Meu nome não é Alexa. Nem o seu

A comunicação digital rápida está mudando nossas relações pessoais e profissionais. Será que nos transformamos na geração CTA?

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Ricardo Moreno 3 minutos de leitura

Tanto tempo em frente a uma tela, e boa parte dele sozinhos, parece estar contribuindo para piorar as nossas interações com humanos. Na rotina atual, estamos normalizando a ideia de respostas rápidas e precisas, quase automáticas. Esqueceu o nome de um ator? Google. Quer mudar a música? Alexa. Tem uma dúvida? ChatGPT.

Aos poucos, a ideia de que o mundo pode ser gerido por comandos instantâneos se torna cada vez mais natural, sem espaço para pausas ou reflexões. No jargão do marketing digital, isso é chamado de CTA, abreviação para call to action. Eu digo, você faz. Mas até que ponto estamos transferindo essa expectativa para as pessoas à nossa volta?

Eu mesmo me pego, várias vezes, com a equipe do The Summer Hunter, repetindo esse mau hábito: dou um comando e já espero uma resposta na hora. Na verdade, espero mais que isso – quero uma solução imediata. E foi justamente essa percepção que me levou a escrever esta coluna.

Plataformas como Slack, Notion e Monday garantem que a gente possa trabalhar de qualquer lugar do mundo, com tarefas sendo delegadas com a mesma praticidade com que se pede para a Alexa tocar uma música.

Um levantamento da Wakefield Research, empresa especializada em pesquisas de mercado, apontou que o uso dessas plataformas pode economizar até 90 minutos por dia, eliminando e-mails e reuniões desnecessárias.

Além disso, 70% dos trabalhadores preferem essa agilidade, segundo a "Harvard Business Review", pois reduz o tempo gasto com processos burocráticos. Mas isso levanta uma questão: será que estamos nos desumanizando?

Nos momentos em que dividimos o mesmo ambiente físico com outras pessoas, as interações cara a cara nos proporcionam um contexto humano impossível de se captar por ferramentas digitais – nem mesmo no Meets ou no Zoom, em que vemos as expressões faciais.

No cafezinho ou no almoço, ao olhar para uma colega, percebemos se teve uma noite insone, se está triste ou estressada. Esse contato visual e pessoal nos faz ajustar a maneira como tratamos os outros: nos tornamos mais pacientes, compreensivos e solidários. Já no trabalho remoto, ganhamos flexibilidade, mas perdemos a percepção que apenas o olho no olho e a presença física conseguem transmitir.

Ao priorizar a eficiência, esquecemos que, por trás de cada mensagem ou comando, existe uma pessoa que merece atenção.

O que restam são comandos rápidos: “gerar relatório”, “revisar o texto”, “reescrever”, “não gostei”, “amei”. Independentemente de a avaliação ser positiva ou negativa, a nuance do tom de voz e o contexto se perdem.

Aos poucos, estamos nos tornando a geração CTA.

Atenção: não estou levantando a bandeira do retorno ao trabalho presencial. Sou um grande defensor do modelo remoto – tanto que, no The Summer Hunter, aplicamos a ideia de anywhere office, com nossa equipe espalhada pela Bahia, litoral de São Paulo, Rio de Janeiro, Sul do Brasil e até Menorca, na Espanha. O ponto é: como manter a empatia e a conexão humana mesmo à distância?

É verdade que a objetividade traz benefícios. A tecnologia elimina reuniões desnecessárias e aumenta a produtividade. No entanto, há o risco de reduzir as pessoas a executores de tarefas.

Um estudo da Microsoft revelou que o excesso de comunicação digital está associado ao aumento da sensação de isolamento e exaustão, com 54% dos colaboradores relatando que se sentem emocionalmente desconectados dos colegas.

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Ao priorizar a eficiência, esquecemos que, por trás de cada mensagem ou comando, existe uma pessoa que merece atenção.

Por isso, é fundamental humanizar nossas interações. Pequenos gestos, como perguntar sobre o final de semana de um colega ou iniciar uma conversa casual, criam um ambiente de confiança e promovem conexões mais profundas. Esses momentos, aparentemente irrelevantes, fazem uma diferença significativa.

No fim das contas, não podemos esquecer que ainda somos humanos, não robôs. E, por mais corrida que seja a rotina, dedicar tempo para ser gentil pode tornar o dia a dia mais leve, tanto para nós quanto para quem está ao redor.

Então, da próxima vez que for enviar um comando, no trabalho ou na vida pessoal, pode ser importante refletir se estamos tratando as pessoas como tratamos a Alexa.

ChatGPT, revisar o texto acima.


SOBRE O AUTOR

Ricardo Moreno é fundador do The Summer Hunter, plataforma de conhecimento e conteúdo que aborda o lado solar da vida em newsletters, ... saiba mais