Não basta adotar o ESG na empresa. Tem que cobrar os fornecedores

Aliança com parceiros da cadeia de suprimentos pode ajudar organizações a se tornarem verdadeiramente sustentáveis

Crédito: Tim Robberts/ GettyImages

Daniel Weise 4 minutos de leitura

A corrida para salvar o planeta deu uma pressionada nos esforços corporativos para assumir e cumprir compromissos de carbono líquido zero. Mas, para que suas empresas sejam verdadeiramente sustentáveis, os CEOs precisam urgentemente se concentrar não apenas no “E” da sigla ESG. Cada uma dessas iniciais vem da expressão Environmental, Social and Governance, que, numa tradução livre, significa conduta Ambiental, Social e de Governança (por essa razão, em português também é utilizada a sigla ASG). Ou seja: já é hora de as estratégias empresariais considerarem não somente sua responsabilidade com o meio ambiente, mas também aquelas com a sociedade e com suas próprias práticas corporativas. 

Direitos humanos, segurança no local de trabalho, remuneração justa por um dia de trabalho justo, práticas comerciais éticas – essas são apenas algumas das questões sociais e de governança que os CEOs precisam abordar em sua empresa e nas empresas com as quais fazem negócios, ou seja, com os seus fornecedores.

Não se trata apenas de cumprir regulamentos. Trata-se de cumprir os princípios éticos de uma licença social que não estão no papel.  Mas fazer a coisa certa é difícil. Para ajudar os CEOs, identificamos uma série de ações que eles devem instruir seu Diretor de produtos (CPO) e a sua equipe de compras a adotarem para abordar questões sociais e de governança.

Para começar, as empresas precisam definir suas expectativas sociais e de governança em seu código de conduta de fornecedores, juntamente com suas expectativas ambientais. Elas devem, então, incorporar essas expectativas em seus contratos de fornecedores, estabelecer um processo de relatório claro, exigir que seus próprios gerentes locais monitorem os comportamentos dos fornecedores e conduzir regularmente auditorias formais.

Se forem encontradas evidências de abusos de direitos humanos, más condições de trabalho ou suborno e corrupção, os diretores devem enviar cartas personalizadas aos CEOs desses fornecedores, exigindo melhorias imediatas e oferecendo suporte e treinamento empresarial.

Em 2020, por exemplo, a Dell Technologies encomendou auditorias de terceiros para 346 fornecedores de alto risco em sua cadeia de suprimentos. Para melhorar a conformidade dos fornecedores com o código de conduta estabelecido pela Responsible Business Alliance (Aliança pela responsabilidade Empresarial), a Dell exigiu que várias fábricas concluíssem cursos como medidas de “ações corretivas” e que inscrevessem 1.439 funcionários de fornecedores em programas de “capacitação”.

Às vezes, os fornecedores não conseguem melhorar mesmo depois de receber suporte substancial. Nesses casos, os diretores devem suspender o relacionamento com esses fornecedores e revisar a situação. Outras vezes, os fornecedores se recusam a se envolver na mudança. Nesses casos, os diretores não devem hesitar em encerrar o relacionamento.

A Apple já fez isso em várias ocasiões. Em zonas de conflito, como a República Democrática do Congo e países adjacentes, onde a Apple obtém estanho, tântalo, tungstênio e ouro, os fornecedores agora precisam garantir que não financiaram ou beneficiaram direta ou indiretamente grupos armados.

Como parte desse processo de garantia, eles são obrigados a participar de programas de rastreabilidade e permitir a auditoria de terceiros projetadas para abordar e mitigar os riscos identificados. Em 2020, a Apple expulsou sete fundições e refinarias de sua cadeia de suprimentos, porque elas não atendiam aos requisitos para o fornecimento responsável de minerais ou não estavam dispostas a participar ou concluir uma auditoria de terceiros.

A rastreabilidade também pode ser difícil de fazer. A Apple está se comprometendo a “um dia” usar apenas “minerais e materiais reciclados e renováveis ​​em seus produtos e embalagens”. Até lá, está trabalhando com a ITSCI (Associação internacional de estanho) e o RCS Global Group, um auditor especialista em compras responsáveis.

Da mesma forma, na indústria joalheira, que também precisa lidar com fornecedores em zonas de conflito, algumas empresas estão trabalhando para melhorar a confiabilidade de seus processos de rastreamento. A questão dos “diamantes de sangue” – aqueles que foram extraídos em uma zona de conflito e vendidos para financiar as atividades de guerra – tornou-se grave.

Para resolver isso, em 2021 a Pandora, a maior joalheria do mundo, não apenas divulgou sua primeira coleção de diamantes artificiais, cultivados em laboratório, mas também anunciou que não usaria mais diamantes oriundos da extração. Para isso, ela está começando a redesenhar sua cadeia de suprimentos.

Sustentabilidade não é mais apenas fazer a coisa certa. Cada vez mais, trata-se de fazer negócios considerando a ética. Se as empresas ignorarem o princípio de 'Tornar-se verdadeiramente sustentáveis ​​aliando-se a seus fornecedores para atender aos padrões ambientais, sociais e de governança', e se elas não tomarem as medidas necessárias, seus clientes — e os cidadãos dos países onde fazem negócios — estarão atentos.

O cancelamento público poderia significar o fim, ou o começo do fim, de seus negócios. Afinal, uma empresa que não é sustentável é, por definição, insustentável. É por isso que é do interesse comercial das empresas e de seus fornecedores que eles possam ajudar uns aos outros a cumprir todos os padrões ambientais, sociais e de governança.

Trecho adaptado do livro "Profit from the Source", de Christian Schuh, Wolfgang Schnellbächer, Alenka Triplat e Daniel Weise.


SOBRE O AUTOR

Daniel Weise é líder global de procurement do Boston Consulting Group e CEO da Inverto, subsidiária do BCG especializada consultoria d... saiba mais