Cientistas explicam o erro de design que impede a reciclagem do plástico

Em um mundo de consumo rápido e descartável, os plásticos duráveis não são uma vantagem, mas sim uma falha de design

Crédito: monticelllo/ iStock

Katherine Harry e Emma Rettner 4 minutos de leitura

Todos os anos, centenas de milhões de toneladas de plástico descartável vão parar em aterros sanitários. Mesmo a pequena porcentagem de plástico que é reciclada não vai permanecer em uso para sempre.

Nosso grupo de cientistas de materiais desenvolveu um novo método de criação e desconstrução de polímeros que pode resultar em plásticos mais facilmente recicláveis – e que não exijam que você separe cuidadosamente todo o lixo para reciclagem no dia da coleta.

Desde a invenção do material, há um século, as pessoas estão começando a entender os enormes impactos que os plásticos têm sobre a vida e o meio ambiente.

Como um grupo de cientistas de polímeros dedicados a inventar soluções sustentáveis para problemas do mundo real, nos propusemos a resolver esse problema repensando a maneira como os polímeros são projetados e fabricando plásticos com reciclabilidade incorporada.

POR QUE USAR PLÁSTICOS, AFINAL?

Itens de uso diário, como garrafas de leite, sacolas de supermercado, embalagens de comida para viagem e até cordas, são feitos de uma classe de polímeros chamada poliolefinas, que representa cerca de metade dos plásticos produzidos e descartados todos os anos.

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Esses plásticos são extremamente duráveis porque as ligações químicas que os compõem são altamente estáveis. Mas em um mundo criado para o consumo de uso único, isso já não é mais um recurso de design, pelo contrário: é uma falha de design.

Imagine se metade dos plásticos usados atualmente fosse duas vezes mais reciclável do que é agora. Embora isso não levasse a taxa de reciclagem a 100%, um salto de um dígito – atualmente em torno de 9% – para dois dígitos faria uma grande diferença nos plásticos produzidos, nos plásticos acumulados no meio ambiente e na capacidade de reciclagem e reutilização.

MÉTODOS DE RECICLAGEM QUE TEMOS

Nem mesmo os plásticos que chegam a uma instalação de reciclagem podem ser reutilizados exatamente da mesma forma que eram usados antes. O processo de reciclagem degrada o material, de modo que ele perde utilidade e valor.

Por isso, em vez de produzir um copo de plástico sujeito a degradação toda vez que é reciclado, os fabricantes poderiam fabricar plásticos uma só vez, coletá-los e reutilizá-los continuamente.

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A reciclagem convencional exige uma classificação cuidadosa de todos os materiais coletados, o que pode ser difícil, com tantos tipos diferentes de plástico. Separar o papel do metal não requer nenhuma tecnologia complexa, mas separar um recipiente de polipropileno de uma garrafa de leite de polietileno é algo difícil de fazer sem cometer erros de vez em quando.

Quando dois plásticos diferentes são misturados durante a reciclagem, suas propriedades úteis são extremamente reduzidas, a ponto de torná-los inúteis.

Mas imagine que você possa reciclar um desses plásticos por um método diferente, para que ele não contamine o fluxo de reciclagem. Quando misturamos amostras de polipropileno com um polímero que fabricamos, ainda conseguimos decompor a matéria e recuperar nossos blocos de construção sem afetar quimicamente o polipropileno.

Isso indica que um fluxo de resíduos contaminados ainda pode recuperar seu valor, e o material contido nele pode ser reciclado, seja mecânica ou quimicamente.

PLÁSTICOS MAIS RECICLÁVEIS

Em um estudo publicado em outubro de 2023, nossa equipe desenvolveu uma série de polímeros com apenas dois blocos de construção simples – um polímero macio e um polímero duro –, que imitavam as poliolefinas, mas que também podiam ser reciclados quimicamente.

Desde a invenção do material, há um século, as pessoas estão começando a entender os enormes impactos que os plásticos têm sobre a vida e o meio ambiente.

Conectar dois polímeros diferentes várias vezes até que formem uma única molécula longa cria o que é chamado de polímero multibloco. Apenas ajustando a quantidade de cada tipo de polímero que entra no polímero multibloco, nossa equipe criou uma ampla gama de materiais com propriedades que abrangem todos os tipos de poliolefinas. 

Com a projeção de um aumento de quase duas vezes no uso anual de plástico até 2050, a complexidade e a quantidade de reciclagem de plástico só vai aumentar. Essa é uma consideração importante na hora de projetar novos materiais e produtos.

O uso de apenas dois blocos de construção para fabricar plásticos com uma enorme variedade de propriedades pode contribuir muito para reduzir e simplificar o número de plásticos diferentes usados para fabricar os produtos de que precisamos. 

Em vez de utilizar um tipo de plástico para fazer algo maleável, um outro para algo rígido e um terceiro, quarto ou quinto para propriedades intermediárias, poderíamos controlar o comportamento dos plásticos apenas alterando a quantidade de cada bloco de construção.

Embora ainda estejamos no processo de responder a algumas perguntas importantes sobre esses polímeros, acreditamos que esse trabalho é um passo na direção certa para a criação de plásticos mais sustentáveis.

Este artigo foi republicado do "The Conversation" sob licença Creative Commons. Leia o artigo original.


SOBRE A AUTORA

Katherine Harry é doutoranda em química e Emma Rettner é candidata ao doutorado em ciência e engenharia de materiais, ambas na Univers... saiba mais