Gráfico que ajudou a popularizar a crise climática ganha uma versão mais preocupante

Agora, as famosas “faixas climáticas” também mostram os efeitos do aquecimento global nos oceanos e na atmosfera. E algumas revelações podem surpreender

Crédito: Ed Hawkins

Elissaveta M. Brandon 3 minutos de leitura

Poucas imagens tiveram tanto impacto no debate global quanto as “faixas climáticas” criadas por Ed Hawkins.

Desde que o cientista britânico divulgou o gráfico, em 2018, ele já apareceu em outdoors na Times Square, em latas de cerveja, em desfiles de moda e até em um cachecol usado pelo falecido Papa Francisco. A imagem se tornou tão icônica que passou a fazer parte do acervo permanente de design do MoMA (Museu de Arte Moderna de Nova York).

Mas há um detalhe importante: até hoje, essas faixas retratavam apenas uma parte da realidade – a média de temperaturas na superfície terrestre. Só que as mudanças climáticas não afetam apenas os continentes.

Agora, uma nova versão do gráfico também mostra os efeitos do aquecimento global nos oceanos e na atmosfera. E algumas revelações podem surpreender.

A atualização foi feita com a colaboração de Ric Williams, professor do departamento de Ciências da Terra, Oceano e Ecologia da Universidade de Liverpool, na Inglaterra, além de outros cientistas da própria instituição e do serviço meteorológico britânico.

Os dados usados no gráfico já estavam disponíveis, mas eram pouco conhecidos pelo grande público. “Recebi duas sugestões: uma perguntando ‘e a atmosfera?’ e outra, ‘e os mares?’. Então, parecia natural incluir essas dimensões”, conta Hawkins.

Para os mares, a equipe usou uma combinação de medições históricas feitas por navios e dados do programa Argo – uma rede internacional com cerca de quatro mil sensores flutuantes que monitoram a temperatura e a salinidade do oceano.

“faixas climáticas” criadas por Ed Hawkins
Crédito: Ed Hawkins

O resultado mostra que ele está aquecendo quase no mesmo ritmo da atmosfera. Isso porque cerca de 90% do calor extra gerado pelos gases de efeito estufa acaba sendo absorvido – o que contribui para o branqueamento dos corais, a morte de espécies marinhas e a elevação do nível do mar (por causa da dilatação térmica da água).

Já os dados da atmosfera revelam um cenário mais complexo. Enquanto a troposfera – camada mais próxima da superfície – continua aquecendo, a estratosfera, que fica logo acima, está esfriando.

Pode parecer contraditório, mas para Hawkins essa diferença é uma das provas mais claras de que o aquecimento global é causado por ações humanas.

Isso acontece porque o dióxido de carbono atua como um cobertor térmico, retendo o calor nas camadas mais baixas e impedindo que ele chegue às superiores. Ao mesmo tempo, o excesso de CO2 na estratosfera facilita sua dispersão para o espaço, acelerando o resfriamento dessa camada.

Outro fator é a camada de ozônio. Nas décadas de 1970 e 1980, os CFCs – substâncias presentes em aerossóis e refrigeradores antigos – danificaram a camada de ozônio, reduzindo a absorção de radiação solar na estratosfera e intensificando ainda mais seu resfriamento. Apesar de estar em recuperação, os efeitos dessa destruição ainda aparecem nos dados.

Para Hawkins, esse padrão de aquecimento embaixo e resfriamento em cima é um “sinal claríssimo” da influência humana. “Nada mais explica essa mudança”, afirma.

O PODER DE UMA IMAGEM

Quando as faixas climáticas foram publicadas pela primeira vez, a imagem foi baixada mais de um milhão de vezes só na primeira semana. Embora seja difícil medir seu impacto além dos números, Hawkins acredita que o gráfico ajudou muitas pessoas – inclusive aquelas que nunca haviam se interessado por ciência climática – a se conectar visualmente com os dados.

modelo usa um lenço com estampa das faixas climáticas
Crédito: Reprodução/ Instagram

A nova versão é mais complexa e provavelmente não se tornará um viral como a original. Mesmo assim, ele acredita que será uma ferramenta valiosa para públicos mais especializados. “Precisamos de diferentes formas de comunicar, de acordo com o nível de conhecimento de cada público.”

E talvez o gráfico precise de novas cores. Quando 2024 foi confirmado como o ano mais quente da história – superando o recorde de 2023 –, Hawkins teve que adicionar uma nova faixa vermelho-escura, quase preta.

Se as temperaturas continuarem subindo, como os cientistas preveem, ele terá que redesenhar toda a escala visual – e já se prepara para ajustar o gráfico. “Isso, por si só, já é uma mensagem importante”, conclui.


SOBRE A AUTORA

Elissaveta Brandon é colaboradora da Fast Company. saiba mais