COP30 e o futuro do ESG no Brasil: impactos, desafios e novas perspectivas

Se bem articulada, a COP30 pode deixar um legado transformador, consolidando o Brasil como um protagonista na governança climática global

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Carlos Braga e Denise Hills 6 minutos de leitura

A COP30, a ser realizada em Belém, coloca o país em um cenário único para liderar a transição para uma economia mais sustentável em nível global. A adoção de práticas ESG no Brasil tem se intensificado, impulsionada pela crescente pressão de investidores, consumidores, reguladores e stakeholders.

No entanto, o contexto global, marcado por um movimento pontual contra a agenda ESG agravado pelos impactos cada vez mais visíveis das mudanças climáticas, cria um cenário complexo, desafiador, mas repleto de oportunidades para as empresas que investem nestas práticas no nosso país.

O CRESCIMENTO DOS INVESTIMENTOS EM ESG NO BRASIL

Os investimentos em ESG no Brasil têm registrado um crescimento significativo nos últimos anos. O número de fundos sustentáveis subiu de 134 para 257 em 2024, segundo a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). Já a captação foi de R$ 10,9 bilhões, mais de 10 vezes o valor levantado em 2023.

Destaque ainda para a emissão de títulos verdes, que atingiu o volume recorde de R$ 94.5 bilhões em 2024, aproximadamente 32% acima do que havia sido o maior volume da série histórica, ocorrido em 2021 (R$ 71,1 bi).

Tal tendência é impulsionada pelo interesse dos investidores por retornos de longo prazo mais sustentáveis, mitigação de riscos climáticos e pela crescente conscientização sobre a importância destas práticas para o sucesso dos negócios. 

O IMPACTO FINANCEIRO DOS RISCOS CLIMÁTICOS

Eventos extremos, como as enchentes no Rio Grande do Sul e os incêndios florestais em diversas regiões do Brasil em 2024, demonstram o alto custo financeiro associado aos riscos climáticos.

Segundo a CNseg, os prejuízos causados pelas enchentes no Rio Grande do Sul foram de aproximadamente R$ 4 bilhões em 2024, reduzindo o apetite do mercado para oferecer este tipo de cobertura no país.

Esses eventos servem ainda como um alerta para a necessidade de uma regulação que incentive os investimentos em adaptação e mitigação do impacto crescente das mudanças climáticas no Brasil.

OS DESAFIOS DA IMPLEMENTAÇÃO DE PRÁTICAS ESG NO BRASIL

A falta de dados confiáveis e comparáveis sobre o desempenho ESG das empresas, a complexidade da legislação ambiental e a resistência de alguns setores da economia são alguns dos obstáculos a serem superados.

Para tanto, vale destacar a adoção pela CVM, por meio da resolução CVM 193, da necessidade de divulgação de relatórios de sustentabilidade baseados nas normas IFRS S1 e IFRS S2 de forma obrigatória pelas empresas abertas a partir de 2026.

Tal iniciativa, pioneira em nível global, terá grande impacto para a aceleração das práticas ESG no Brasil, bem como servirá como um estímulo para atração de investimentos estrangeiros.

O MOVIMENTO ANTI-ESG E SUAS IMPLICAÇÕES

O movimento contra a agenda ESG nos Estados Unidos, liderado por sua nova administração federal e grupos empresariais ligados principalmente aos setores de combustíveis fósseis, gera incertezas e pode afetar as decisões de investimento de empresas globais. No entanto, a maioria dos investidores institucionais e dos consumidores em todo o mundo continua a valorizar as práticas ESG.

As empresas e países que não se adaptarem a essa nova realidade correm o risco de perder competitividade, sofrer boicotes e ser alvo de litigância climática que, segundo a ONU, somam mais 230 casos iniciados contra corporações desde 2015, com 70% deles julgados a favor dos reclamantes.

INOVAÇÃO, O MOTOR DO ESG

A inovação tem se consolidado como um elemento-chave para a aceleração da agenda ESG no Brasil. Soluções tecnológicas voltadas para eficiência energética, economia circular, monitoramento ambiental e finanças sustentáveis estão redefinindo a forma como as empresas incorporam práticas ESG em suas estratégias de negócios.

O avanço das startups de impacto, o crescimento de investimentos em venture capital voltados à sustentabilidade e a adoção de novas tecnologias, como blockchain para rastreabilidade e inteligência artificial para análise de riscos climáticos, demonstram o papel central da inovação nesse contexto.

No setor financeiro, a digitalização de processos e a criação de novos instrumentos – como os green bonds tokenizados e as plataformas de crédito de carbono – têm ampliado o acesso a mecanismos de financiamento sustentáveis.

Este é um momento-chave para alavancar o engajamento do setor privado na agenda climática.

Além disso, indústrias que tradicionalmente enfrentavam desafios na transição para um modelo mais sustentável, como a siderurgia e o agronegócio, estão incorporando práticas inovadoras para reduzir suas emissões e mitigar impactos ambientais.

Entretanto, a inovação ESG no Brasil ainda enfrenta barreiras significativas. A ausência de incentivos estruturados, a necessidade de maior integração entre academia e setor produtivo e a dificuldade de escalabilidade de novas soluções são desafios que precisam ser superados.

Políticas públicas que promovam pesquisa e desenvolvimento em tecnologia sustentável, aliadas a um ecossistema regulatório que favoreça a experimentação, serão fundamentais para que a inovação cumpra seu papel como motor da transição para uma economia de baixo carbono no Brasil.

A COP30 COMO CATALISADOR DE MUDANÇAS

A realização da COP30 no Brasil representa uma oportunidade sem precedentes para o país consolidar sua posição de liderança na agenda climática global e atrair investimentos para uma economia sustentável.

Como anfitrião do evento, o Brasil poderá impulsionar debates estratégicos sobre financiamento climático, transição energética e preservação da biodiversidade, reforçando seu compromisso com as metas do Acordo de Paris.

A montagem de uma força-tarefa sobre o clima é a prioridade do governo para a COP30, segundo o presidente da conferência, embaixador André Corrêa do Lago, que defendeu o fortalecimento e a desburocratização de fundos para acelerar os investimentos contra a mudança climática.

É um momento-chave para alavancar o engajamento do setor privado na agenda climática. Em paralelo, o alinhamento das políticas nacionais com padrões internacionais – como as normas IFRS S1 e S2 para relatórios de sustentabilidade –, o mercado regulado de carbono e o plano de transformação ecológica são somente alguns exemplos de como essas temáticas vão direcionar investimentos, bem como o engajamento de empresas, governo e sistema financeiro, aumentando a transparência e a capacidade de atrair investimentos.

Apesar das oportunidades, o Brasil precisará superar desafios para garantir que a COP30 seja um marco efetivo para a agenda ESG. A necessidade de equilibrar desenvolvimento econômico e conservação ambiental, a complexidade das negociações sobre financiamento climático e as possíveis pressões políticas em um cenário global volátil serão obstáculos a serem enfrentados.

Ainda assim, se bem articulada, a COP30 pode deixar um legado transformador, impulsionando a implementação de políticas mais ambiciosas e consolidando o Brasil como um protagonista na governança climática global.


SOBRE O AUTOR

Carlos Braga é professor associado e coordenador do Centro de Referência em Inovação e ESG da Fundação Dom Cabral, conselheiro sênior ... saiba mais