Cidades-esponja se preparam para enfrentar chuvas torrenciais

Mudanças climáticas estão tornando cada vez mais comum a ocorrência de chuvas extremas. Veja como algumas cidades estão se adaptando

Crédito: Istock

Adele Peters 4 minutos de leitura

No último dia de 2022, o acumulado de chuvas em São Francisco chegou a 140mm – em apenas um dia choveu mais do que o esperado para todo o mês de dezembro –, fazendo com que as ruas da cidade inundassem.

O estado da Califórnia hoje enfrenta a pior seca em séculos. As mudanças climáticas estão tornando cada vez mais comum a ocorrência de chuvas extremas. E a previsão é de que o número de tempestades intensas dobre até 2100.

As chuvas torrenciais estão despejando trilhões de litros de água no estado, embora a maior parte não esteja sendo capturada para uso posterior, apesar da seca. Além disso, também estão causando inundações, um problema agravado em algumas áreas pelo aumento do nível do mar e pelo afundamento do solo. Mas um melhor design urbano pode amenizar esses eventos. Globalmente, algumas cidades já são pioneiras na solução desses problemas.

Em Copenhague, na Dinamarca, um projeto está construindo reservatórios em um parque da cidade – em áreas que as pessoas podem usar quando não está chovendo – e um novo canal que levará água para os lagos da região. Em ruas próximas, os jardins de chuva ajudam a absorver a água para evitar a sobrecarga do sistema de esgoto. Em outros bairros, jardins rebaixados armazenam água da chuva.

Telhados verdes, jardins de chuva e outras intervenções podem ajudar a desacelerar a água e “desfazer a alteração em grande escala do ciclo hidrológico”, explica Michael Kiparsky, diretor do Wheeler Water Institute da Universidade da Califórnia, em Berkeley. Esta abordagem também é conhecida como modelo de “cidade esponja”.

A infraestrutura verde está se tornando o padrão em muitos novos empreendimentos. Na cidade de Palo Alto, na Califórnia, a empresa de design urbano Perkins & Will está trabalhando em um projeto para devolver um riacho ao seu estado natural, criando uma área maior para a água penetrar no solo e um novo acesso à natureza para as pessoas que vivem nas proximidades.

Na cidade de Nova York, enquanto a chuva do furacão Ida e da tempestade tropical Henri inundava alguns apartamentos subterrâneos, a área em frente a um outro prédio permanecia seca. Uma “rua viva”, construída com pavimento permeável capaz de absorver a água, ajudou a evitar inundações, junto com jardins de chuva ao redor do prédio.

"Rua viva" em Nova York (Crédito: Local Office Landscape & Urban Design)

Em São Francisco, há vários projetos de infraestrutura verde recém-construídos. Ao longo de 14 quarteirões do Sunset Boulevard, uma das avenidas mais famosas do mundo, jardins de chuva captam a água que escorre da rua. A Holloway Avenue conta com oito blocos de pavimento permeável e canteiros na calçada projetados para captar água.

Algumas ruas adicionaram os chamados “bulb-outs” verdes – extensões de meio-fio nos cruzamentos que facilitam a travessia de pedestres e criam espaço extra para plantas e armazenamento de água.

No entanto, os novos projetos da cidade ainda são de escala relativamente pequena. “O que vimos até agora foram projetos-piloto muito bons em algumas áreas urbanas. E as pessoas estão vendo que podem funcionar”, destaca Dave Smith, diretor da Water Innovation Services.

Sacramento Valley Station, Sacramento, Califórnia (Crédito: Perkins & Will)

“O que é desafiador é realizar esse tipo de procedimento operacional em qualquer lugar onde seja feita uma nova pavimentação, uma nova rua, um novo terreno, de modo que se torne uma prática padrão.”

As cidades muitas vezes relutam em adotar novas abordagens. O financiamento é outro desafio, que inclui os recursos necessários para manter um sistema distribuído de infraestrutura verde depois de construído. E, embora projetos de águas pluviais tendam a se tornar mais comuns em novos empreendimentos, é mais difícil incorporá-los a áreas urbanas que já existem.

Além disso, há um grande desafio em relação a empreendimentos já construídos. Em São Francisco, como em outras cidades, alguns edifícios foram construídos em várzeas ou em cima de antigos córregos, pântanos e lagoas. Em fortes tempestades, a água retorna.

As mudanças climáticas estão agravando o problema, não apenas por causa das chuvas extremas, mas também porque o aumento do nível do mar está entupindo os sistemas de drenagem, tornando mais difícil o escoamento de grandes volumes de água.

Em alguns bairros, as infraestruturas verdes e melhorias nos esgotos tradicionais não são capazes de evitar inundações durante tempestades extremas. É possível que algumas pessoas, em algum momento, precisem se mudar das áreas mais atingidas.

São Francisco já havia considerado comprar algumas casas que costumam ser alagadas durante tempestades. Muitas outras cidades estão estudando fazer o mesmo, seja por causa das inundações causadas pela chuva, pelo aumento do nível do mar ou por ambos.

“O padrão de desenvolvimento ao longo dos últimos 100 anos foi presumir que podemos gerenciar a água com medidas de engenharia rígidas, tubulações, bombas e tanques”, explica Thaddeus Pawlowski, diretor administrativo do Centro para Cidades e Paisagens Resilientes da Universidade Columbia. “Com as mudanças climáticas, sabemos que isso é impossível agora.”

Não existe uma solução única para ajudar as cidades a se prepararem para mais chuvas, embora várias soluções combinadas possam fazer a diferença. Existem respostas físicas, como pavimento permeável, valas biológicas, mais árvores.

“Mas há questões operacionais que também são muito importantes, como ajudar as pessoas a entender os riscos, adquirir seguro contra inundações, ter um bom programa de abrigo. Precisamos de todas estas soluções”, diz Pawlowski.


SOBRE A AUTORA

Adele Peters é redatora da Fast Company. Ela se concentra em fazer reportagens para solucionar alguns dos maiores problemas do mundo, ... saiba mais