Designers de moda estão incorporando linguagem braile em suas criações

A indústria da moda sempre ignorou a comunidade de deficientes, mas marcas como Aille e balini estão colocando o braile como prioridade

Crédito: Aille Design

David Silverberg 4 minutos de leitura

Quando Alexa Jovanovic estava cursando seu último ano no programa de Comunicação de Moda da Toronto Metropolitan University, já sabia que queria que seu projeto final abordasse a inclusão de deficientes, mas não tinha certeza de qual seria o enfoque.

A resposta veio quando fazia compras. Ela puxou uma jaqueta com miçangas de uma prateleira e ficou impressionada com a forma como uma peça de roupa pode ser, ao mesmo tempo, tão bonita e utilitária. Isso a fez pensar na linguagem braile, que ela também estudava na escola. Daí nasceu uma ideia de negócio.

No início de 2020, foi lançada a Aille Design. A linha apresenta uma variedade de camisas, vestidos e blusas bordadas com mensagens em braile, usando pérolas de cristal. São frases inspiradoras como “A moda é para todos” e “As deficiências não nos definem. Nós nos definimos.”

Alexa Jovanovic (Crédito: Aille Design)

Jovanovic não é deficiente visual, mas seus designs já estão sendo adotados pela comunidade: a American Foundation for the Blind (Fundação Americana para os Cegos) fez um pedido personalizado de mil peças para seu aniversário de 100 anos.

A organização sem fins lucrativos Visually Impaired Advancement (Avanço para os Deficeintes Visuais) também fez um pedido grande para um evento de arrecadação de fundos, o Dining in the Dark (Jantar no Escuro).

Esse é um passo importante para a moda acessível. No entanto, permanece o problema de que, mesmo quando algumas dessas linhas começam a fazer sucesso, ainda é raro ver um estilista com deficiência visual no setor.

Crédito: Aille Design

Talvez isso não seja tão surpreendente, já que a indústria da moda em geral sempre ignorou a comunidade de deficientes. Mesmo assim, designers independentes como Alexa Jovanovic estão tentando preencher a lacuna.

Para ela, os negócios têm sido bons. A receita da Aille cresceu 327% entre 2020 e 2021 e mais que dobrou sua base de clientes no mesmo período. Em 2022, a marca ganhou impulso quando suas criações foram usadas por Raul Midón, um dos mais conhecidos músicos com deficiência visual, em uma turnê pelos Estados Unidos.

Mas, para a estilista Balini Naidoo, que lançou uma linha com foco em braile em 2019, as coisas foram um pouco mais desafiadoras. A marca balini, com sede na África do Sul, inclui frases em braile na frente das camisas, identificando a cor, o tamanho e as instruções de lavagem.

Ela se inspirou para lançar a marca ao ver seu tio, que tem deficiência visual, sofrendo para identificar qual camisa era qual no armário. “Foi quando percebi que o braile pode ser útil para essa comunidade quando aplicado à própria roupa”, conta.

Mas, apesar de receber cobertura da imprensa e vários prêmios durante a pandemia, os negócios despencaram e foi preciso fechar a loja online. Agora, ela vende itens especiais pelo Instagram e atende a pedidos sob demanda. Naidoo acredita que o estigma em torno das pessoas com deficiência visual dificultou o crescimento de sua linha.

Outras marcas estão trabalhando para aumentar a conscientização de forma mais ampla. O  Hisi Studio, do Quênia, cria calças, saias e tops modernos com frases em braile. A Two Blind Brothers, de Nova York, faz camisetas super macias, que incluem informações de cor e tamanho em braile na etiqueta, e doa 100% dos lucros para a Fundação Fighting Blindness (Combate à Cegueira).

A Aille Design oferece a opção de personalizar a peça com uma frase da escolha do cliente, bordada em braile. Afinal, Jovanovic criou a marca para oferecer uma variedade de serviços, dependendo do que as pessoas precisam.

Crédito: Aille Design

Por exemplo, há uma opção de aluguel de roupas, incluindo um elegante vestido azul com mais de 2,6 mil miçangas, feito em colaboração com 10 mulheres com deficiência visual.

“Esse vestido tornou-se uma peça que simboliza tudo o que o trabalho com moda em braile pode ser”, diz ela.

Crédito: Aille Design

Para alguns especialistas em design inclusivo e adaptativo, essas marcas independentes podem impulsionar um movimento mais amplo na moda.

“Designers e varejistas podem se tornar mais inclusivos na forma como fabricam e promovem suas linhas de moda, contratando pessoas com deficiência para ocupar desde postos na diretoria até os níveis mais básicos”, especula Stephanae McCoy, fundadora da Bold Blind Beauty, plataforma de defesa para a comunidade de deficientes visuais. “Incorporar o braile na moda é uma maneira brilhante de criar impacto social e conversas sobre acesso, inclusão e representação.”

Jovanovic acredita que chegou a hora de uma nova abordagem para a moda inclusiva e adaptável. É o momento de os designers tornarem a moda mais acessível para todos.

“A moda não se resuma à imagem”, diz Jovanovic. “Ela tem a ver com sentimento, desde o toque de um tecido macio até a onda de emoções e empoderamento que você experimenta quando veste sua peça favorita ou lê uma mensagem em braile nas suas roupas.”


SOBRE O AUTOR

David Silverberg é jornalista e escritor, com trabalhos publicados em veículos como The Washington Post, BBC News e Business Insider, ... saiba mais