Interagir em ambientes 3D usando só as mãos: será esse o futuro dos games?

A Apple pode ter descoberto como levar a realidade virtual e a computação espacial para o grande público

Crédito: Apple

Janko Roettgers 4 minutos de leitura

O Vision Pro, da Apple, será lançado apenas em 2024, mas um de seus principais recursos já está dividindo opiniões: o headset não virá com controles, pois terá um sistema de rastreamento ocular e permitirá navegar por ambientes 3D usando só as mãos.

Esta é uma grande diferença em relação à forma como outros headsets do mercado funcionam. Dispositivos como o Quest 2, da Meta, e o PlayStation VR, da Sony, usam controles manuais personalizados para jogos e navegação.

A Apple, no entanto, não pretende que o Vision Pro seja um concorrente direto desses aparelhos, mas sim o pioneiro de uma série de novos dispositivos de computação espacial que a empresa espera que possam, um dia, ser tão bem-sucedidos quanto o iPhone.

Crédito: Apple

Andrew Eiche, por exemplo, é um dos muitos que não vê a hora de aposentar os controles. Ele é o CEO da Owlchemy Labs, estúdio de realidade virtual que pertence ao Google, famoso por jogos como Job Simulator e Vacation Simulator.

A empresa tem realizado experimentos com rastreamento manual como alternativa aos controles, e Eiche acredita que esta abordagem é o único caminho para levar a realidade virtual e a computação espacial para o grande público. “Para ser bem direto, esse é o futuro dessa mídia”, diz ele.

No entanto, transformar isso em realidade pode levar algum tempo: a Apple espera produzir menos de 400 mil unidades do Vision Pro no ano que vem. Além disso, muitos desenvolvedores de jogos de RV estão preocupados em não conseguir adaptar seus títulos para o Vision Pro, o que poderia reduzir ainda mais o interesse pelo dispositivo, que custará US$ 3,5 mil. Alguns questionam até se um headset sem controles seria sequer viável para jogos.

Quest 2 (Crédito: Meta)

Mas Eiche acredita que a maioria dos fabricantes, em algum momento, seguirá os passos da Apple e lançará seus próprios dispositivos sem controles. Ele compara isso à evolução dos primeiros smartphones, como o BlackBerry, com seus teclados físicos, para o iPhone, com tela sensível ao toque.

“Os controles são um grande obstáculo, se o objetivo é levar a realidade virtual para o público em geral”, argumenta. “No momento em que você os elimina, remove uma barreira.”

Alguns desenvolvedores questionam se um headset sem controles seria viável para games.

Isso é especialmente verdade quando se trata de um público que não está familiarizado com a maneira como os controles de RV funcionam. “Dar um par de controles na mão da maioria das pessoas, vendá-las e dizer para pressionarem X não dá certo”, afirma Eiche.

No entanto, há um contra-argumento: mesmo para além da realidade virtual, os controles são extremamente familiares para dezenas de milhões de jogadores de console e PC. “Há um certo conforto em estar familiarizado com o controle”, escreveu Denny Unger, CEO da Cloudhead Games, em junho. “Independentemente dos gêneros que continuarão populares nessa indústria de US$ 450 bilhões, é difícil acreditar que todos estaremos fazendo 'arminha' com a mão para jogar um game de tiro.”

Mas a verdade é que Eiche quer deixar esse tipo de jogo para trás. “Estou ansioso para ver surgir um mercado onde a interação principal não seja atirar”, diz ele.

Vacarion Simulator (Crédito: Owlchemy Labs)

Desde 2016, a Owlchemy Labs tem criado jogos de realidade virtual que estão longe dos típicos jogos de tiro. O primeiro título do estúdio, Job Simulator, coloca os jogadores em um mundo futurista no qual todo o trabalho foi automatizado e os seres humanos podem reviver a alegria de ter funções mais simples em um museu administrado por robôs.

O estúdio revelou no ano passado que está trabalhando em um novo jogo que depende exclusivamente do rastreamento de mãos. Chegou até a mostrar parte do progresso feito com essa tecnologia em uma breve demonstração na Game Developer Conference, em São Francisco, este ano.

Na prévia, os jogadores estão em uma cafeteria futurista semelhante ao Job Simulator, onde precisam servir bebidas aos clientes robôs. Eles podem manipular uma variedade de botões na máquina de café expresso e até jogar uma moeda para o alto com os dedos. “Isso não é algo que um controle possa replicar”, ressalta Eiche.

Job Simulator (Crédito: Owlchemy Labs)

A ideia, no entanto, não é descartar os controles totalmente. Ele acredita que poderiam se tornar um acessório opcional de terceiros para futuros headsets. Se isso incluirá produtos da Apple, só o tempo dirá: a empresa anunciou que será possível usar controles para jogos tradicionais, mas aparentemente não tem a intenção de oferecer suporte para jogos de RV ao seu dispositivo.

Eiche ainda não testou o Vision Pro, mas está ansioso para experimentar sua tecnologia de rastreamento manual para realidade mista, que combina o mundo real com objetos virtuais.

Um dos maiores desafios técnicos será algo conhecido nos círculos da indústria como oclusão. Quando um usuário segura uma lata virtual de Coca-Cola com sua mão de verdade, o headset saberá esconder as partes cobertas pelos dedos? Eiche diz que está curioso para ver “se a Apple conseguirá fazer isso”.


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