Navegador com IA reacende debate sobre controle do acesso à informação

Com bots assumindo tarefas online, veículos de mídia correm para entender como continuar sendo vistos – e pagos

telas de navegador web com inteligência artificial
Créditos: Artem R/ Unsplash,/Oleksii Arseniuk Getty Images/ OpenAI

Pete Pachal 4 minutos de leitura

Por 30 anos, o navegador web foi a principal forma de navegação humana na internet. Faz sentido, então, que, à medida que a inteligência artificial se torna mais humana em suas capacidades, ela passe a usar a mesma ferramenta.

Essa é basicamente a ideia por trás dos navegadores com IA, que vivem um momento de destaque desde que a OpenAI lançou o Atlas, seu próprio navegador com o ChatGPT integrado como assistente.

O Atlas chega após o Comet, da Perplexity, lançado em julho e que rapidamente capturou a imaginação do que um navegador com IA poderia fazer.

Em ambos os casos, o usuário pode, a qualquer momento, acionar um assistente (ou agente de IA) capaz de executar tarefas de múltiplas etapas a partir de um comando simples, como entrar em um e-commerce de alimentos e encher um carrinho online com ingredientes de uma receita.

Tenho usado o Comet há alguns meses e, embora ache promissora a ideia de um agente realizar todas as tarefas tediosas da internet por mim, percebi que o conjunto de ações possíveis ainda é bastante limitado.

Em geral, a tarefa precisa ser algo que não exija muito contexto especializado (já que a IA não lê pensamentos) nem comandos complexos (já que gastar tempo elaborando um prompt pode demorar tanto quanto fazer a tarefa).

tudo indica que a atuação de agentes de IA na web crescerá bastante, conforme questões de segurança forem superadas.

Ainda assim, a OpenAI imagina um futuro em que a maior parte da atividade online seja realizada por agentes em navegadores como o Atlas. No anúncio, disse: “este lançamento marca um passo rumo a um futuro em que a maior parte do uso da web acontece por meio de sistemas agênticos, onde você pode delegar o trivial e focar no que realmente importa”.

A empresa pode estar certa. Esses casos de uso ainda limitador podem se expandir com uma integração mais elegante entre contexto pessoal e navegação. Se o agente entender o motivo de cada ação – o “porquê” – e se tornar melhor em navegar (como inevitavelmente vai acontecer), a navegação por IA pode atingir o mainstream.

IMPACTOS NA MÍDIA

Se isso acontecer, as implicações serão enormes. Porque não só as pessoas passarão a consumir informações por meio do filtro de seus agentes de IA, como as tarefas realizadas por eles vão depender de conteúdo acessado pela mesma lógica.

Por exemplo, um agente encarregado de encontrar um “terno estiloso” vai ter que pesquisar o que está em alta e usar essas informações para concluir a tarefa. Nenhum olho humano verá esse conteúdo, mas obtê-lo corretamente será crucial para o bom funcionamento do agente.

Como esses agentes acessam a informação e o que fazem com ela são questões essenciais para definir as regras desse novo modelo.

navegador Atlas, da OpenAI, equipado com inteligência artificial
Créditos: ChatGPT/ Freepik

O uso de dados por sistemas de IA é alvo de disputas acaloradas, mas há algum consenso surgindo. A OpenAI deixou claro, no anúncio do Atlas, que o navegador não será uma “porta dos fundos” para treinar modelos com conteúdo bloqueado ao seu robô de coleta.

Mas o acesso do próprio agente é controverso. Empresas de IA defendem que agentes são representantes dos usuários e, portanto, deveriam acessar conteúdo e serviços da mesma forma que um humano acessaria.

Se o agente entender o motivo de cada ação e se aprimorar, a navegação por IA pode atingir o mainstream

Outros discordam: argumentam que, por serem robôs sem atenção humana a ser monetizada, não devem ser tratados como pessoas e que sites deveriam poder bloqueá-los. Esse é o cerne do embate entre Perplexity e Cloudflare.

Com o lançamento do Atlas, a navegação por IA vai acelerar, e essas respostas se tornam urgentes.

Estratégias de mídia dependem de entender quem é o público, como ele acessa o conteúdo e como monetizar esse comportamento. Hoje, nada disso está bem definido para um futuro em que os principais usuários da internet sejam agentes navegadores.

Não se trata apenas de bloquear essas ferramentas; isso é apenas o começo. Será preciso criar um sistema no qual um agente de IA consiga, de forma autônoma, pagar, registrar-se ou comprovar licença para acessar conteúdos.

Exemplo: se um assinante da Fast Company pede ao agente para realizar uma tarefa que exige informações da publicação, o acesso deve ser contínuo e mensurável para a mídia. Mas, se não houver assinatura, o agente será bloqueado, mesmo que o artigo não tenha paywall para humanos.

O poder disso está no agregado: acordos de licenciamento podem se estender aos agentes. No caso da OpenAI, que já licencia conteúdo de vários veículos, o acesso dos agentes poderia continuar sob os mesmos acordos.

Como a atividade do agente é mensurável, publicações poderiam alcançar esses usuários automatizados e convertê-los em audiência engajada – de forma anônima, por meio do provedor de IA.

QUANDO O PÚBLICO NÃO É HUMANO

Ainda é incerto se a maioria da navegação no futuro será feita por bots. Mas tudo indica que a atuação de agentes de IA na web crescerá bastante, conforme questões de segurança forem superadas.

Isso significa que os veículos de mídia vão precisar se adaptar a um mundo no qual bots representam uma grande parcela do público. Definir o que eles podem ver e quanto devem pagar será crucial.

No entanto, a questão central agora é descobrir se quem vai tomar essa decisão serão as pessoas que produzem o conteúdo ou as que produzem os agentes de IA.


SOBRE O AUTOR

Pete Pachal é jornalista e criador do podcast e da newsletter Media CoPilot, que trata de inteligência artificial e seus efeitos no jo... saiba mais