Relatórios de tendência repetem palavras-chave (e não preveem o futuro)

"Estamos investindo em memes, não em mudanças reais", afirma head de previsões do Reddit, Matt Klein

Crédito: Fast Company Brasil

Camila de Lira 2 minutos de leitura

Nostalgia, “phygital“, minimalismo, autocuidado, economia pet, foco no consumidor, marcas de beleza de criadores: essas são algumas tendências de 2018. E de 2024.

Os termos se repetem em relatórios de projeções, documentos considerados os “guias do futuro” do mercado. O que isso diz sobre os próximos anos? Segundo o sociólogo digital e líder de previsões do Reddit, Matt Klein, nada.

“Você está melhor jogando uma moeda do que tentando adivinhar se uma tendência é de 2018 ou 2024”, disse Klein, durante apresentação no Innovation Festival 2024, organizado pela Fast Company, em Nova York.

Desde 2018, Klein conduz a pesquisa “Meta Trend Report”, uma análise comparativa dos mais de 60 relatórios de “foresight”  mais usados pelo mercado. A cada ano, o escritor e pesquisador vê listas de palavras-chave se repetindo. O problema é que os dados são apresentados como inéditos.

Segundo Klein, eles não apresentam o futuro, mas uma reflexão estendida do presente. Muitos dos termos repetidos, atesta o executivo, vêm de tendências digitais que viralizaram em algum momento, mas que não significam mudanças na sociedade.

“Estamos confundindo o que está viralizando agora com o que realmente importa. Estamos investindo em memes, não em mudanças reais”, disse Klein.

COBRA ATRÁS DO RABO

Há demanda por entender o futuro, principalmente depois de momentos tão incertos quanto o que o mundo passou desde 2020, ano da pandemia. Houve um aumento significativo na quantidade de relatórios de previsão nos últimos anos. A receita global da indústria de pesquisa de mercado faturou US$ 84 bilhões em 2023, valor 50% maior do que o de 2018.

Estamos confundindo o que está viralizando agora com o que realmente importa.

Foram duas vezes mais documentos publicados.  Menos da metade deles são transparentes com relação aos métodos de pesquisa. “Em alguns casos, eles estão inventando tendências”, Klein. Ele lembra de palavras como cottage-core e barbie-core que não ressoam com o público.

O que torna ainda mais complexo entender a indústria de previsões é que o próprio ato de falar sobre a cultura impacta o mundo que se cria depois. São as tais previsões “autorrealizáveis”. Klein aponta que parte dos relatórios citam uns aos outros. “Até eu, que sou crítico dessa indústria, passei a ser citado em relatórios”, diz.

PREVISÃO ATIVISTA

Para sair deste loop, Klein defende a “previsão como ativismo” – com foco na compreensão e apoio aos objetivos e desejos de comunidades específicas, em vez de perseguir as últimas tendências virais.

Em vez de focar em tendências de curto prazo, a estratégia sugere que marcas e organizações ouçam ativamente suas comunidades, construindo futuros com base nas necessidades e aspirações genuínas de seus consumidores. Esse movimento promete reconectar as empresas com o que realmente importa: as pessoas e suas histórias.

Para ele, os executivos precisam olhar para o futuro muito mais como um espaço que precisa ser criado do que como um lugar a ser explorado.


SOBRE A AUTORA

Camila de Lira é jornalista formada pela ECA-USP, early adopter de tecnologias (e curiosa nata) e especializada em storytelling para n... saiba mais