Bali está se afogando em lixo, mas dois hotéis acharam uma solução

Na falta de um sistema de gestão de resíduos, projeto comunitário tenta resolver problema com centros de reciclagem

Crédito: Johannes P. Christo/ Agência Anadolu

Elissaveta M. Brandon 4 minutos de leitura

Bali parece duas ilhas: de um lado, um lugar radiante, onde o verde dos campos encontra praias cristalinas. Do outro, um lugar com trânsito intenso, lotado de turistas e afundado em lixo. Em meio a essa disputa entre o paraíso e o plástico, uma nova iniciativa busca trazer de volta a limpeza que Bali merece.

Um centro comunitário de tratamento de resíduos acaba de ser inaugurado próximo ao maior aterro sanitário da ilha. Com dois mil metros quadrados e capacidade para processar até 10 toneladas de resíduos por dia, o centro fica em uma região famosa pela constante presença de turistas – e, consequentemente, pelo alto nível de poluição.

Conhecido como Projeto Comunitário de Resíduos, ele funciona como uma organização sem fins lucrativos, reinvestindo todo o lucro na própria comunidade. Por uma taxa mensal, empresas locais podem desviar a maior parte de seus resíduos dos aterros sanitários, enviando-os para o centro, onde são devidamente processados. Dessa forma, as empresas conseguem reduzir sua pegada de carbono e – com sorte – ajudar a evitar que Bali continue se afogando em lixo.

Até o momento, sete empresas da região de Seminyak já aderiram, incluindo hotéis e clubes que, embora sejam concorrentes, compartilham o mesmo objetivo. “Lixo zero é uma jornada, não uma competição”, afirma Amanda Marcella, diretora de sustentabilidade do eco resort Potato Head, que lidera o projeto.

Se o modelo for bem-sucedido, poderá ser replicado em toda a ilha. “Não conseguimos resolver os problemas de reciclagem sozinhos. Acreditamos que, juntos, podemos transformar Bali em uma ilha livre de lixo.”

DE MAR DE LIXO A REDUÇÃO SIGNIFICATIVA

Bali produz 1,6 milhão de toneladas de resíduos por ano, sendo 330 mil toneladas apenas de plástico. Grande parte não é coletada, permanecendo nas estradas, indo parar nos rios, invadindo as praias e chegando ao mar. 

O restante se acumula em aterros sanitários que já estão lotados e, recentemente, chegaram a queimar por mais de 30 dias, liberando toxinas no ar. Os 16 milhões de turistas anuais geram 3,5 vezes mais lixo por dia que os próprios moradores – o que representa 13% do total de resíduos produzidos na ilha.

Crédito: Community Waste Project

O Projeto Comunitário de Resíduos foi desenvolvido com o apoio do hotel Mexicola e da construtora Total Bangun Persada, que ajudou a construir o centro. A ideia se baseia em uma prática que o resort Potato Head defende há mais de uma década.

Quando foi inaugurado em 2010, cerca de 60% a 70% do lixo do resort era enviado para aterros sanitários. Hoje, esse percentual varia de acordo com a temporada e a ocupação, mas, em setembro de 2024, estava em apenas 2,6%.

Com a ajuda de uma empresa de auditoria chamada Mantra, a equipe aprendeu a monitorar o lixo gerado e a separá-lo em resíduos orgânicos e não orgânicos. Os resíduos orgânicos são compostados ou usados como ração para porcos; enquanto os não orgânicos são reciclados ou transformados em móveis espalhados pelo resort, como cadeiras feitas de garrafas plásticas recicladas.

UM MODELO QUE PODE SER REPLICADO EM TODA A ILHA

O centro oferece uma versão em maior escala desse processo, incluindo a possibilidade de transformar resíduos em novos produtos, usando máquinas que trituram e derretem plásticos. As empresas parceiras podem comprar móveis ou painéis de plástico reciclado diretamente do centro.

O lucro da venda desses produtos é reinvestido na comunidade e usado para financiar a construção de novos centros de tratamento de resíduos.

Península Tanjung Benoa, uma das praias mais famosas da ilha (Crédito: Pixabay)

“Estamos começando com o que temos”, explica Ronald Akili, fundador do Potato Head, destacando que, se o modelo der certo, ele pretende expandi-lo para toda a ilha. “Nosso objetivo para os próximos 10 anos é construir o máximo de centros comunitários de resíduos em Bali.”

O Finns Bali, um grande clube em Canggu, passou quase um ano aperfeiçoando seu sistema de gestão de resíduos. Antes disso, o clube enviava cerca de 80% do lixo produzido para aterros sanitários. Desde que aderiu ao projeto, esse número caiu para 20%, e a meta é reduzir ainda mais, chegando a 5%.

Os 16 milhões de turistas anuais geram 3,5 vezes mais lixo por dia que os próprios moradores.

“Participar do centro de resíduos aumentou a conscientização da nossa equipe sobre a importância do lixo como recurso”, afirma Abdul Manaf, gerente de ESG do Finns Bali, acrescentando que a equipe também envia resíduos orgânicos para compostagem, recicla uniformes antigos em parceria com uma empresa local e transforma hashis em móveis com a ajuda de outra empresa, a ChopValue.

O Kynd, restaurante vegano em Seminyak que também se inscreveu no centro comunitário, vai pelo mesmo caminho. "Nos tornamos muito mais conscientes sobre a separação e a quantidade de resíduos que geramos", diz a cofundadora Lauren Camilleri.

O restaurante costumava enviar os restos de comida para uma instalação de compostagem, mas uma quantidade significativa de outros resíduos acabava em aterros sanitários. Ao se juntar ao projeto, o Kynd espera garantir que seu lixo acabe no lugar certo. "Bali dá tanto para tantos", diz Camilleri. "Agora é hora de retribuir."


SOBRE A AUTORA

Elissaveta Brandon é colaboradora da Fast Company. saiba mais