Coca-Cola se esforça para reduzir a emissão de carbono, mas a conta não fecha
Sua maior contribuição para a crise climática são os gases refrigeradores que mantêm as bebidas
A Coca-Cola é uma das marcas mais conhecidas do mundo. Esse alcance global, que abrange mais de 200 países, foi justamente o tema de um comercial de 2020 que mostrava famílias bebendo Coca-Cola durante as refeições em cidades como Orlando, Xangai, Londres, Cidade do México e Mumbai.
Operar nessa escala cria uma grande pegada de carbono. A empresa usa mais de 200 mil veículos para distribuir seus produtos e administra centenas de fábricas de engarrafamento e produção de xarope em todo o mundo. Mas a maior contribuição individual da Coca-Cola para a crise climática vem dos equipamentos de refrigeração.
Geladeiras usam muita eletricidade, e alguns gases de refrigeração que fazem parte desses sistemas são gases de efeito estufa, que retêm o calor na atmosfera. Quase dois terços do impacto climático da refrigeração vêm do consumo de eletricidade; os gases de refrigeração respondem pelo restante. Em 2020, a refrigeração produziu quase 8% das emissões globais de gases de efeito estufa.
Grandes empresas lucraram muito ao disponibilizar prontamente seus produtos em qualquer canto do mundo. Mas, ao fazer isso, criaram uma forma de venda de longa distância e em ritmo acelerado que é um dos principais impulsionadores da atual crise ecológica.
A SOLUÇÃO QUE ÃO DEU CERTO
Os gases de refrigeração se tornaram um problema ambiental pela preocupação com a perda de ozônio. Antes da década de 1980, os gases usados em geladeiras eram clorofluorcarbonos, ou CFCs.
Na década de 1970, os pesquisadores descobriram que os CFCs poderiam destruir a camada de ozônio, um gás presente na atmosfera que protege a vida na Terra da radiação ultravioleta do Sol. As nações finalmente decidiram proibir o uso de CFCs por meio do Protocolo de Montreal de 1987, um dos tratados ambientais mais bem-sucedidos da história.
As empresas químicas lideraram a promoção de novos gases de refrigeração sem cloro, chamados hidrofluorcarbonetos ou HFCs, que não destroem a camada de ozônio.
Mas esses HFCs tinham uma grande desvantagem: eram poderosos gases de efeito estufa que retinham o calor na atmosfera da Terra, aquecendo a superfície do planeta. Alguns HFCs tiveram impacto de aquecimento mais de mil vezes maior que o dióxido de carbono, o gás de efeito estufa mais abundante. Empresas como a Coca-Cola já sabiam desses efeitos quando começaram a transição, na década de 1990.
Grandes empresas criaram uma forma de venda de longa distância e em ritmo acelerado que é um dos principais impulsionadores da atual crise ecológica.
Já os especialistas em refrigeração na Europa preferiram adotar outro caminho. Os defensores do Greenpeace na Alemanha trabalharam em estreita colaboração com engenheiros de refrigeração para desenvolver o que veio a ser conhecido como equipamento de resfriamento Greenfreeze: máquinas que usavam hidrocarbonetos como gases de refrigeração.
Os hidrocarbonetos, que tiveram um impacto no aquecimento global radicalmente menor do que os HFCs, ofereciam a perspectiva de proteger tanto a camada de ozônio quanto o clima.
A Coca-Cola foi “bastante teimosa”, principalmente porque sua equipe temia que essas unidades de refrigeração cheias de material inflamável pudessem explodir – especialmente em áreas rurais sem suporte técnico. Em vez disso, a empresa resolveu abraçar os HFCs.
Em resposta, o Greenpeace lançou uma grande campanha nas Olimpíadas de Sydney em 2020 para expor como as unidades de HFC da Coca-Cola estavam aquecendo o planeta. Doug Daft, um australiano que era CEO da multinacional na época, assumiu o compromisso de eliminar a refrigeração HFC nos sistemas da empresa nos próximos anos.
NO CAMINHO CERTO
Desde 2000, a Coca-Cola tornou-se líder mundial no desenvolvimento de equipamentos de refrigeração sem HFC. A empresa reconheceu que os gases de refrigeração feitos de hidrocarbonetos, adotados na Europa, apresentavam menos riscos de segurança do que eles temiam inicialmente, e começou a adotar essas unidades.
Além disso, a Coca-Cola convenceu outras empresas a abandonar os HFCs. Em parceria com a Unilever, Pepsi, Red Bull e outras, a empresa lançou a “Refrigerants, Naturally!”, uma organização comprometida com a transição de empresas de alimentos e bebidas para refrigeração sem HFC.
Talvez seja a hora de os consumidores considerarem se sua comodidade vale os custos ambientais que impõe ao planeta.
Mesmo assim, em 2022, mais de 10% das novas geladeiras da Coca-Cola continham HFCs e a refrigeração continuou sendo sua maior fonte única de emissões de gases de efeito estufa.
Parte do problema é que essas unidades funcionam com eletricidade, em grande parte gerada pela queima de combustíveis fósseis. Com a Coca-Cola vendendo cerca de 2,2 bilhões de bebidas todos os dias, mantê-las geladas ainda gera uma enorme pegada de carbono. O mesmo vale para os concorrentes.
Apesar dos recursos que a empresa investiu, seus equipamentos de refrigeração ainda estão ajudando no aquecimento do planeta. Talvez seja hora de a Coca-Cola questionar se precisa de todas essas máquinas em primeiro lugar.
Talvez seja a hora, também, de os consumidores considerarem se sua comodidade vale os custos ambientais que impõe ao planeta.
Este artigo foi republicado de The Conversation sob licença Creative Commons. Leia o artigo original.