Danai Gurira: “Mulheres negras precisam ser rebeldes para se tornarem líderes”

Atriz, roteirista e embaixadora da ONU Mulheres lança campanha para a Unstereotype Alliance e fala sobre liderança e representação na mídia

Crédito: Fast Company Brasil

Camila de Lira 3 minutos de leitura

Seja como a líder das guerreiras fictícias de Wakanda, seja como embaixadora da Organização das Nações Unidas (ONU), Danai Gurira crava uma luta contra os estereótipos. A atriz, roteirista e ativista participou do 70º Festival Cannes Lions para lançar a primeira campanha oficial da Unstereotype Alliance, uma coalizão de empresas de publicidade e marcas focadas em promover a equidade racial e de gênero na mídia. 

Danai encontrou um lugar na disputada agenda para uma entrevista exclusiva para a Fast Company Brasil. Com foco em dar ferramentas para que as pessoas lidem com os estereótipos negativos, a campanha “Say Nothing, Change Nothing” chama as marcas para participarem da mudança na propagação de conceitos pré-concebidos de grupos de pessoas.

“Como mulher negra, entrei em muitos espaços que as pessoas não esperavam que eu estivesse, causando reações diferentes. Por que, em 2023, as pessoas ainda se surpreendem com uma mulher negra na mesa de decisões?”

De acordo com pesquisa conduzida pela Unstereotype Alliance no Brasil, África do Sul, Turquia, Estados Unidos e Reino Unido, três em cada quatro pessoas dizem ver regularmente o uso de estereótipos negativos na mídia e na vida real. Mais da metade afirma ficar em silêncio, por não saber como responder a tais situações. A campanha cria um guia de como confrontar as imagens pré-concebidas.

Além disso, a Aliança chama as marcas para participar da quebra de estereótipos. “A publicidade tem muito poder para afetar e para mudar a cultura, os comportamentos e as normas”, diz Danai. Para ela, as discussões sobre diversidade não poderão avançar enquanto o tema dos estereótipos não for levado a sério por aqueles que produzem e consomem mídia.

Os estereótipos negativos formam a base do preconceito, que aparece nos detalhes. “Quando uma marca só utiliza fotos com mãos de pessoas brancas tocando o seu produto, ela passa uma mensagem. Pode não ser um estereótipo negativo, mas está mandando uma mensagem específica sobre para quem aquele produto foi pensado. Além de mostrar a experiência de apenas um grupo de pessoas.” 

SÓ AS PERGUNTAS SALVAM

A forma de combater o preconceito, para Danai, é praticar a “curiosidade empática”. Ou seja, fazer perguntas: por que estranhei a imagem ali? Por que eu tinha a expectativa de ver isso? São questões que se escalonam, criando a conexão.

Por que, em 2023, as pessoas ainda se surpreendem com uma mulher negra na mesa de decisões?

Como exemplo, a atriz usa uma experiência própria. Recentemente, foi a um safári no Quênia e se surpreendeu ao encontrar duas garotas como guias do seu grupo. A atriz passaou por um questionamento interno, o mesmo que estimula outros a fazerem.

“Percebi que tinha um retrato de como um guia de safári deveria ser e parecer, e ele não era composto por duas meninas. Quando me questionei, vi que não tinha lógica alguma a imagem que criei. E que bom que essa imagem não tinha lógica”, conta.

Quebrar os clichês, questionar as escolhas e optar por uma forma que seja mais inclusiva não é o mesmo que autocensura ou que a cultura do “cancelamento”. “É uma nova realidade. E eu amo viver nesse novo mundo”, afirma a atriz.

ALIANÇA REBELDE

Os estereótipos negativos na mídia são um assunto que vai para além da representatividade. Trata de como certos grupos aparecem e são retratados. Segundo a pesquisa da Aliança, no Brasil, as pessoas têm mais contato com as imagens pré-concebidas ruins ligadas a gênero e a raça.

Crédito: Marvel Studios

Esse conjunto de ideias cria ambientes hostis para mulheres negras, que precisam lidar com preconceitos velados (e nada velados) diariamente. A atriz que dá cara e voz para a líder da guarda do rei de Wakanda nos filmes da Marvel, entende que as mulheres precisam de um quê de Okoye para crescerem no ambiente profissional.

Além de coragem, força e foco, as mulheres negras precisam de uma boa dose de ousadia para se impor num mundo que não as encoraja a estar no poder. ”A mulher negra precisa ser rebelde para se tornar líder. Tem que desafiar uma parte do mundo que acha que sabe com certeza onde ela pode estar, o que ela deve fazer e em quais rótulos ela tem que se encaixar”, diz. 

A jornada está longe de ser fácil. “O mundo terá um novo despertar”.

Confira cobertura Cannes Lions 2023!


SOBRE A AUTORA

Camila de Lira é jornalista formada pela ECA-USP, early adopter de tecnologias (e curiosa nata) e especializada em storytelling para n... saiba mais