Educação midiática é educação para a vida
Educação midiática é a capacidade de entender como as tecnologias moldam o que vemos, pensamos e sentimos

Educação midiática não é moda, nem assunto técnico demais para ficar restrito a especialistas. É pauta urgente. Diz respeito a como a gente vive, se informa, toma decisões, forma opinião e se reconhece (ou não) nos mundos digitais.
Por isso, apresentar a segunda temporada do “Assunto na Mesa”, no canal Futura, foi também uma forma de aprofundar uma conversa que já faz parte do meu trabalho há anos. Ao longo dos 10 episódios, pude conversar com especialistas que ajudaram a expandir o debate com conhecimento, experiência, boas perguntas e possíveis caminhos para pensarmos esse tema com mais escuta e mais sentido.
Educação midiática é a capacidade de ler, interpretar e produzir conteúdos em diferentes meios, com consciência crítica sobre os contextos, interesses e impactos envolvidos. É saber navegar, mas também recusar. Entender como as tecnologias moldam o que a gente vê, pensa e sente para, a partir daí, fazer escolhas (e perguntas) com mais autonomia.
Durante as gravações, fui me reconectando com muitas das perguntas que já me acompanhavam. Aquelas que colocam a atenção não só no conteúdo, mas no olhar.
Porque se trata disso: desenvolver a escuta, a sensibilidade, o senso de contexto. Formar pessoas que saibam desconfiar de respostas fáceis e construir narrativas próprias. Gente capaz de ler o mundo e também de reescrevê-lo.
Nada do que a gente consome é neutro. O mundo digital tem intenção, direção, projeto. E se a gente não estiver minimamente preparada para reconhecer isso, fica difícil até exercer a cidadania do jeito que a gente precisa e quer.
Mas educação midiática não é só postura crítica. É também criação, formar sujeitos que se sintam autorizados a contar suas histórias, a produzir seus conteúdos, a disputar espaço com o que já está aí. Estudantes, professores, mulheres negras, lideranças de comunidades, pessoas com deficiência, pessoas mais velhas: todo mundo tem algo a dizer e o direito de ser ouvido.
Essa temporada reforçou em mim a certeza de que educação midiática só faz sentido quando é construída de forma coletiva. Quando leva em conta a diversidade de vozes, de ritmos, de repertórios. E quando parte da realidade do país – sem ignorar as desigualdades e sem romantizar a falta de estrutura que ainda é o cotidiano de muitas escolas.
Educação midiática é a capacidade de ler, interpretar e produzir conteúdos em diferentes meios.
Falar de tecnologia, no Brasil, é falar de ausência: de acesso, de escuta, de condições básicas. Muita gente ainda está fora das conversas digitais (ou só entra como alvo, não como voz).
Por isso, discutir internet e plataformas no Brasil não é um debate sobre inovação ou tendências, é uma conversa urgente sobre desigualdade. Sobre quem consegue se expressar, quem é sistematicamente silenciado e quais histórias têm vez, visibilidade e valor.
Isso também é educação midiática. Ela também está nas escolhas do dia a dia. No grupo de WhatsApp da família, na conversa em que uma mãe mostra ao filho como identificar um golpe, na aula em que a turma compara diferentes versões de uma mesma notícia, no vídeo feito por um estudante da própria quebrada, no gesto de uma idosa ao denunciar um perfil falso. É ali, na prática, que tudo isso ganha sentido.

E é nesse mesmo espírito que iniciativas como o ciclo de oficinas “Vozes Periféricas e Narrativas Populares”, promovido pela Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República em parceria com a Unesco, e o Encontro Internacional de Educação Midiática, realizado em maio em Brasília pelo Instituto Palavra Aberta, ajudam a ampliar o debate público e a garantir que mais pessoas possam participar dessa urgência.
Sou grata a todas as pessoas que estiveram comigo nessa temporada. Cada conversa foi um pedaço de caminho. Me ajudou a reorganizar ideias, confirmar convicções, abrir outras possibilidades.
Obrigada, Bárbara Carine, Doug Alvorossado, Débora Silva, Mário Serra, Natália Leal, Mauro Braga, Renata Tomaz, Ciça Melo, Vagner Diniz, ao canal Futura e a toda a equipe e parceiros que tornaram essa temporada possível, com tanto cuidado e entrega – e em especial ao meu incrível companheiro de bancada Alexandre Sayad.
Falar de tecnologia, no Brasil, é falar de ausência: de acesso, de escuta, de condições básicas.
Com muita saudade, deixo aqui um agradecimento especial ao artista-programador Carlos Vamoss, que entrevistamos para o nono episódio, que infelizmente nos deixou de forma inesperada em janeiro deste ano.
Era um amigo querido e uma das pessoas mais generosas e brilhantes que já conheci. Um criador inquieto, curioso, apaixonado por códigos e encontros. Alguém que enxergava a tecnologia como linguagem e como afeto.
Talvez essa seja, no fim das contas, a maior lição que fica: que educação midiática também é isso. Afeto. Um jeito de cuidar das relações, das histórias e das formas de estar no mundo.
Esse é, hoje, um dever de casa para todas e todos nós.
