Estradas também precisam de protetor solar (de borracha)

Uma equipe de engenheiros descobriu que adicionar borracha de pneus velhos pode proteger as estradas dos raios UV

Crédito: Batch by Wisconsin Hemp Scientific/ Peter Mizsak/ Unsplash

Elissaveta M. Brandon 3 minutos de leitura

As estradas estão sujeitas a todo tipo de impacto e intempéries. Caminhões pesados freiam e fazem curvas bruscas, a chuva molha o asfalto e o sol eleva a temperatura. Como resultado, as pistas incham, afundam e racham. Para piorar, as rachaduras se enchem de neve e gelo no inverno, o que as alarga ainda mais.

Muito disso acontece porque as estradas mais comuns são pavimentadas com agregados de rocha e sal, que não se ligam bem ao asfalto e acabam se desintegrando com toda essa pressão. Mas mudar a fórmula pode ajudar.

Em um novo estudo, uma equipe de engenheiros da Universidade RMIT, da Austrália, descobriu que uma quantidade específica de borracha triturada, feita de pneus velhos moídos em pó fino, pode atuar como uma espécie de protetor solar para estradas. Isso ajuda a aumentar sua durabilidade e ainda evita que pneus velhos sejam enviados para aterros sanitários.

Esse tipo de borracha triturada já vem sendo usado em muitas estradas. Mas, até agora, os pesquisadores estavam testando apenas como o material pode proteger contra o calor e a umidade. O novo estudo sugere que ele pode ter um impacto igualmente grande no bloqueio da a radiação UV. Ou seja: mais uma razão para acrescentar borracha no asfalto.

Nos EUA, o chamado “asfalto emborrachado” remonta à década de 1960, quando o engenheiro de materiais Charles McDonald começou a selar rachaduras com borracha de pneu triturada. A maior parte do Sistema Rodoviário Nacional já havia sido construída até então, mas as estradas precisam ser repavimentadas a cada 10 a 20 anos. Muitos estados, incluindo Arizona, Califórnia, Flórida, Washington e Texas, já experimentaram pavimentos com borracha.

RECICLAGEM VANTAJOSA

Os benefícios são extensos: a borracha pode ajudar a tornar as estradas de asfalto menos quebradiças no inverno e mais rígidas no verão; pode torná-las mais seguras reduzindo a derrapagem e aumentando a tração; e pode amortecer o som das rodovias, o que elimina a necessidade de barreiras sonoras.

A técnica ajuda a aumentar a durabilidade das estradas e evita que pneus velhos sejam enviados para aterros sanitários.

O uso de borracha também dá uma nova vida útil aos pneus velhos. A Austrália produz quase 460 mil toneladas de pneus descartados por ano, gerando “montanhas de pneus”, como chama Filippo Giustozzi, professor associado do RMIT e principal autor do estudo.

Segundo ele, a Austrália recicla 70% dos pneus usados, mas 30% (150 mil toneladas) ainda acabam em aterros. Isso é especialmente verdadeiro para pneus de mineração, maiores e mais difíceis de reciclar, porque transportá-los de locais remotos de mineração pode ser caro.

O que torna os pneus particularmente bons para fortalecer estradas é o chamado “negro de fumo”, um tipo de enchimento adicionado para tornar os pneus mais resistentes à radiação UV. Por conta disso, a equipe já tinha o palpite de que o negro de fumo poderia ajudar as estradas emborrachadas a resistir à luz UV. Mas essa ideia precisava ser testada.

ASFALTO, KETCHUP E PASTA DE DENTE

Os pesquisadores colocaram quatro amostras diferentes de asfalto (uma sem borracha e outras três com diferentes concentrações do material) em uma máquina de luz UV. As amostras permaneceram lá por pouco mais de um mês, o equivalente à quantidade de sol a que as estradas locais ao redor da cidade de Melbourne ficam expostas por um ano inteiro.

Em seguida, a equipe realizou testes de desempenho, incluindo o uso de uma máquina especial (que também mede o nível de viscosidade no ketchup e na pasta de dente) para verificar se o asfalto resultante tinha a consistência ideal para ser usado nas estradas.

No final, as amostras com maior concentração de borracha (22,5% da massa total do asfalto) saíram dos testes com metade dos danos da amostra sem borracha. As estradas no Arizona, por exemplo, têm uma concentração semelhante.

No entanto, Giustozzi observa que, se a quantidade de borracha estivesse acima dessa proporção, seria difícil produzir o asfalto nas máquinas que já existem, e provavelmente sua durabilidade ficaria comprometida.

O experimento foi feito em laboratório, mas a equipe agora está trabalhando com conselhos locais em Sydney. Dentro de alguns meses, eles começarão a testar várias fórmulas e vão monitorá-las por cerca de dois anos. Só então, finalmente, a borracha vai engatar a quinta marcha.


SOBRE A AUTORA

Elissaveta Brandon é colaboradora da Fast Company. saiba mais