Pessoas amplificam Amazônia pelo mundo como legado da COP30
Participação popular reafirma a relevância da sociedade para o avanço de medidas e o impacto nas negociações

No campo político, o simbólico é ação, construção da realidade, influência e capital. E o simbólico ocorre por meio de pessoas, gestos, cultura, imagens e comunicação. O simbólico se apoia em relações e redes, ação e reação, e os impulsiona.
A 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30) foi fortemente marcada pela participação popular que, como poder simbólico, age como grande impulsionadora de negociações e legitimação.
À margem da estrutura oficial da ONU, havia uma potente rede de atores que manteve a voz da sociedade em alto e bom som, reverberando também na zona azul, área restrita aos negociadores e observadores oficiais.
Em toda Belém, foram mais de 70 “casas” da sociedade civil, espaços que receberam eventos, debates, exposições e atrações culturais e ativistas. Algumas mais focadas em diálogos de empresas e outras, com grande presença de ativistas e lideranças territoriais.
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Em comum, todas contavam com a recepção calorosa do povo paraense, refletida nas lideranças do território, equipes locais, caterings e artistas convidados, que deram o tom e o ritmo desta COP30.
Esse espírito se mostrou presente em todas as manifestações, como na Marcha Global pelo Clima, conhecida ainda como A Grande Marcha dos Povos, no sábado, dia 15. Tradicional nas COPs realizadas em países democráticos, foi a maior já vista na história da cúpula, reunindo mais de 70 mil pessoas.
A marcha também chamou atenção por congregar milhares de povos indígenas de diferentes regiões amazônicas e de outros biomas do Brasil e do mundo. O evento unificou lutas socioambientais e levou a Amazônia para o debate.

Na pauta, cobrança por demarcação de terras indígenas e acesso direto ao financiamento climático para as comunidades e povos tradicionais, sem intermediários eram as principais bandeiras.
Integrantes do governo, como a ministra Marina Silva, do Meio Ambiente, e a ministra Sonia Guajajara, dos Povos Indígenas, participaram da marcha, que saiu do Mercado de São Brás, no centro histórico, até a Aldeia Cabana.
Foram 4,5 quilômetros sob sol forte, num ato representativo, também, sobre a urgência de decisões práticas de combate ao aquecimento global, adaptação e justiça climática.
A Universidade Federal do Pará (UFPA) também foi um grande ponto de encontro e confluência, recebendo a programação diária da Cúpula do Povos com feira agroflorestal, espaços de eventos e o famoso navio Rainbow Warrior III, do Greenpeace, além da sensação free zone, um palco de shows que atraiu milhares de pessoas moradoras de Belém, todas as noites.

O Greenpeace atraca o Rainbow Warrior em locais estratégicos para pressionar lideranças globais em favor de pautas ambientais e, no caso da COP, medidas mais ambiciosas. Além de ponto de ativismo aberto à visitação pública, a embarcação funcionou como um hub para indígenas, quilombolas e a sociedade civil.
No domingo, dia 16, a Cúpula dos Povos entregou sua carta oficial ao presidente da COP, embaixador André Corrêa do Lago, contendo 15 pontos que sintetizam as demandas construídas na primeira semana de debates entre as lideranças populares de 62 países, entre eles, indígenas, quilombolas, pescadores artesanais, movimentos sociais e organizações da sociedade civil.
Os atos já traziam, em si, um grande peso porque, neste ano, a COP voltou a ser realizada em um país democrático. Esse impacto esteve presente na aglomeração e manifestações de milhares de pessoas. As pautas também exerceram forte impacto sobre todos os públicos envolvidos na COP, como delegações, governos locais e opinião pública global.

No início da segunda semana, o governo brasileiro anunciou o processo de homologação de 20 áreas indígenas.
A expansão legal do território indígena na Amazônia tem o potencial de prevenir 20% do desmatamento adicional e reduzir as emissões de carbono em 26% até 2030, segundo dados da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) e do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM).
A estatística é apenas mais uma evidência da relevância dos povos e territórios indígenas para a preservação do meio ambiente e o equilíbrio climático.
A participação da sociedade tornou Belém um grande polo efervescente amazônico. A cultura ergueu bastiões em todo o canto, e estabeleceu marcos na cidade, como a nova Casa Dourada, que foi reformada pelo Instituto Psica, com consultoria da Impact Beyond e recursos da World Climate Foundation, além de patrocínio da Open Society Foundation, Instituto Heineken e Mercado Livre, e apoio do ICCI (Instituto Cultura, Comunicação e Incidência) e iCS (Instituto Clima e Sociedade).
O objetivo é tornar a Casa Dourada um legado permanente da COP30, para que abrigue manifestações culturais e empreendedoras, ampliando-as para o mundo como vetor dos saberes ancestrais amazônicos, incluindo a relação equilibrada com o meio ambiente.
Em parceria com o Ministério da Cultura, o Instituto Psica inaugurou a exposição coletiva “Daquilo que aqui coexiste”, que coloca a cultura pulsante das ruas, becos, casas e periferias como protagonista do debate contemporâneo, além da sacralidade da floresta.
A mostra traz a Amazônia urbana como território de luta, afeto e festa, por meio de pinturas, fotografias e vídeos de 12 criadores da região metropolitana, sob a curadoria de Éder Oliveira.
Ao deslocar o olhar que tradicionalmente é projetado sobre a região, a exposição amplia a discussão e a participação dos povos no debate, a partir de agora e para o futuro, como parte essencial das decisões coletivas.
A expansão legal do território indígena na Amazônia tem o potencial de reduzir as emissões de carbono em 26% até 2030.
A Casa Dourada também abriga as exposições Realidade Aumentada, da Gruta de Kamukuwaká; Jogo Munduruku – a floresta corpo-território, de Salve Gomes; e Caruru – ecos e saberes dos territórios guianenses, de artistas da Guiana.
O campo simbólico, que vai além da comunicação formal, estava articulado e ativo, com influência relevante sobre a imagem da COP e da Amazônia perante a população global.
A presidência da COP30, por sua vez, deu demonstrações inequívocas da habilidade da diplomacia brasileira, reconhecida como uma das mais eficientes entre os países.
Além da pressão por decisões urgentes em favor do clima, especialmente com implementação de medidas práticas de adaptação, o desejo é de que os compromissos ali firmados se concretizem por meio e políticas públicas, regulamentações e práticas empresariais e alcancem corações e mentes, estabelecendo a régua comum do bem viver e do respeito mútuo aos povos, saberes e meio ambiente, com desenvolvimento, equidade e preservação.
