Processo contra a Adobe mostra como design é usado para “enrolar” usuários

A prática de padrões enganosos mostra a facilidade com que estratégias de design podem evoluir de "centradas no usuário" para centradas nos negócios

Crédito: Tingey Injury Law Firm/ Unsplash

Hunter Schwarz 3 minutos de leitura

Cancelar sua assinatura dos serviços da Adobe pode ser uma tarefa confusa e cara. E, segundo um novo processo do Departamento de Justiça dos EUA (DOJ), a empresa criou de propósito esse tipo de processo tão complicado.

O DOJ entrou com uma ação contra a Adobe, acusando-a de violar o Restore Online Shoppers' Confidence Act (Ato para restaurar a confiança dos consumidores online, ou ROSCA, na sigla em inglês), uma lei destinada a proteger os consumidores de práticas enganosas e de serem cobrados por transações que não são divulgadas com clareza.

No processo, os advogados do Departamento de Justiça alegam que a Adobe esconde os termos de cancelamento da "assinatura anual, paga mensalmente", "em letras miúdas e atrás de caixas de texto opcionais e hiperlinks" durante o processo de inscrição do usuário. A empresa só divulga claramente esses termos quando os usuários tentam cancelar a assinatura. 

Isso torna o processo de inscrição uma "poderosa ferramenta de retenção" que prende os consumidores a assinaturas que eles não querem mais, afirma o Departamento de Justiça.No processo, os advogados observam que o processo de cancelamento é complicado de propósito.

"Os assinantes que tentaram cancelar por meio do serviço de atendimento ao cliente encontraram vários obstáculos que impedem ou atrasam suas tentativas de cancelamento", escreveram os autores da ação. A Fast Company entrou em contato com a Adobe para comentar o assunto e atualizará este texto se houver retorno.

DESVENDANDO O DESIGN ENGANOSO

A ação contra a Adobe é uma das muitas que o Departamento de Justiça do governo norte-americano moveu nos últimos anos, já que os padrões enganosos se tornaram uma prioridade cada vez maior de investigação.

No ano passado, a Federal Trade Commission (FTC) apontou que a inscrição no serviço Prime, da Amazon, segue o mesmo padrão. O processo alegava que a varejista virtual inscrevia os consumidores no programa sem o consentimento deles e dificultava o cancelamento. O julgamento está marcado para junho de 2025.

A FTC divulgou um relatório sobre padõres enganosos em 2022, que se concentrou em quatro táticas mais comuns: enganar o consumidor e camuflar anúncios; dificultar o cancelamento de assinaturas ou cobranças; ocultar termos importantes e taxas desnecessárias; e enganar o consumidor para que compartilhe dados.

A prevalência cada vez maior de padrões enganosos mostra a facilidade (e a sutileza) com que as estratégias de design podem evoluir de "centradas no usuário" para centradas nos negócios, priorizando fluxos projetados para gerar lucro máximo, em detrimento da transparência máxima.

Em suma, essas práticas de design são ruins para os consumidores, mas boas para os resultados financeiros da empresa. Isso até que o governo federal argumente que elas infringem a lei.

essas práticas de design são ruins para os consumidores, mas boas para os resultados financeiros da empresa.

O processo contra a Adobe diz que as práticas de registro da empresa "geraram reclamações frequentes dos assinantes", inclusive para o Better Business Bureau (organização sem fins lucrativos de apoio e defesa dos consumidores dos EUA e Canadá), nas mídias sociais e nas páginas de suporte da comunidade da Adobe.

Parece que o governo dos EUA está cada vez mais interessado em combater esse problema de design. "Cada vez mais empresas estão usando padrões digitais enganosos para induzir as pessoas a comprar produtos e fornecer suas informações pessoais", disse Samuel Levine, diretor  do Bureau of Consumer Protection da FTC, em 2022.Segundo ele, esses casos " transmitem uma mensagem inequívoca de que essas armadilhas não devem ser toleradas".

Em termos gerais, táticas manipuladoras como as alegadas pelo DOJ estão se tornando uma prática comum na internet: um estudo de 2019 da Universidade de Princeton já havia encontrado casos de padrões enganosos em mais de 11% dos sites.


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