Empresas testam alternativas para a semana de quatro dias de trabalho

A quinzena de nove dias é uma alternativa à semana de trabalho de quatro dias que combina flexibilidade e produtividade

Crédito: pngwing/ Unsplash

Charlie Metcalfe 5 minutos de leitura

“Em resposta aos muitos rumores que circulam pelas fábricas, acho melhor começar dizendo: sim, vamos reduzir nosso horário de trabalho”. Essa foi a declaração que Bill Hewlett deu por escrito na edição de julho 1970 do Watt’s Current, o boletim informativo da empresa Hewlett Packard.

O CEO e cofundador da empresa de TI revelou que seria adotada uma “quinzena de nove dias”, com os funcionários recebendo um dia de folga a cada duas semanas. Mas o novo cronograma fatalmente viria com um corte salarial de 10%.

A Hewlett Packard estava passando por tempos difíceis. O horário de trabalho progressivo de nove dias atraiu o CEO mais do que a perspectiva de demitir 10% da equipe.

Em uma pesquisa com 3,3 mil trabalhadores, 71% disseram estar menos cansados e 48%, que a satisfação no trabalho havia aumentado.

Mais de cinco décadas depois, as dificuldades econômicas forçaram outro CEO progressista a considerar a quinzena de nove dias. Desta vez, porém, os funcionários vão manter seus salários.

A empresa britânica de recrutamento de tecnologia Otta anunciou um teste de oito meses da quinzena de nove dias para sua equipe no início de fevereiro.

O co-fundador e CEO, Sam Franklin, diz que ele e a equipe de liderança sênior se sentiram incapazes de oferecer aumentos salariais significativos aos funcionários devido à alta inflação. Em vez disso, optaram por dar um dia extra de folga a cada duas semanas – com pagamento integral.

A semana de trabalho de quatro dias ganhou destaque, em especialmente mais recentemente, com a divulgação de dados do maior teste desse modelo já feito no mundo, que incluiu cerca de 3,3 mil trabalhadores britânicos. Dos entrevistados, 71% relataram estar menos cansados e 48% disseram que a satisfação no trabalho havia aumentado.

RESULTADOS A LONGO PRAZO

Mas nem todas as organizações se sentem preparadas para funcionar com uma perspectiva de redução de 20% na jornada de trabalho. A Otta está entre o pequeno grupo de empresas que adota o cronograma quinzenal de nove dias, na esperança de obter alguns dos benefícios de uma semana de trabalho de quatro dias.

Franklin espera que a política incentive os funcionários a se tornarem mais eficientes. Para garantir esse resultado, algumas empresas que operam nesse esquema também estão introduzindo dias de “trabalho intenso”, nos quais as reuniões são proibidas.

Esta é ainda uma boa forma de estabelecer um compromisso a partir do qual a Otta pode progredir posteriormente para uma semana de quatro dias.

Será difícil atrair talentos se as empresas não oferecerem alguma flexibilidade, acompanhando as tendências pós-Covid.

Mesmo para empresas que não consideraram semanas de quatro dias, a quinzena de nove dias pode funcionar melhor a longo prazo. A Figures, uma companhia de software com sede em Paris, vinha tentando uma semana de quatro dias até cerca de seis meses atrás.

Sendo quase totalmente remota, a equipe se reunia uma vez por mês durante alguns dias. Junto com a semana de trabalho de quatro dias, a equipe de liderança da Figures percebeu que os funcionários estavam perdendo muito tempo produtivo. Eles decidiram, então, adotar a quinzena de nove dias.

Laura Giurge, professora assistente de ciência comportamental na London School of Economics, diz que as empresas provavelmente estão adotando políticas de trabalho progressivas com vistas à retenção e recrutamento, já que os funcionários ainda buscam flexibilidade no emprego. “Será difícil atrair talentos se você não oferecer alguma flexibilidade, acompanhando as tendências pós-Covid”, diz ela.

A empresa CharlieHR, sediada em Londres, descobriu que mais de um terço dos candidatos a suas vagas se referiam à programação quinzenal de nove dias como um dos três principais motivos para se candidatar.

A CloudCannon, empresa de software com operações na Nova Zelândia e Estados Unidos, recebeu mais inscrições e de candidatos de melhor qualidade quando adotou a quinzena de nove dias, de acordo com o diretor de receita Christopher Wingate.Ele agora vê o cronograma como uma importante vantagem sobre os concorrentes.

“Se você tivesse a opção de receber o mesmo salário, a mesma quantidade de horas de férias, mas trabalhando quatro dias por semana, em vez de cinco, qual emprego escolheria?” ele questiona.

TESTE BEM-SUCEDIDO

Wingate incentivou a equipe de liderança a adotar a política no início de 2022. A princípio, a empresa introduziu a política como um teste. Para garantir que os clientes recebessem comunicações durante toda a semana, os residentes nos EUA trabalhavam de segunda a quinta-feira e os da Nova Zelândia, de terça a sexta-feira.

Se você tivesse a opção de receber o mesmo salário, mas trabalhando quatro dias por semana, qual emprego escolheria?

Os gerentes examinavam minuciosamente todas as reuniões e incentivavam os funcionários a se tornarem mais engajados durante o tempo de trabalho. No final do ano, Wingate diz que todos se sentiram mais motivados e felizes. O desempenho da empresa também permaneceu o mesmo.

Foi aí que a equipe de liderança decidiu fazer a transição para a semana de quatro dias em todas as semanas. Guardaram as lições aprendidas, aumentando o tempo entre as reuniões regulares. As reuniões semanais passaram a ser quinzenais; as quinzenais passaram a ser mensais.

Apesar dos benefícios que viu no novo esquema, Wingate espera que os funcionários da CloudCannon reconheçam o privilégio de se beneficiar dessas políticas de trabalho progressivas.

As organizações que operam em setores que negociam tempo em proporção direta com o dinheiro podem se esforçar para adotar uma quinzena de nove dias sem prejuízo do desempenho.

"Temos uma receita e um modelo de negócios que nos permite fazer isso”, reconhece Wingate. “Mas, definitivamente, não é algo possível para todos.”


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