Sora, da OpenAI, nem foi lançada e já é vista como ameaça por Hollywood

IA pode transformar a maneira como os efeitos visuais são produzidos, mas ainda falta o toque humano que faz com que o público se conecte

Créditos: Aideal Hwa/ Unsplash/ vasakna/ iStock

Joe Berkowitz 4 minutos de leitura

Após um ano de rápida evolução desde o lançamento do ChatGPT, começou a parecer que a IA havia perdido sua capacidade de surpreender. Então veio o vídeo de demonstração do Sora.

O modelo de texto para vídeo da OpenAI produz instantaneamente cenas vívidas e fotorrealistas a partir de instruções complexas e impressionou espectadores ao redor do mundo – especialmente em Hollywood.

No dia 27 de fevereiro, um grupo de roteiristas renomados anunciou sua plataforma tecnológica, o Gauntlet. O objetivo deles é manter os humanos no centro do processo de desenvolvimento, em um momento em que os principais tomadores de decisão estão usando cada vez mais ferramentas de IA para avaliar roteiros.

Este é o mais recente sinal de que muitos em Hollywood consideram a criatividade humana indispensável e irreplicável – e algo que vale a pena preservar a todo custo.

“A IA vai nos aprisionar em uma matriz na qual nenhum de nós sabe o que é real”, disse a presidente do sindicato dos atores dos EUA (SAG-AFTRA), Fran Drescher. “Se falta empatia e espiritualidade a um inventor, talvez não seja essa a invenção de que precisamos.”

Drescher passou grande parte de 2023 negociando um novo contrato para o sindicato, com a inteligência artificial surgindo como um ponto central, como aconteceu com a greve simultânea dos roteiristas.

Atores fazem manifestação em frente ao escritório da Netflix (Crédito: Mario Tama/ Getty Images)

Os atores não queriam que suas imagens fossem usadas em projetos futuros sem consentimento e os roteiristas não queriam dar vida a histórias geradas por algoritmos sem saber. No final, ambos conseguiram garantir regulamentações sobre como a inteligência artificial será incorporada em suas áreas, embora alguns digam que isso não é o suficiente.

Mais recentemente, a agência de talentos WME fez parceria com a empresa de IA Vermillio para oferecer uma proteção adicional para sua base de clientes contra o uso não autorizado de seus rostos e propriedade intelectual.

Talvez mais medidas semelhantes surjam e Hollywood mantenha mais de sua humanidade. Ou, pelo menos, era essa a esperança antes que todos tivessem um vislumbre do Sora.

O "EFEITO SORA"

O modelo é mais avançado do que qualquer outro que veio antes dele. A OpenAI afirma que o Sora – cujo nome vem da palavra japonesa para céu – pode gerar qualquer cena com vários personagens distintos, uma gama dinâmica de movimentos e detalhes de alta definição incrivelmente precisos.

O vento parece real, a água flui e borbulha e tudo o que esses elementos tocam reage de forma natural. Como a empresa descreve, “o modelo compreende não apenas o que o usuário solicita na instrução, mas também como todas essas coisas se comportam no mundo físico.”

No entanto, as implicações mais urgentes do Sora para a indústria de cinema e TV vão além de sua capacidade de gerar instantaneamente “uma mulher estilosa em Tóquio”. Aparentemente, ele conta com um recurso de edição de vídeo para vídeo, o que significa que os usuários podem inserir em seus mundos simulados qualquer coisa que tenham filmado no mundo real.

A “amostragem flexível” do modelo também permite ver o resultado sob outras perspectivas. Com avanços como estes, o Sora tem o potencial de economizar custos de produção, não apenas em efeitos especiais e pré-visualização, mas também em tarefas como capturar planos e tomadas principais.

É claro que toda essa redução de custos resultará em muitas pessoas perdendo seus empregos.

Além das reivindicações que os atores e roteiristas negociaram no ano passado, especialistas temem que a revolução da IA acabe com o trabalho de artistas de efeitos visuais, engenheiros de som e muitos outros. Um estudo recente com 300 líderes da indústria do entretenimento estima uma perda de quase 204 mil empregos nos próximos três anos.

DEMOCRATIZAÇÃO DO ENTRETENIMENTO

Ninguém sabe o quanto o Sora vai mudar até seu lançamento. A OpenAI afirma que seus engenheiros estão atualmente conversando com “legisladores, educadores e artistas de todo o mundo para entender suas preocupações e identificar casos de uso positivos para essa nova tecnologia.”

Talvez algumas de suas capacidades sejam reduzidas antes de a ferramenta se tornar disponível. Ou talvez, somente quando milhões de usuários tiverem acesso, suas falhas e imprecisões venham à tona.

especialistas temem que a revolução da IA acabe com o trabalho de artistas de efeitos visuais, engenheiros de som e muitos outros.

Mesmo que acabe sendo tão incrível quanto a demonstração sugere e elimine muitos empregos técnicos, não espere que o Sora democratize o entretenimento.

Embora alguns dos receios sobre a qualidade de filmes gerados por IA sejam válidos, não parece haver muita demanda por eles até agora. De acordo com um estudo recente da Morning Consult com 2.201 pessoas nos EUA, os consumidores têm duas vezes mais interesse em filmes e programas de TV criados inteiramente por humanos do que em produções feitas por inteligência artificial. E isso antes mesmo de o público ter tido a chance de consumir muito dessas produções.

Se grandes nomes de Hollywood estão começando a considerar projetos criados por IA depois de assistir à demonstração do Sora, então, como sugeriu recentemente o escritor Joel Kim Booster, talvez sejam os executivos que deveriam ser substituídos por inteligência artificial.


SOBRE O AUTOR

Joe Berkowitz é colunista de opinião da Fast Company. saiba mais