Os maiores rebrands da década têm em comum esta designer visionária
No início do ano, o Burguer King fez seu primeiro rebranding em duas décadas e o “design digno da realeza“, de acordo com especialistas conquistou a internet. O novo visual foi certamente uma mudança decisiva para o Burguer King, mas não é um caso isolado para a designer por trás dele.
Diversos artistas comerciais e designers de marcas corporativas enfrentam alguma forma de saturação no mercado, porque definem a aparência de bens de consumo de massa. Embora relativamente desconhecida, Lisa Smith, diretora executiva de criação da agência de design Jones Knowles Ritchie, rompeu com padrões estéticos populares e seu trabalho único deu início a novas tendências visuais. O Burger King é apenas o exemplo mais recente.
Smith, 43, está na Jones Knowles Ritchie há dois anos. Antes da JKR, ela ajudou a construir marcas in-house e em agências. Smith fez projetos para o Victoria & Albert Museum em Londres e para a Chobani. Em sua agência anterior, Wolff Olins, ela redefiniu a identidade visual de marcas como USA Today, Zocdoc, Grubhub e Metropolitan Museum of Art, o que gerou controvérsias.
Ela diz que geralmente procura empresas que estão em um ponto de inflexão importante. Quando Lisa assume um novo desafio de branding, ela começa definindo e orientando a narrativa da empresa a partir de uma única frase, em seguida, usa o design visual para contar essa história. “Eu amo o futuro e o passado, e ter essa ideia criativa central… avalio tudo em relação a isso”, diz.
Resumindo, Smith não lida com pequenos ajustes de design. Seus maiores rebrands demonstram que ela apresenta uma visão totalmente nova e, frequentemente, cria cenários estéticos disruptivos.
“DA VIDA PARA A ARTE, DA ARTE PARA A VIDA”
O Metropolitan Museum of Art é uma instituição com mais de cem anos de história, e estava pronto para mudanças no final de 2013. O museu desejava expandir sua coleção de arte moderna para outro lugar, o Met Breuer, e pretendia unificar três espaços distintos (incluindo o Cloisters). Apesar de sua significativa presença, o museu queria atingir um público mais jovem, ser mais acessível e corrigir a impressão que causava, pois “embora involuntariamente, estava se tornando cada vez mais elitista”, afirma Cynthia Round, vice-presidente sênior de marketing e relações externas do Met na época. E foi aí que Smith entrou na jogada, então na Wolff Olins.
Junto com um estrategista e gerente de projeto, Lisa reuniu milhares de materiais impressos e ativos digitais do museu, e analisou marcas concorrentes importantes de todo o mundo. Eles passaram oito meses projetando uma nova estratégia, resumida em uma frase: Da vida para a arte, da arte para a vida. Por meio de ativos digitais, wayfinding e branding unificado, eles conectaram o passado e o futuro (já que grande parte da coleção consiste em artefatos de quase 5 mil anos).
O museu substituiu seu logotipo anterior, um M no estilo do alfabeto Da Vinci, por uma criação de Gareth Hague com o nome coloquial do museu: Met. Com a colaboração de Smith, Hague combinou as letras do novo logotipo para simbolizar conexão e escolheu vermelho porque “transcende culturas” e “representa vitalidade na arte”, de acordo com Round. “Precisávamos de algo que tivesse a gravidade e a estatura do Met e, ao mesmo tempo, pudesse ser mais acolhedora, aberta e amigável como instituição que pertence a todos”, ela afirma.
O Met “nunca se considerou como uma marca”, Round admitiu. Isso logo mudou pois, a nova identidade visual causou um tumulto inesperado, e o Met foi considerado uma das marcas mais polêmicas da década. O resultado foi, na verdade, o mais conservador das três identidades que Smith desenvolveu — o que torna a reação do público um pouco irônica. “Eu nunca tinha sido alvo de tanto ódio”, recorda.
As faixas ousadas e coordenadas que mapeiam as salas do museu unificaram a experiência do visitante, e a visão contemporânea da designer para representar uma instituição histórica é uma interpretação clara da missão reformulada. Apesar das reações, o nome de Lisa Smith ganhou o público.
“LUTANDO PELA FELICIDADE PARA SEMPRE”
Em janeiro de 2017, Leland Maschmeyer, na época diretor de criação da Chobani, convidou Smith para um desafio in-house que parecia mais doce. “Lisa foi uma das poucas pessoas que teve sensibilidade narrativa e experiência com implementação de marcas em larga escala”, conta Maschmeyer.
Com doze anos, a marca de iogurte havia superado seu visual inicial de 2005 e deveria passar por um rebrand, à medida que expandia seu portfólio para além do iogurte grego. Maschmeyer consolidou a empresa como uma marca de bem-estar alimentar que oferece um “retorno à comida simples e natural”. Ele desejava uma identidade com senso de romance, natureza e artesanato, inspirada na arte popular do nordeste americano.
“Falamos muito sobre o poder da compaixão e essas palavras eu poderia transformar em design”, diz Smith. Uma história do fundador da Chobani, Hamdi Ulukaya, se tornou a referência para escolher a frase central da marca. Ele contava sobre um pastor que cultivava alimentos deliciosos, acessíveis e nutritivos, e sobre ser um guerreiro que luta por práticas alimentares éticas. Capturando a salubridade e natureza folclórica da marca, Lisa sugeriu “Lutando por felizes para sempre”.
Os fundos brancos da embalagem foram suavizados para creme, e a equipe de reformulação da marca apresentou uma fonte com serifa rechonchuda influenciada por Cooper Black — um estilo que foi extremamente popular durante os anos 70 (incluindo o movimento de wellness da época). Depois de folhear centenas de revistas de gastronomia, eles introduziram fotografias coloridas e saturadas, cuidadosamente retocadas com múltiplas profundidades de campo, além de ilustrações inspiradas em Matisse e no movimento artesanal americano.
Smith e sua equipe não estavam promovendo um produto, e sim redesenhando a realidade. Segundo Maschmeyer, eles revisaram a identidade da marca, o site, o café e a embalagem, e expandiram produtos como o Flip, um iogurte com coberturas que o consumidor pode adicionar no topo.
O trabalho de Smith na Chobani lançou uma tendência de design retrô, humanista e pessoal. Por recuar no minimalismo plano e funcional que dominou o branding na primeira parte da última década, diversas embalagens de bens de consumo e marcas corporativas parecem muito mais amigáveis. O próprio estilo da fonte, com suas serifas expressivas e macias, é uma tendência há anos, usada por todos, de grandes marcas como Dunkin ‘Donuts a startups como Olipop e Buffy.
“DO SEU JEITO, MUITO MELHOR”
Smith e sua equipe trabalharam por 18 meses na nova marca do Burguer King, lançada em janeiro. O logotipo de aparência mais sintética, de 1999, foi substituído por uma atualização de uma versão antiga do BK entre dois pães.
A rede planejava sinalizar no rebranding o fim dos aromatizantes artificiais, e a frase da vez foi: “Do seu jeito, muito melhor”. Lisa e sua equipe usaram ilustrações personalizadas e uma fonte extensível e bulbosa. Os consumidores quase saboreiam a comida com os olhos por meio das macro fotografias que Smith acrescentou. A reformulação da marca estava repleta de personalidade, embora permanecesse simples o suficiente para ser legível em plataformas digitais. Seu trabalho demonstra que marcas corporativas podem abraçar o design plano digital e manter uma identidade única.
De acordo com uma pesquisa da Ad Age -Harris, 56% dos entrevistados afirmam que a reformulação da marca do Burger King fazia a comida parecer mais apetitosa, já 44% preferem o McDonald’s.
O que torna Lisa Smith única é sua combinação particular de pensamento estratégico com um grande e pessoal senso de design. “O fato de ela ser capaz de se desconectar de uma estética que aplica a tudo, e ser maleável a um monte de problemas diferentes — a tornam uma designer com D maiúsculo”, Maschmeyer revela. “Design é uma mudança intencional. Compreendendo e executando. Lisa faz isso. ”
Smith também é versátil em sua capacidade de trabalhar com diversos setores e públicos. “Lisa tem a capacidade notável de trazer o melhor trabalho de design para o público mais amplo possível”, diz Michael Bierut, um parceiro da Pentagram, que escreveu em defesa do logotipo do Met em 2016. “Definir a aparência de um dos museus mais famosos do mundo e de uma das maiores redes de fast food do mundo exige um trabalho árduo e sério. Lisa faz parecer fácil.”
No caso do Met, o público ainda não estava pronto para mudanças. Mas,primeiras impressões à parte, as apostas da designer valeram à pena. O Met foi um dos primeiros grandes museus a se modernizar, o Chobani entre os primeiros bens de consumo a se tornarem maximalistas, e o Burger King ainda está aproveitando os efeitos do rebranding. As marcas de Lisa Smith são feitas para durar.