Campanha da Adobe joga gasolina na fogueira da disputa entre criativos e IA

Ação de marketing que parece sugerir que a IA pode substituir os fotógrafos provoca reações fortes entre profissionais de criação

Crédito: Anton Vierietin/ iStock

Rob Walker 4 minutos de leitura

Em uma recente carta aberta à Adobe, a American Society of Media Photographers acusou a fabricante do Photoshop de uma "surpreendente desconsideração pela fotografia e pelos fotógrafos que dedicaram suas vidas a criá-la."

O problema mais evidente é a linguagem usada recentemente no marketing da Adobe para o Photoshop. Mas, olhando um pouco mais a fundo, esse conflito também parece ser o mais recente indicador de uma disputa inspirada pela IA entre criativos e empresas de tecnologia, que vem se intensificando há meses.

O problema começou com uma página no site da Adobe que promovia o recurso "gerar fundo" do Photoshop. "Pule a sessão de fotos. Adicione ou substitua um fundo que corresponda à iluminação, sombras e perspectiva do seu personagem central", dizia. Tudo em alguns passos dentro do software.

O fotógrafo Clayton Cubitt postou uma captura de tela no X com o comentário sarcástico: "Tão feliz como fotógrafo por ter dado dezenas de milhares de dólares à Adobe apenas para vê-la pivotar para vender 'pule a sessão de fotos'." O texto foi removido do site.

"Eles poderiam ter escolhido um texto que dissesse 'aprimore sua sessão de fotos' ou 'aproveite mais sua sessão de fotos'", disse uma postagem no "The Nerdy Photographer".

Mas o verdadeiro problema, argumentou o site de notícias de fotografia "PetaPixel", é que o marketing não era direcionado aos fotógrafos, e sim nos clientes deles. "A Adobe parece ansiosa para avançar sua IA a ponto de vender às empresas a criação de conteúdo que seja tão fácil quanto digitar pequenas frases em uma caixa de texto", acusa o site.

Logo após, veio a carta aberta da ASMP, organização comercial com 6,5 mil fotógrafos associados, enquadrando o marketing da Adobe como um "ataque" à profissão. "A Adobe deveria refletir seriamente sobre como descreve a fotografia e os fotógrafos e determinar se apoia esta indústria ou deseja ajudar na sua destruição", diz a ASMP.

Crédito: Andres Siimon/ Unsplash

Criativos de todas as áreas têm sentido a ameaça que a IA pode representar para seu sustento e notaram que gigantes da tecnologia e startups parecem ansiosos demais para priorizar seus próprios motivos comerciais.

O exemplo recente mais chamativo envolve a alegação de que a OpenAI pediu a Scarlett Johansson para usar sua voz na última versão do ChatGPT e, quando ela recusou, simplesmente lançou uma voz padrão semelhante à dela.

O uso de IA também foi um ponto importante nas greves dos roteiristas e atores de Hollywood. Mas a disputa sobre a linguagem de marketing da Adobe pode dar pistas sobre o futuro do debate, à medida que membros de várias profissões criativas – não apenas fotógrafos, mas também atores, escritores, músicos, ilustradores, equipes de arte de cinema e TV, e criativos de publicidade – percebem que o negócio da tecnologia está mudando de fabricar ferramentas úteis para criar rivais robóticos.

Essa tensão cultural pode até ajudar a explicar por que muitos reagiram de forma tão dura ao recente anúncio da Apple que mostrava ferramentas de criatividade sendo esmagadas em um único objeto tecnológico desumano.

BOAS INTENÇÕES?

A Adobe não quis comentar, mas em uma declaração ao PetaPixel disse que a empresa está "focada em aproveitar o poder da IA generativa para amplificar a criatividade e expressão humanas, não substituí-las." Novas inovações em IA significam "novos superpoderes para todos os usuários do Photoshop," segundo a empresa, e ajudam os profissionais a "eliminar tarefas comuns."

Em outros espaços, a Adobe tem se posicionado como continuando sua tradição de construir ferramentas para a

Criativos de todas as áreas têm sentido a ameaça que a IA pode representar para seu sustento.

criatividade. "Cada geração de tecnologia expandiu o número de usuários que podem usar nossos produtos para contar sua história," disse recentemente o CEO da Adobe, Shantanu Narayen, ao "The Washington Post". Isso inclui a IA, que "vai democratizar ainda mais a tecnologia," e "atrair um novo grupo de clientes."

Como outras empresas que promovem a IA, a Adobe sugeriu que a dinâmica em torno dessas ferramentas está mudando, independentemente de qualquer coisa. É por isso que construiu sua ferramenta de geração de imagem a partir de texto, chamada Firefly, e recentemente a integrou ao Photoshop (para alimentar recursos como a capacidade de "gerar fundo").

A IA generativa "é uma revolução," disse Scott Belsky, diretor de estratégia e vice-presidente executivo de design e produtos emergentes da Adobe, ao "The Wall Street Journal" em um artigo sobre fotógrafos de bancos de imagens que temem por seu sustento. "Esta é a nova câmera digital, e temos que abraçá-la."

A parte complicada será definir quem ele quer dizer com "nós" e se os criativos se sentirão incluídos nessa onda.


SOBRE O AUTOR

Rob Walker assina Brended, coluna semanal sobre marketing e branding. Também escreve sobre design, negócios e outros assuntos. saiba mais