Um brinde às brincadeiras de criança
É domingo e meus filhos estão cada um em um jogo eletrônico. Há muito mais horas do que recomendam os especialistas. Já quero deixar isso claro pra que nenhuma leitora ou leitor forme uma imagem ideal enquanto ergo meu copo para o brinde deste mês, que tem um quê de romantização da infância. Vamos lá, eu gostaria de fazer um brinde a brincar, toda vez que te mandarem trabalhar.
Também já quero avisar que não sou expert nisso. Na verdade, passo muito mais tempo levando trabalho a sério demais. Uma parte do meu cérebro, provavelmente como o seu, pensa que seriedade é algum tipo de pressuposto para a excelência. Mesmo que uma outra parte desse mesmo cérebro saiba, por experiência, que é quando eu me permito me divertir que consigo chegar aos melhores resultados.
Crianças criam uma realidade paralela e sem uma lógica linear vão desenhando histórias e soluções. Quando os adultos menos esperam, inventam uma nova ferramenta ou chegam a uma conclusão muito inteligente. O exemplo mais concreto disso está no exercício Torre de Espaguete, do designer Peter Skillman, que passou quatro meses reunindo grupos e propondo a eles o mesmo desafio: erguer a estrutura mais alta possível com vinte unidades de espaguete cru, um metro de fita adesiva e um metro de barbante. Por fim, um marshmallow, que deveria ficar apoiado no topo da estrutura. Contra todas as expectativas, grupos formados por crianças invariavelmente superavam os adultos. Elas construíram estruturas com em média 66 centímetros. Já os alunos de pós-graduação não passavam de 25 centímetros, os advogados de 38 e os CEOs, 55. Apesar de as ações dos garotos do jardim de infância parecerem desorganizadas, eles tinham um comportamento eficiente: não competiam por status, cooperavam com energia, experimentavam e arriscavam.
Elas mantinham um comportamento aberto, no lugar de adotar uma postura muito comum aos adultos no mundo do trabalho: fingir que sabemos o que estamos fazendo. Nós, adultos (em especial minha turma, dos 40 mais), temos mania de fingir que sabemos coisas ou que somos melhores do que outras pessoas simplesmente por medo. O problema é que, ao entrar nesse modo, deixamos de aprender, de arriscar e, portanto, de acertar.
Brincadeira de criança é poder ter uma ideia pra jogar fora na hora seguinte. É saber lidar com um cenário imperfeito e se dar a chance de fazer o imprevisível. Se abrir para as possibilidades da imaginação, se desequilibrar pelo caminho mas se dar a chance de criar uma jogada espetacular que ninguém imaginou possível.
Brincadeira de criança é poder ter uma ideia pra jogar fora na hora seguinte. É saber lidar com um cenário imperfeito e se dar a chance de fazer o imprevisível.
Estamos presos demais à ilusão da linearidade. De que existe um jeito certo de fazer. Mas quando diante de nós estão problemas complexos, é preciso brincar com eles. Como fazem as crianças no exercício do macarrão, dividindo conhecimento, trabalhando em grupo, abandonando a lógica linear.
Vamos ser sérios que se divertem. Entrar no risco. Construir algo sem as condições perfeitas e sem o compromisso de que o resultado seja perfeito. Mas dando tudo de nós para fazer o melhor com as condições que existem – tal qual as brincadeiras de criança. Um brinde a elas!