Novo jogo chinês provoca críticas sobre a cultura machista no universo gamer

Desigualdade de gênero é um problema no mundo todo em um setor amplamente dominado por homens

Crédito: Game Science

Elsie Chen 3 minutos de leitura

Um novo e aclamado videogame chinês, celebrado como um marco para a indústria de jogos do país, sem querer trouxe à tona alegações de sexismo desenfreado na cultura de jogos dominada por homens na China.

Enquanto alguns jogadores comemoram o sucesso estrondoso do título de ação e aventura "Black Myth: Wukong", outros se queixam do sexismo nos jogos chineses e fazem acusações contra a desenvolvedora, a Game Science, alegando que a empresa postou mensagens ofensivas online.

Críticos publicaram capturas de tela das mensagens na plataforma de mídia social chinesa Weibo – uma compilação delas teve mais de 400 mil curtidas. Um dos posts que os críticos dizem ter vindo do fundador, Feng Ji, usa descrições de sexo oral como uma metáfora para as respostas positivas sobre o vídeo promocional do jogo. Outros exemplos incluem cartazes de recrutamento obscenos.

A AP não conseguiu verificar de forma independente as capturas de tela, embora jogadores entrevistados tenham relatado ter visto as postagens. A Game Science não respondeu a um pedido de comentário e não se pronunciou publicamente sobre a controvérsia.

As críticas refletem uma raiva latente entre as mulheres chinesas da indústria de games, que dizem ser alvo de comentários e comportamentos misóginos há muito tempo.

A desigualdade de gênero é um problema global na indústria de games, dominada por homens. Apesar de constituírem quase metade dos jogadores em todo o mundo, as mulheres representavam apenas cerca de 22% dos trabalhadores do setor em 2020, de acordo com a Women in Games, organização com sede no Reino Unido.

Skylar Hu, a única mulher em sua equipe de engenharia de jogos (composta por mais de 20 pessoas), diz que seus colegas homens frequentemente postavam piadas sexuais nos grupos de chat do trabalho. Quando pedia que parassem, suas mensagens eram ignoradas.

Para Jessica Hua, ex-gerente de operações de videogames, a controvérsia em torno do jogo a lembrou do ambiente tóxico que experimentou na indústria de games. “Muitas pessoas acham que é apenas brincadeira. Mas eu não posso aceitar esses comentários misóginos,” diz Hua. “Levo isso muito a sério.”

A China impôs limites ao tempo que as crianças podem jogar videogames e tentou conter os gastos excessivos com jogos online.

"Black Myth: Wukong" é o primeiro jogo AAA da China – uma designação para produções de grande orçamento, semelhante a filmes de primeira linha. O título fez história quando mais de 2,4 milhões de pessoas jogaram simultaneamente online, quebrando o recorde de game para um único jogador mais jogado na plataforma de jogos online Steam. Três dias após o lançamento, mais de 10 milhões de cópias já haviam sido vendidas.

Muitos na indústria de games da China consideram o jogo um ponto de orgulho nacional, promovendo a cultura chinesa e desafiando a dominância ocidental no setor.

"Não há dúvida de que este é um marco na indústria de jogos chinesa," diz Feng Xu, secretário da Associação de Indústria de Jogos Cibernéticos de Chengdu. "Ele está exportando cultura chinesa autêntica ao apresentar o Rei Macaco ao mundo."

Crédito: Game Science

A China, que impôs limites ao tempo que as crianças podem jogar videogames e tentou conter os gastos excessivos em jogos online, demonstrou total apoio ao "Black Myth". O governo da província de Shanxi, no noroeste da China, colaborou com a desenvolvedora para promover o turismo local. A mídia estatal também publicou uma série de artigos elogiando o jogo.

Feng Xu diz que não acredita que as acusações contra a Game Science terão grande impacto no sucesso do game. "Politicamente correto não tem nada a ver com o jogo. Nós, gamers, apenas jogamos e só nos importamos se o jogo é bom e divertido."

Outros dizem que era apenas uma questão de tempo antes que a questão do machismo na cultura gamer chinesa ganhasse mais atenção.

“A maioria dos criadores são homens. Você pode ver em muitos jogos que as mulheres, em geral, são sensuais e objetificadas,” diz Ashley Li, crítica cultural e entusiasta de games. “Mas acredito que isso vai mudar aos poucos. Precisamos dar tempo.”


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