“Manter a floresta em pé é manter a vida”, diz Txai Suruí

Ativista levou para o festival South by Southwest a luta pela preservação ambiental e a defesa dos povos indígenas

Crédito: Fast Company Brasil

Mariana Castro 4 minutos de leitura

"Se a gente pensar que o mundo vai acabar, não fazemos nada. Mas já tem muita gente fazendo a revolução dentro de suas comunidades. Nós mulheres indígenas já nascemos na luta", disse a ativista Txai Suruí em entrevista à Fast Company Brasil. "Nossa luta é coletiva. Manter a floresta em pé é manter a vida".

Ela foi uma das palestrantes na mais recente edição do festival South by Southwest, em Austin, no painel Bioeconomy: Thriving in the Amazon Rainforest, com patrocínio da Natura. Ao seu lado, estavam a diretora de sustentabilidade Angela Pinhati e a premiada advogada norte-americana e especialista em justiça climática Colette Pichon Battle.

Durante a entrevista, Txai falou sobre sonho, ativismo, uso da tecnologia e da inovação na defesa dos povos e dos territórios indígenas, de bioeconomia, de desenvolvimento sustentável, de etnoturismo, reconexão com a natureza e sobre o futuro. 

TECNOLOGIA ANCESTRAL

"O futuro que o não indígena está imaginando é um futuro do fim do mundo. A narrativa é de um futuro que não existe. Nós estamos aqui para dizer que sim, existem outros caminhos. Um novo mundo, um mundo diferente é possível. E só é possível através de uma educação que reconecta as crianças com a natureza".

Para a construção de outros caminhos, Txai também aposta na junção da tecnologia ancestral e da nova tecnologia. "Se a gente usar a nossa tecnologia ancestral com essa (nova) tecnologia criada, podemos transformar o mundo."

Atualmente, Txai trabalha com 25 povos indígenas em Rondônia, no sul do Amazonas e no noroeste do Mato Grosso. Um deles, Uru-eu-wau-wau, tem mais de dois milhões de hectares protegidos de invasões.

Txai Suruí discursa na COP 26 (Crédito: WWF)

Quem ajuda no monitoramento é um aplicativo desenvolvido pela comunidade, o USMDK, que traz alertas de desmatamento, mineração e queimadas. Além do app, eles usam GPS e drones para chegar ao território com mais segurança. 

"É perigoso ir até o local, então monitoramos antes. Depois o app cria relatórios que mandamos para os órgãos responsáveis como a Funai e o Ministério Público, para que possam fazer seu trabalho."

Seu pai, o cacique Almir Suruí, fechou uma parceria com o Google Earth em 2012,  para a criação de um mapa multimídia. A comunidade usa drones, celulares e aplicativos para monitorar e denunciar invasões de terras e extração ilegal de madeira.

Junto com a família, Txai já recebeu ameaças pelas denúncias. Mas ela diz que desistir da causa não é uma opção. "Nós indígenas e, principalmente, nós mulheres indígenas, a gente já nasce na luta".

Txai (à dir) no SXSW 2024 (Crédito: SXSW)

Txai faz parte da comunidade indígena Paiter Suruí e fundou o Movimento Jovem Indígena de Rondônia. Também coordena a Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé, organização comunitária fundada em 1992. É conselheira jovem do Pacto Global da ONU no Brasil e conselheira da WWF-Brasil.

Também é produtora executiva de “O Território”, documentário que mostra a luta de sua mãe, a respeitada indigenista Ivaneide Bandeira Neidinha Suruí, e do povo Uru-eu-wau-wau contra o desmatamento e a atuação de posseiros ilegais na Amazônia.

Para Txai, ainda falta representatividade de indígenas em festivais como o South by Southwest. "Precisamos cada vez mais ocupar espaços como esse. Precisamos reconectar as pessoas com a natureza. Cresci aprendendo que eu sou um ser da natureza. As mudanças climáticas estão nos afetando. Precisamos agir."

DEFESA DOS POVOS INDÍGENAS

Em 2021, Walelasoetxeige Paiter B. Suruí ficou conhecida globalmente por seu discurso de abertura na COP 26, em Glasgow, na Escócia. Começava assim:

"Meu nome é Txai Suruí, tenho só 24, mas meu povo vive há pelo menos seis mil anos na floresta amazônica. Meu pai, o grande cacique Almir Suruí, me ensinou que devemos ouvir as estrelas, a Lua, o vento, os animais e as árvores. Hoje o clima está esquentando, os animais estão desaparecendo, os rios estão morrendo, nossas plantações não florescem como antes. A Terra está falando. Ela nos diz que não temos mais tempo".

"Estamos aqui para dizer que existem outros caminhos. Um novo mundo, um mundo diferente, é possível."

De lá para cá, a ativista segue na luta contra a destruição ambiental e em defesa dos povos indígenas, levando seu discurso a vários lugares do mundo. Ela cobra ações efetivas diante da urgência em relação aos mais afetados pelas mudanças climáticas. Sobre o que espera do futuro, Txai diz que espera que "a gente possa continuar sonhando".

"Se a gente continuar a explorar a natureza e as pessoas, estamos matando os sonhos. Para nós, povos indígenas, os sonhos são muito importantes. Eles trazem mensagens,  avisos e podem nos levar a lugares em que a gente nunca esteve. O não indígena desaprendeu a sonhar."

TEMA DE DOCUMENTÁRIO

Txai será tema de um documentário produzido por João Moreira Salles, jornalista, fundador da revista "piauí" e um dos homens mais ricos do país. Salles também assina a autoria de documentários como "Entreatos" e "Santiago".

A ativista conta que está deixando "João doido". "Falei que tinha que mudar o jeito de contar a história. Precisava inverter tudo". E quando sai o filme? "Ah, ainda não sei. Já avisei que tenho o meu tempo", diverte-se a ativista.

Veja a entrevista:


SOBRE A AUTORA

Mariana Castro é editora executiva da Fast Company Brasil. saiba mais