Tenha lideranças ativistas, tenha uma empresa de sucesso
Ouço com frequência comentários sobre o fato de eu ser ativista de software livre e privacidade há mais de 15 anos, praticamente desde que minha carreira em tech ficou séria. Muitas vezes, estes comentários são em tom de desprezo, diminuindo ativistas a pessoas que estão com a cabeça na lua e não sabem ganhar dinheiro – ou odeiam dinheiro, o que é ainda mais frequente.
Pois ter líderes que também são ativistas oferece uma série de benefícios significativos para as organizações e para a sociedade como um todo – incluindo o lucro e o sucesso destes empreendimentos.
Líderes-ativistas são uma aquisição importante para empresas que desejam ter sustentabilidade e impacto positivo no mundo.
Líderes que são ativistas não apenas demonstram um comprometimento mais amplo com questões sociais, ambientais, de justiça e direitos humanos, mas também inspiram uma cultura de responsabilidade corporativa e engajamento cívico.
Suas ações e posicionamentos em assuntos relevantes não apenas fortalecem a reputação da empresa, mas também podem impulsionar a inovação ao identificar oportunidades de negócios alinhadas com valores éticos.
Além disso, líderes-ativistas são mais propensos a atrair talentos que buscam um propósito além do lucro, criando equipes mais engajadas e motivadas. Em última análise, sua influência ampliada vai além dos limites da empresa, contribuindo para um impacto positivo na comunidade e na sociedade.
Um exemplo de que gosto muito é Steve Wozniak, braço direito de Steve Jobs e um dos criadores do computador pessoal. Embora possa não ser tradicionalmente conhecido como ativista social ou político, ele expressa uma forte crença em tornar a tecnologia – especificamente, os computadores – acessível a todos.
Essa crença se alinha com uma espécie de "ativismo" pelo empoderamento e inclusão tecnológica. Foi esse valor que, junto com a genialidade de Jobs, difundiu o conceito do computador pessoal acessível a indivíduos. Wozniak sempre defendeu a educação e a acessibilidade com relação a computadores pessoais.
Ele desempenhou um papel significativo na concepção e no desenvolvimento dos modelos Apple I e Apple II, que estavam entre os primeiros computadores pessoais que ajudaram a democratizar a computação e torná-la acessível a um público mais amplo.
Seu trabalho contribuiu para moldar o cenário da tecnologia moderna, enfatizando a importância de colocar o poder da computação nas mãos dos indivíduos.
Nesse sentido, o compromisso de Wozniak em tornar a tecnologia disponível para todos pode ser visto como uma forma de ativismo que visa eliminar a exclusão digital e garantir que mais pessoas tenham a oportunidade de se envolver e se beneficiar dos avanços tecnológicos.
Para não ficarmos nos exemplos relacionados à tecnologia, temos Anita Roddick, fundadora da The Body Shop, comprada pela Natura por € 1 bilhão, apesar de ser uma empresa com a certificação empresa B (ou B-corp). Sua empresa moldou o consumo de cosméticos éticos e vem modificando a indústria, com um impacto não só bilionário, mas social e ambiental que pode ser medido e avaliado.
Na mesma linha, Yvon Chouinard é o fundador da Patagonia, uma empresa de roupas e equipamentos para atividades ao ar livre focada na sustentabilidade ambiental. Chouinard é aberto sobre seu ativismo ambiental. Ele tem sido um forte defensor de práticas comerciais responsáveis e conservação ambiental.
A Patagônia está avaliada em mais de US$ 4.5 bilhões. Mas Chouinard doou suas ações para tornar o planeta Terra seu único acionista e abriu uma fundação que atua na luta contra as mudanças climáticas.
Além de apaixonados, ativistas são mais ousados e suas certezas de que podem construir não só negócios saudáveis, mas empresas que colaboram com a melhoria do mundo, acabam impulsionando negócios, trazendo benefícios para todos os envolvidos e para a sociedade.
Gosto muito também da história de Mitch Kapoor, um gênio pouco conhecido fora dos círculos de tech, mas um dos meus ídolos, pois foi co-fundador da Lotus Development Corporation e criador do Lotus 1-2-3, um dos primeiros programas de software de planilhas (leiam "Dreaming in code", que conta a história de como ele e seu time realizaram essa façanha).
Kapor co-fundou a Electronic Frontier Foundation (EFF), uma organização sem fins lucrativos focada na defesa das liberdades civis no mundo digital (como, por exemplo, a privacidade). Também esteve envolvido em iniciativas relacionadas ao acesso à tecnologia e à redução da exclusão digital.
Por último, trago Steve Ballmer, ex-CEO da Microsoft, que esteve ativamente envolvido em várias iniciativas filantrópicas e educacionais, particularmente focadas em educação digital e treinamento de desenvolvedores. Seus esforços nessas áreas demonstram o compromisso de alavancar a tecnologia para o empoderamento educacional e econômico.
Do mesmo modo, essa crença o levou a impulsionar a compra do GitHub pela Microsoft - a maior rede de desenvolvedores de código do mundo – e também o repositório que o ajudou a treinar as IAs da Microsoft para a criação das lucrativas ferramentas de assistentes de código da empresa.
Steve Balmer, ao contrário de muitos líderes, mas em linha com todos que citei aqui, não tinha vergonha alguma de subir no palco e defender suas crenças apaixonadamente – para platéias de negócios. O famoso canto entoado por ele numa conferência da Microsoft em 2000 demonstra o nível de sua paixão, e um momento memorável na história da empresa.
Líderes-ativistas são uma aquisição importante para empresas que desejam ter sustentabilidade e impacto positivo no mundo. Mas não só isso: também para aquelas que querem e gostam de ganhar dinheiro.