A batalha para taxar os super-ricos (que ficam cada vez mais ricos)

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Durante o conturbado mandato de Donald Trump, em meio à polarização e pedidos de impeachment, o Partido Republicano se vangloriava de uma conquista: a lei de reforma tributária de 2017. Horas após assinar o projeto de lei, Trump foi para em seu resort Mar-a-Lago em Palm Beach, na Flórida, onde se gabou para alguns de seus amigos, dizendo “Vocês todos acabaram de ficar mais ricos”.

Seu entusiasmo não foi exatamente uma surpresa, pois apenas confirmou o que já sabíamos: quem o ex-presidente considerava seus eleitores mais importantes. Foi também a materialização mais recente do desejo insaciável do Partido Republicano de cortar impostos para os super-ricos, um movimento que surgiu nas décadas de 1970 e 1980 criado pelo ativista anti-imposto Howard Jarvis e pelo então presidente Ronald Reagan.

Ao mesmo tempo, vemos um crescimento na desigualdade econômica em todo o país. Mas a clara injustiça do sistema tributário federal não passou despercebida pelos eleitores, que estão cada vez mais abertos à demanda por impostos nacionais e estaduais sobre grandes fortunas.

Uma pesquisa da Reuters/Ipsos realizada em 2020 revelou que 64% dos norte-americanos são a favor de algum tipo de imposto para os super-ricos, concordando que eles deveriam “contribuir com uma parcela extra de sua riqueza total” a cada ano. Esse apoio ultrapassa fronteiras partidárias, com 77% dos democratas apoiando a ideia e 53% dos republicanos.

O movimento também ganhou força com o influente best-seller de 2013, “Capital in the Twenty-First Century” (O Capital no Século XXI), escrito pelo economista francês Thomas Piketty, que argumenta que a sociedade se torna instável quando há desigualdades econômicas. Sua solução: impostos progressivos sobre grandes fortunas. “A riqueza é tão concentrada”, escreve ele, “que um enorme segmento da sociedade praticamente não sabe de sua existência”.

No início da nova administração Biden-Harris, a proposta de um imposto sobre a riqueza, criada pelos senadores progressistas Elizabeth Warren e Bernie Sanders, ganhou alcance e popularidade, embora Joe Biden nunca a tenha endossado explicitamente. Hoje, uma proposta do senador democrata Ron Wyden, chamada Billionaires Income Tax (Imposto de Renda de Bilionários), visa cerca de 700 contribuintes – os 0,0005% mais ricos do país.

“Em teoria, taxar grandes fortunas é uma boa ideia porque o imposto de renda faz um trabalho relativamente ruim ao tributar a renda do capital, especialmente no topo da pirâmide econômica”, diz Eric Zolt, professor de Direito e especialista em impostos da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA). “Mas, sem sombra de dúvidas, será um grande desafio implementá-lo.” Zolt observa que pode ser mais fácil criar um imposto como este em nível estadual, já que uma lei federal pode esbarrar em questões constitucionais.

Mesmo em estados com forte representação de democratas, o imposto sobre grandes fortunas não teve muito sucesso. Na Califórnia, por exemplo, propostas sérias não conseguiram atrair apoio suficiente para sequer obter um voto no Legislativo.

“Embora tenhamos um sistema tributário relativamente progressivo na Califórnia, muitas pessoas se beneficiam da possibilidade de acumular enormes fortunas todos os anos”, aponta Christoph Mair, defensor legislativo do sindicato americano de funcionários estaduais e municipais. “Aumentar estas alíquotas ajudará muito a financiar programas sociais que são realmente necessários e potencialmente beneficiarão a classe média em geral.”

Um grupo de ativistas bastante engajado é o Patriotic Millionaires (Patriotas Milionários), fundado em 2010. Com mais de 200 milionários (e bilionários) membros em 31 estados, seus esforços começaram com uma carta enviada ao então presidente Obama pedindo que revogasse a isenção fiscal para os mais ricos implementada por Bush.

“Muitas pessoas enxergam os ricos do setor imobiliário como as pessoas mais importantes do universo e, por isso, não devem pagar impostos, apenas os trabalhadores deveriam ser tributados”, diz Morris Pearl, presidente do Patriotic Millionaires e autor do “Tax the Rich! How Lies, Loopholes, and Lobbyists Make the Rich Even Richer” (Taxar Ricos! Como Mentiras, Brechas e Lobistas Tornam os Ricos Ainda Mais Ricos).

O grupo está altamente focado em três objetivos: conseguir que ricos paguem mais impostos do que trabalhadores, aumentar o salário mínimo e diminuir a influência do dinheiro na política. Com Biden agora na Casa Branca, a ideia de um imposto progressivo sobre grandes fortunas tornou-se ao menos parte da discussão.

Para muitos de seus defensores, a motivação não vem apenas das necessidades orçamentárias de um determinado ano, trata-se de justiça. O investidor bilionário Warren Buffett notou há uma década que paga menos impostos do que sua secretária e passou a defender um piso fiscal para ricos.

Apesar de ter havido nenhuma mudança real desde essa surpreendente admissão de injustiça, ativistas e legisladores continuarão tentando implementar o imposto sobre grandes fortunas. Cada vez mais contribuintes estão compreendendo a urgência do tema, sobretudo agora que os super-ricos estão fazendo viagens espaciais.


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