Marketing dopamina: o que marcas tradicionais podem aprender com o “hype”
Na era do design saturado de estímulos, marcas tradicionais precisam aprender a se reinventar sem perder sua essência

Em 2015, a Microsoft afirmou que nossa capacidade de atenção havia caído para oito segundos – menos que a de um peixinho dourado. A ciência nunca confirmou com precisão, mas em tempos de TikTok, parece plausível. Dez anos depois, é difícil mensurar por quanto tempo ainda conseguimos nos concentrar em algo.
Essa mudança comportamental é uma das grandes transformações sociais de nossa era e novas marcas já estão capitalizando em cima dela. As chamadas "marcas dopamina" surgem com designs impactantes, embalagens vibrantes e campanhas que funcionam como injeções instantâneas de prazer visual.
Os lançamentos se esgotam em minutos, colabs inesperadas geram escassez e fila de espera e os produtos viram verdadeiros eventos digitais. Mas, como todo pico de dopamina, há também uma queda.
Muitas dessas marcas começam agora a lutar para manter relevância a longo prazo. Enquanto isso, marcas tradicionais assistem do lado de fora, vendo parte de seu público migrar e se perguntando o que fazer.
A resposta não está em rivalizar com as marcas dopamina, mas em aprender com elas. Quem construiu ativos icônicos e confiança emocional ao longo de décadas já tem meio caminho andado. O segredo está em se permitir pequenas disrupções, sem perder de vista aquilo que faz da marca algo amado.
DESIGN COM DOPAMINA, MAS COM PROPÓSITO
A embalagem é o primeiro e mais poderoso ponto de contato entre marca e consumidor. É vitrine, é gancho sensorial, é sinal cultural. Quando bem pensada, não causa só excitação momentânea, mas cria uma conexão emocional duradoura.
Para marcas consolidadas, o caminho não é rasgar o manual, mas saber onde e como injetar novidade. Edições limitadas são um ótimo começo, mas precisam ser fiéis ao DNA da marca. Quando lançamentos parecem oportunistas ou artificiais, o público percebe. A inovação deve nascer daquilo que já é amado.

Quando bem feitas, essas edições limitadas não geram apenas um pico de atenção: constroem confiança e geram efeito positivo sobre o portfólio principal da marca.
Um bom exemplo foi a edição especial do uísque Johnnie Walker inspirada no seriado "Round 6". O design uniu os ativos visuais de ambas as marcas com respeito e coerência. O resultado mostrou que é possível entregar, ao mesmo tempo, uma bebida de qualidade e uma dose de humor culturalmente relevante.
A parceria entre Heinz e Absolut, que lançou um molho de macarrão com vodca, exemplifica bem como o design pode multiplicar valor.
A colaboração funcionou porque cada marca celebrou o que mais a distingue – o vermelho da Heinz, o rótulo limpo da Absolut – em um visual coeso. O sucesso não veio de ceder espaço, mas de combinar forças criativas de maneira genuína.
O PODER DAS MARCAS CLÁSSICAS FRENTE ÀS "MARCAS DOPAMINA"
Marcas tradicionais não precisam se reinventar para seguir relevantes, mas precisam estar atentas ao que acontece ao seu redor. A embalagem, sendo um dos pontos mais viscerais e táteis de uma marca, é um excelente canal para sinalizar essa sintonia com o presente.

Mexer nos ativos de forma criativa, mesmo que sutil, pode ter um impacto profundo. Ao construir com base no respeito mútuo entre parceiros e na confiança já estabelecida com o público, marcas consolidadas conseguem ocupar espaço cultural com legitimidade e despertar o interesse de novas gerações.
O risco está em exagerar na dose: um design saturado de estímulo pode confundir a identidade da marca e afastar consumidores fiéis. A chave é construir a partir do que as pessoas já conhecem e amam.
Isso dá às marcas permissão para inovar e credibilidade para serem levadas a sério quando o fazem. Quando essa equação é bem resolvida, abre-se caminho para um futuro criativo sem limites – e com consumidores prontos para voltar, uma vez após a outra.