Porque a Wikipédia também busca uma marca sonora

Mais marcas estão criando marcas de áudio, incluindo a Wikipedia, que deseja criar o "som de todo o conhecimento humano"

Crédito: Istock

Rob Walker 5 minutos de leitura

A Wikipédia é, sem dúvida, uma das marcas mais conhecidas do mundo. O que significa que a maioria das pessoas está familiarizada com a logomarca da enciclopédia livre: um quebra-cabeças inacabado formando um globo terrestre. Mas qual seria o som da Wikipédia?

A Fundação Wikimedia, sem fins lucrativos, anunciou recentemente que está procurando uma resposta para essa pergunta. Eles lançaram uma chamada aberta para o envio de “logotipos sonoros”, porque querem selecionar aquele que identificará o conteúdo da Wikipédia (e outros projetos da Wikimedia Foundation) “nas situações em que os logotipos visuais não forem uma opção – por exemplo, quando assistentes virtuais de voz respondem a consultas.”

Associar uma marca a um som não é uma ideia nova: desde o início da publicidade, os jingles foram um elemento básico. Mas, nos últimos cinco anos, as assinaturas de áudio têm proliferado.

Isso ocorre em parte porque, por muitos anos, a era digital foi tão intensamente visual que atingimos uma espécie de “ponto de saturação”, explica Scott Simonelli, cofundador e CEO da Veritonic, empresa de análise e pesquisa de áudio. “Agora, esse tipo de colonização dos olhos, como alguns têm definido, atingiu seu pico.”

Ao mesmo tempo, tem havido muita inovação sonora, de alto-falantes inteligentes a AirPods, além do aumento constante da indústria de podcasts. Assim, o som tornou-se reconhecidamente importante para a identidade empresarial, o que vai muito além dos jingles. Pense no famoso “tu-dum” da Netflix, por exemplo. Exemplos mais antigos vão desde a abertura estática da HBO até a assinatura sonora de cinco notas da Intel.

Uma marca agora precisa de uma espécie de “paleta” sonora, argumenta Simonelli, da mesma forma que sua identidade visual está ancorada em uma paleta de cores específica. “Estamos chegando a um ponto em que, se você não tiver uma estratégia de áudio, vai perder uma grande fatia do mercado e estará desconectado do próprio zeitgeist.”

TUDO PARA TODOS

Tecnicamente, a chamada pública da Wikimedia está buscando um logotipo de áudio para todas as suas iterações, que inclui muitos projetos além de sua famosa enciclopédia de crowdsourcing. E isso pode ser desafiador.

“Já é difícil desenvolver um logotipo, visual ou sonoro. Tudo fica mais difícil ainda quando a organização para a qual você está trabalhando é amorfa”, observa Marc Weidenbaum, crítico de música que escreve o boletim “This Week in Sound”.

O concurso da Wikimedia é amplo demais, diz ele, tanto em termos do tema (“o som de todo o conhecimento humano”) quanto do público (presumivelmente... qualquer pessoa do planeta?). Às vezes, ele conclui, algumas limitações ajudam a guiar o processo de criação. 

desde o início da publicidade, os jingles foram um elemento básico. Mas, nos últimos cinco anos, as assinaturas de áudio têm proliferado.

Mas a verdade é que, como acontece com um logotipo visual, o verdadeiro poder de uma marca sonora vem da familiaridade que apenas a exposição repetida pode criar. A Veritonic publica um Audio Logo Index anual, avaliando quais identidades sonoras em várias categorias são as mais “eficazes”.

Ele se baseia em uma combinação de lembrança, “ressonância criativa” e outros fatores, selecionados de respostas de pesquisas e comparados com dados internos da Veritonic.

O índice de 2022 “encontrou a consistência como um dos parâmetros mais influentes para o sucesso da marca sonora”, diz o relatório. “Ninguém consegue cantar uma música inteira de cabeça depois de escutar apenas uma vez ou duas, nem mesmo se for a música mais chiclete do mundo.”

Simonelli aponta um exemplo como o da MasterCard, que tem um logotipo de áudio “realmente sofisticado e legal”, mas que ainda não teve um desempenho particularmente bom nas classificações da Veritonic. Talvez ele simplesmente não tenha tido tempo ou exposição consistente o suficiente.

Surpreendentemente, “I’m Lovin’ It”, do McDonald`s (no Brasil, "Amo muito tudo isso"), não teve um desempenho tão bom quanto costumava ter no ranking anual da Verotonic. Talvez até mesmo identidades sonoras familiares precisem ser atualizadas.

OUÇA A WIKIPEDIA

Curiosamente, Weidenbaum aponta que já existe uma espécie de “som da Wikipédia”: um site chamado Listen To Wikipedia (Ouça a Wikipédia), que converte edições em notas. “Os sinos indicam adições e as cordas indicam subtrações”, explica o site. “O tom muda de acordo com o tamanho da edição: quanto maior a edição, mais profunda a nota.”

O resultado é uma espécie de partitura ambiente, composta integralmente por participantes da própria Wikipédia. Uma sequência cuidadosa de sons desse site poderia ser “um logotipo sonoro realmente forte para a Wikimedia”, ele sugere. “Isso se conectaria com um legado de atividade sonora de uma maneira significativa, em vez de enxertar algo novo.”

Talvez ele tenha razão, mas já dá para imaginar por que a Wikimedia está abrindo bastante o escopo. O logotipo visual da Wikipédia surgiu por meio de uma chamada aberta muito semelhante, com um conceito original que foi gradualmente refinado ao longo dos anos para corrigir erros. A questão é que o formato de chamada aberta não é apenas de marca, mas também tem um precedente.

Em conexão com a chamada aberta, a agência de música MassiveMusic, que está prestando consultoria à Wikimedia no projeto, disponibilizou um vídeo de meia hora, bastante cansativo, que tenta capturar o básico dos logotipos sonoros, da terminologia musical principal às opções de software e uma visão geral da produção.

Aparentemente, isso foi feito com a premissa de que alguém sem absolutamente nenhuma formação musical poderia mergulhar de cabeça no concurso. Essa abordagem, intencionalmente ou não, ecoa o otimismo torto que fez da Wikipédia uma das verdadeiras histórias de sucesso da web.

Talvez esse espírito, mais do que o som de “todo o conhecimento humano”, seja o que o logotipo de áudio da Wikimedia deveria capturar.


SOBRE O AUTOR

Rob Walker assina Brended, coluna semanal sobre marketing e branding. Também escreve sobre design, negócios e outros assuntos. saiba mais