A tecnologia ancestral no SXSW 2023

Crédito: Kirkchai benjarusameeros, Anna Frank / iStock

Roberta Camargo 2 minutos de leitura

Entre temas sobre os avanços da tecnologia e um olhar atento, porém seletivo, para o futuro ao redor do globo, o festival South by Southwest 2023 me trouxe muitos aprendizados. Acompanhando as palestras virtualmente, todas as falas pareciam ressoar de uma forma ainda mais impactante. Dadas as impressões iniciais, eu fiz o que me pareceu natural num primeiro momento: vi toda a programação e marquei os temas interessantes, de olho sempre nas conversas, apresentações e mentorias apresentadas por outras pessoas negras. Identificação. Essa foi uma das palavras que mais amparou as minhas escolhas neste primeiro momento. 

No mesmo contexto em que a edição de 2023 do SXSW acontece, a semana começou com o criador de conteúdo do Complexo da Maré (RJ), Raphael Vicente, tendo sua história contada no jornal britânico The Guardian. Chamado de “Alegria da favela”, Raphael é um dos mais de 16% de criadores de conteúdo que se autodeclaram pretos aqui no Brasil. Os dados são da pesquisa Creators & Negócios 2022, realizada pelo YOUPIX. 

O número de brasileiros que participaram da conferência, que fala muito sobre a tal da creator economy, mas também sobre outros temas importantes na atualidade foi superior a 1.600 pessoas, entre palestrantes, mediadores e o público geral. Onde estavam os criadores de conteúdo pretos e de quebrada nesta conta? Não os que prosperaram e hoje ocupam outro espaço social e econômico, mas os que ainda vivem a realidade das favelas do país e produzem conteúdo apesar ou por causa disso. Me veio à cabeça a ideia de pertencimento

“Estamos vendo as primeiras gerações que têm consciência do lugar de onde vem”, ouvi durante uma conversa com Martin Luther King III e Arndrea Waters King. “Mulheres negras são inovadoras, mas não tem suas ideias financiadas”, disse a autora Kathryn Finney, enquanto contava para Tessa Flippin que sua avó, vendo o investimento financeiro que ela fez no empreendimento de outras mulheres, disse que via na neta a realização de um de seus sonhos mais ousados.

Identificação. Pertencimento. Prosperidade. Consciência. Realização.

É muito interessante observar que, para apresentar novas tecnologias, que nos fazem ter ânsia do futuro, as falas e os movimentos feitos por pessoas negras no festival remetem a outro tipo de tecnologia: a ancestral. Com o olhar de quem sente as mesmas dores e prioriza o sentimento do outro para sobreviver. Com a consciência de quais são nossas raízes e que os ensinamentos que nos fizeram chegar até aqui vieram delas. Organizando e fortalecendo os planos de forma coletiva, tornando a prosperidade uma possível realidade plural. 

A SXSW é uma convenção de inovação. As tecnologias vêm de muito antes, como ferramenta de sobrevivência e desenvolvimento. Precisamos estar presentes para praticar os ensinamentos que são intrínsecos em cada um, de mente e peito aberto para as novas descobertas. 


SOBRE A AUTORA

Roberta Camargo nasceu e cresceu na Brasilândia, periferia da Zona Norte de São Paulo. É jornalista e criadora de conteúdo do Simplão,... saiba mais