Cristovam Ferrara: “a educação é inovadora na sua origem”

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Claudia Penteado 6 minutos de leitura

No Brasil, o Dia do Professor é comemorado em 15 de outubro por conta de uma lei instituída por D. Pedro I, exatamente no dia 15 de outubro de 1827, que ficou conhecida como Lei Geral relativa ao Ensino.

Mais de um século e meio depois, o país continua buscando caminhos para melhorar a qualidade do ensino. Uma iniciativa promissora de valorização de práticas inovadoras na educação brasileira é o movimento LED, parceria entre a Globo e a Fundação Roberto Marinho (e apoio de outras nove organizações), que chega agora à sua segunda edição.

A Fast Company Brasil conversou sobre o tema com Cristovam Ferrara, head de valor social da Globo. Para ele, quando a inovação é acessível, tem um enorme potencial transformador.

Ferrara: "quando a inovação é acessível, tem um enorme potencial transformador"

FC Brasil – O que é inovador e o que é revolucionário em educação?

Cristovam Ferrara – Considero revolucionário tudo o que tem o poder de impactar pessoas, aproximá-las de um futuro mais digno e colocar a comunidade em um patamar diferenciado perante a sociedade. É isso que a educação faz, ao trazer uma nova perspectiva para a trajetória das pessoas.

Desde o lançamento do Movimento LED, tivemos acesso a uma infinidade de histórias que tiveram seus cursos mudados graças a iniciativas conduzidas por empreendedores sociais que decidiram dedicar a vida a mudar a realidade dos territórios em que atuam.

Já inovação está relacionada a resoluções de problemas de uma comunidade. Nesse sentido, quando ela é acessível, tem um enorme potencial transformador. A educação é inovadora na sua origem, quando desenha uma nova perspectiva na trajetória da vida de diferentes tipos de pessoas e de suas famílias.

Considero como revolucionário tudo o que tem o poder de impactar as pessoas e aproximá-las de um futuro mais digno.

Como exemplo, podemos citar cursos que ajudam na retenção de talentos no campo, na capacitação e geração de trabalho e renda para mulheres ou mesmo projetos capazes de fazer as crianças voltarem a se interessar pela leitura e escrita – propostas de três dos seis projetos que foram reconhecidos pelo prêmio do Movimento LED 2022.

FC Brasil – Como se estruturou esta abordagem mais ampla de inovação em educação?

Ferrara – A educação tem, historicamente, um lugar de destaque na pauta social da Globo e da Fundação Roberto Marinho. Há cerca de dois anos, fizemos a escolha de priorizar ainda mais essa temática. A ideia é contribuir de maneira muito efetiva, usando o que temos de melhor: a força que os canais e produtos Globo têm de iluminar boas ações, com o propósito de engajar a sociedade.

Também queremos mostrar que a educação não tem um olhar linear. Não existe uma única maneira de aprender e de ensinar. Isso sem ignorar o protagonismo das escolas, mas mostrando que é possível aprender de múltiplas maneiras.

O Movimento LED nasceu do desejo de acelerar e incentivar o futuro da educação a partir de projetos que acontecem hoje, construindo um movimento que iluminasse e impulsionasse iniciativas inovadoras em educação. Trabalhos que precisam ser reconhecidos pela sociedade, para ganhar escala e notoriedade.

A ideia do LED é ser pulsante, vibrante, moderno. É mostrar que educação é fundamental para a construção de um futuro mais justo e igualitário. Com isso, esperamos ampliar a visão de educação e iluminar o seu poder transformador.

FC Brasil – Como chegar a essas práticas inovadoras e abarcar a diversidade de situações em um país com mais de 200 milhões de habitantes?

Ferrara – Em janeiro de 2022, abrimos o edital de premiação do Movimento LED e oferecemos o valor de R$ 1,2 milhão, que foi dividido entre seis ganhadores. Recebemos mais de 3,4 mil inscrições de projetos de todo o país, das mais diversas frentes, atendendo os mais diferentes públicos.

Escolher apenas seis projetos dentre tantos não foi uma tarefa simples. Tínhamos a obrigação de reconhecer que há, no Brasil, uma pluralidade de conhecimentos e formas de aprender, assim como as inúmeras realidades e pessoas de diferentes gêneros, raças, etnias, condições socioeconômicas, territórios, identidades e idades, abarcadas pelos projetos vencedores.

Vale ressaltar que, para que pudéssemos ter legitimidade no território da educação, o Movimento LED tem o respaldo de nove organizações que atuam no seu conselho consultivo. São organizações com tradição histórica de contribuições para o país como Unicef, Unesco, OEI, ITS, CIEB, Atlas da Juventude, Porto Digital, Vale do Dendê e Todos pela Educação.

FC Brasil – Projetos locais ou escaláveis, há algum critério neste sentido?  

Ferrara – Práticas inovadoras não são, necessariamente, aquelas que nascem de novas tecnologias, mas sim as que geram impacto positivo na comunidade a partir de ideias transformadoras e escalonáveis.

Ao desenharmos o prêmio do Movimento LED, pensamos em destacar iniciativas com grande potencial de alcance e impacto em quatro eixos: negócios inovadores, aprendizes inovadores, educadores inovadores e criadores inovadores. Esses quatro eixos foram sustentados por três critérios: inovação, impacto e escala.

FC Brasil – Em relação a outros países, como está o Brasil em termos de práticas inovadoras em educação?

Ferrara – Acredito que a inovação é fruto de um entendimento do problema vivido. Ao verificar, por exemplo, que um grupo de alunos estava desestimulado a aprender e escrever, uma professora criou um projeto de divulgação e publicação dos textos propostos. Assim nasceu o ‘Desengaveta Meu Texto’, em Campina Grande, na Paraíba.

A realidade do país estimula a capacidade de inovação e criatividade, pois há uma emergência em suprir as demandas da sociedade.

Ao perceber que os jovens locais estavam com dificuldade para ingressar em cursos técnicos ou faculdades, um professor de história criou um cursinho preparatório e começou ajudar dezenas de adolescentes na região do Jardim Ângela, em São Paulo.

Esses são alguns poucos exemplos, mas suficientes para dizer que sim, temos soluções criativas muito poderosas para enfrentar os diversos problemas regionais que existem no Brasil e que talvez não existam em outras partes do mundo.

A realidade do nosso país, sem dúvida, estimula a capacidade de inovação e criatividade, pois há uma emergência em suprir as demandas da sociedade.

FC Brasil – Por que escolher o Rio de Janeiro como palco da primeira edição do Festival LED? Que balanço faz do evento?

Ferrara – O lançamento do Movimento LED foi em São Paulo, no Museu da Língua Portuguesa, no final de 2021. Para o festival, escolhemos o Rio de Janeiro para ter essa diferenciação e prestigiar a cidade.

O Museu do Amanhã e o Museu de Arte do Rio de Janeiro (MAR) são grandes parceiros da Globo e da Fundação Roberto Marinho. Fazer o primeiro Festival do LED nesses museus foi muito simbólico e emblemático. Tivemos um excelente retorno do público presente e das pessoas que acompanharam, de alguma forma, o nosso primeiro festival.

Em dois dias, reunimos mais de 100 palestrantes e conseguimos trazer vivências, experiências, ensinamentos, humor, música, dança. Foram dois dias de muita celebração em que mostramos que a educação pode e deve ser divertida, inclusiva, plural e para todos.


SOBRE A AUTORA

Claudia Penteado é editora chefe da Fast Company Brasil. saiba mais