Licença, Maternidade!

As organizações precisam despertar para essa realidade: uma mãe não é a mesma mulher que entrou em licença. Ela renasceu

Crédito: LaylaBird/ iStock

Ana Bavon 3 minutos de leitura

Há uma dança silenciosa que acompanha o ritmo dos dias quando se toma a decisão de dar à luz, e não falo apenas de parir um filho, mas de parir a si mesma.

Estou em licença maternidade e, se fechar os olhos por um instante, posso sentir o peso dessas palavras como um abraço. “Licença” – como se me fosse permitido afastar-me do palco corporativo, uma pausa; e “maternidade” – um mergulho profundo em uma experiência que é ao mesmo tempo universal e singular, tão cheia de diversidade quanto as mulheres que a vivem.

O que aprendi, vivendo essa fase, é que a maternidade não tem um formato único. Para algumas, ela pode vir suave, silenciosa, como um nascer do sol lento. Para outras, ela chega como uma tempestade avassaladora, desafiando cada fronteira da vida que antes conheciam.

O tempo, essa entidade que tanto tentamos controlar, revela-se elástico. Cada mulher tem o seu próprio. Há as que retomam rapidamente ao universo das decisões rápidas e reuniões infindas, e há aquelas que desejam e precisam de mais tempo para entender essa nova dança. Ambas, em seus tempos, são igualmente grandiosas.

Mas aqui está algo que precisa ser dito, de forma clara e inegociável: um filho não é um período na vida de uma mulher. Ele é um fio que entrelaça toda a trama da sua existência. A maternidade, para quem é executiva – para quem toma decisões que moldam o futuro de uma empresa e, em muitos aspectos, o mundo – precisa ser entendida para além da licença.

Porque voltar ao escritório não significa deixar a maternidade do lado de fora. As organizações precisam despertar para essa realidade: uma mãe não é a mesma mulher que entrou em licença. Ela renasceu.

E é aqui que está a revolução. A cultura organizacional, a sociedade, precisam compreender que não é só a mulher que materna que precisa de apoio, mas todos que exercem atividades de cuidado. Homens, avós, pais, cuidadores.

O mundo, tão obcecado por produtividade e métricas, precisa parar e entender o que significa cuidar. Essa compreensão não pode ser temporária, limitada a meses de licença. Deve ser uma parte integral das estruturas que regem o trabalho, o tempo e a vida.

que as organizações e a sociedade parem de ver a maternidade como um afastamento, uma pausa, ou algo temporário. É um renascimento.

Cada mulher, cada mãe, tem o direito de exercer a sua maternidade do jeito que acredita ser o melhor. Aqui, no coração da minha experiência, entendo que a maternidade não é o destino final.

O papel da mulher não é ser mãe, mas sim ser aquilo que ela quiser, em qualquer período da sua vida. A maternidade é mais um dos muitos caminhos, uma forma – entre tantas – de nos lançar ao mundo.

A revolução que proponho, talvez um tanto poética, é uma anarcomaternidade, uma maternidade que se recusa a ser enquadrada, padronizada. Uma maternidade radicalmente humana, que clama por uma cultura em que o cuidar, o maternar, o parir-se a si mesma sejam vistos como força, e não fraqueza. Porque nós, mulheres, parimos a nós mesmas tantas e tantas vezes. A cada novo desafio, a cada nova escolha.

A maternidade, para mim, foi um renascimento. Encontrei-me em um novo corpo, com uma nova urgência, um novo propósito. Porque agora, mais do que nunca, vejo com clareza que meu maior legado se encontra com meu maior feito: a produção de uma vida. Meu filho.

Isso muda tudo. Se antes eu me via comprometida em promover mais justiça, mais equidade, mais inclusão em um mundo corporativo que ainda precisa aprender tanto, agora vejo essas lutas com outros olhos. Porque o futuro que construo não é apenas para mim, nem para minha carreira, nem para os grupos sociais que defendo e promovo. É também para ele. Para todos que, como ele, herdarão este mundo.

Por isso, deixo aqui esse convite: que as organizações e a sociedade parem de ver a maternidade como um afastamento, uma pausa, ou algo temporário. É um renascimento. E como tal, deve ser acolhido com respeito, com estruturas que permitam que essa mulher – e todas as pessoas que cuidam – voltem ao mundo com sua nova força. Mais prontas do que nunca para continuar a revolução, agora com um coração maior, pulsando por justiça, por equidade e por um futuro onde o cuidar não é exceção, mas regra.

Este é o novo mundo que estamos parindo. E eu não poderia estar mais otimista.


SOBRE A AUTORA

Ana Bavon é advogada, fundadora, CEO e Head de Estratégia da B4People. Com clientes como Gol Smiles, Bayer, Basf, Alpargatas, Raízen, ... saiba mais