e um sem cogumelos. Eles ficaram entusiasmados ao encontrar uma redução de 96% no resíduo de óleo no lote com cogumelos azuis e 60% no lote com os cogumelos rosa.

“Isso mostra que este é um método de campo relativamente simples que, com mais algumas verificações e uma abordagem sistemática, pode se tornar uma solução viável para tratamento in loco ou, no mínimo, uma opção muito econômica para tratar derramamentos de hidrocarbonetos”, explica Thomas. “Este é um ótimo exemplo de como podemos usar resíduos para resolver problemas existentes.” 

A micor- remediação mostra grande potencial, mas ainda existem muitos obstáculos para implementar o método em larga escala.

Alguns dos maiores estudos que Stevenson viu são os seus próprios: como parte de sua pesquisa de doutorado, ela identificou plantas nativas crescendo em locais poluídos em Los Angeles e as plantou junto com fungos simbióticos, que já haviam se mostrado eficazes na remoção de cádmio e chumbo do solo, em três terrenos industriais de 1,2 hectare cada.

O estudo, que durou um ano, mostrou uma redução nos níveis de metais pesados e petroquímicos no solo, graças à combinação de fito e micorremediação. Embora os resultados sejam promissores, Stevenson ressalta que o estudo precisa ser replicado, testado mais a fundo e ampliado.

Um dos obstáculos que ela enfrenta frequentemente são as agências reguladoras, que inicialmente dificultaram seu projeto em terrenos industriais. A falta de métodos amplamente comprovados também dificulta a experimentação com micorremediação em fazendas.

“As pessoas que possuem ou administram essas terras não querem tentar algo que ainda não foi comprovado, mesmo que possa realmente resolver o problema, melhorar a saúde do solo, trazer todos esses outros benefícios e ainda ser muito mais barato do que qualquer outro método de remediação”, diz Stevenson.

    Ainda assim, ela se mantém otimista, e a comunidade de micologistas, produtores de cogumelos e entusiastas continua avançando na América do Norte e ao redor do mundo. Na Alemanha, o micologista Dietmar Schlosser vem estudando há duas décadas como plantas e fungos podem degradar poluentes ambientais e tem percebido um aumento gradual no interesse por este campo nos últimos anos.

    “Os fungos são organismos extremamente poderosos e estamos apenas começando a entender seu potencial”, afirma Segura. “Imagine o que poderemos fazer quando entendermos esses processos e conseguirmos replicá-los em larga escala.”

    Este artigo foi publicado originalmente pela “Ambrook Research", publicação independente sobre sustentabilidade.


    SOBRE A AUTORA

    Rebecca McCray é colaboradora do site Ambrook Research. saiba mais