Do “favelês” ao “favela washing”: o que a indústria criativa tem a aprender

Em painel no Cannes Lions, Celso Athayde e Sergio Gordilho destacam importância de falar da favela pelo viés da potência

Crédito: Fast Company Brasil

Babi Bono 2 minutos de leitura

O Brasil chega para abrir as comemorações dos 70 anos do Festival Cannes Lion e a pauta não poderia ser mais autêntica: se quiser ser criativo e olhar para a inovação, aprenda a linguagem das favelas. Elas são, segundo o Data Favela, o terceiro maior estado brasileiro em população (18 milhões de pessoas), em consumo e em produção.

Celso Athayde, fundador da CUFA (Central Única das Favelas) e empreendedor social do ano pelo Fórum Econômico Mundial, abre a conversa endereçando a oportunidade que a indústria criativa ganha ao enxergar a potência das favelas.

A favela não quer ser catequizada pelas marcas. Quer fazer a gestão daquilo que consome.

Segundo o vice-presidente da agência Africa, Sergio Gordilho, também presente no painel, na era da escassez de atenção e da guerra de narrativas, nunca foi tão importante contar mais do que boas histórias. Elas precisam ser também verdadeiras e autênticas.

“São elas o gatilho das grandes revoluções. No mercado saturado em que estamos, as marcas precisam expandir seu aprendizado de linguagem para outras comunidades”, acrescentou  Ele fez um convite para que as marcas assumam a corresponsabilidade criativa com diferentes comunidades.

LETRAMENTO SOCIAL E ECONÔMICO

Apesar de a favela ter entrado na pauta, é importante que o tema seja tratado com responsabilidade. As marcas precisam aprender os códigos, incluir pessoas e reaprender a se comunicar. Fica bonito no videocase, mas não vale se não existe na prática.

Esse movimento só acontece com o letramento social e econômico da indústria criativa em relação às periferias brasileiras. 

Para criar uma boa história, com impacto e que gere negócios para as marcas, o pensamento deve ser o de trabalhar com e não para as favelas. É abraçar toda a cadeia, desde os profissionais envolvidos na criação, produção, personagens e influenciadores. O tal do “favelês” tem que ser idioma base para que a inovação na linguagem e na semiótica aconteça.

O erro de muitas empresas é pensar na favela como filantropia. A favela não quer filantropia, quer fazer negócio.

A favela tem dado o tom da narrativa contemporânea brasileira e exportado para o mundo música, cultura, moda, arte e comportamento. Segundo o fundador da CUFA, a favela quer mostrar a melhor versão de si mesma, sem filtros. Isso gera vantagem competitiva para as marcas que entendem que a conversa não se pauta no consumo, mas na gestão.

“A favela não quer ser catequizada pelas marcas. Quer fazer a gestão daquilo que consome”, diz Celso Athayde.  “O erro de muitas empresas é pensar na favela como filantropia. A favela não quer filantropia, quer fazer negócio.”

O painel endereçou, em 30 minutos, para uma plateia amplamente brasileira e composta também por criativos de vários cantos do mundo, a importância de olhar a favela pelo viés da potência.

Se elas consomem e fazem girar US$ 42 bilhões por ano, “ou a gente divide com as favelas toda riqueza que essas pessoas produzem ou vamos continuar sentindo as consequências da miséria que a elite brasileira produz e tem perpetuado todos esses anos”, conclui Celso Athayde.

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SOBRE A AUTORA

Babi Bono é cria do Morro do São João (RJ), jornalista, publicitária e estrategista criativa. É fundadora da Lemme Content e Líder de ... saiba mais