Ondas de calor se agravam: quais os limites que o corpo humano pode aguentar?

Conheça a “temperatura de bulbo úmido”, que combina calor e umidade e revela que o perigo é ainda maior do que imaginávamos

Crédito: Ricardo Gomez Angel/ Unsplash/ Uniconlabs/ Freepik

W. Larry Kenney, Daniel Vecellio, Rachel Cottle e S. Tony Wolf 4 minutos de leitura

As ondas de calor estão cada vez mais intensas devido às mudanças climáticas – duram por mais tempo, são mais frequentes e mais quentes. Uma pergunta que muitos estão fazendo é: quando chegará o dia em que o clima vai estar tão quente que impedirá atividades do dia a dia, mesmo para adultos jovens e saudáveis?

A resposta vai além da temperatura que vemos no termômetro, também leva em consideração a umidade. Nossa pesquisa mostra que a combinação dos dois pode revelar um cenário ainda mais perigoso do que se acreditava.

Cientistas e outros observadores ficaram estarrecidos com a crescente frequência de calor extremo combinado com alta umidade, classificada como “temperatura de bulbo úmido”. Durante as ondas de calor que atingiram o sul da Ásia em maio e junho de 2022, a cidade de Jacobabad, no Paquistão, registrou uma temperatura máxima de bulbo úmido de 33,6ºC, enquanto Délhi, na Índia, atingiu uma ainda maior, perto do limite (teórico) da resistência humana.

Com base em um estudo publicado em 2010, estimava-se que a temperatura de bulbo úmido de 35ºC (o equivalente à mesma temperatura a 100% de umidade, ou 46,1ºC a 50%) seria o limite para o corpo humano. Além disso, não seria possível manter uma temperatura estável pelo suor.

No entanto, apenas recentemente esse limite foi testado em humanos em laboratório. E os resultados mostram mais motivos para preocupação.

O PROJETO PSU HEAT

Para responder à pergunta “o quanto é quente demais para o corpo humano aguentar?” reunimos homens e mulheres jovens e saudáveis no Laboratório Noll da Universidade Estadual da Pensilvânia para testar o estresse térmico em um ambiente controlado.

Esses experimentos forneceram informações sobre quais combinações de temperatura e umidade passam a ser prejudiciais até mesmo para os humanos mais saudáveis.

Quando o corpo superaquece, o coração precisa trabalhar mais para bombear sangue para a pele e dissipar o calor.

Cada participante ingeriu uma pequena pílula de telemetria, para monitorar sua temperatura corporal central. Eles se sentaram em uma câmara, movendo-se apenas o suficiente para simular as atividades mínimas do dia a dia, como cozinhar e comer. Os pesquisadores aumentavam lentamente a temperatura e a umidade e monitoravam quando a temperatura corporal central começava a subir.

Essa combinação que faz a temperatura central começar a subir é chamada de “limite ambiental crítico”. Abaixo dele, o corpo é capaz de manter sua temperatura relativamente estável. Acima, agrava-se o risco de doenças relacionadas ao calor com exposições prolongadas.

Quando o corpo superaquece, o coração precisa trabalhar mais para bombear o sangue para a pele e assim dissipar o calor. Além disso, ao suar, os fluidos corporais diminuem. Em casos mais graves, a exposição prolongada pode resultar em insolação, condição que apresenta risco à vida e que requer resfriamento imediato e rápido, além de tratamento médico.

Nossos estudos com pessoas jovens e saudáveis ​​mostram que o limite, na verdade, é menor do que os 35°C que se acreditava antes. Na verdade, é de 31°C de temperatura de bulbo úmido, o que equivale a 31ºC a 100% de umidade ou 38ºC a 60%.

AMBIENTES SECOS X ÚMIDOS

Em ambientes quentes e secos, os limites ambientais críticos não são definidos pelas temperaturas de bulbo úmido, porque quase todo o suor que o corpo produz evapora, o que o faz esfriar. No entanto, há um limite na produção de suor, além do fato de que ganhamos calor em temperaturas mais altas.

O limite apenas evita que a temperatura do corpo suba excessivamente. Temperaturas e umidades mais baixas ainda podem sobrecarregar o coração e outros órgãos.

Maiores de 65 anos representam cerca de 80% a 90% das vítimas das ondas de calor.

Nosso experimento agora foca em testar homens e mulheres mais velhos, já que mesmo o envelhecimento saudável torna as pessoas menos tolerantes ao calor. Pessoas com mais de 65 anos representam cerca de 80% a 90% das vítimas das ondas de calor.

Manter-se bem hidratado e buscar áreas para se refrescar, mesmo por curtos períodos, são de extrema importância em altas temperaturas.

Um estudo recente com foco no estresse térmico na África descobriu que os climas futuros não serão propícios ao uso de sistemas de resfriamento de baixo custo, como “resfriadores de pântano” (ou resfriador evaporativo), à medida que as regiões tropicais e costeiras da África se tornam mais úmidas.

Esses dispositivos, que exigem muito menos energia do que os condicionadores de ar, usam um ventilador para circular o ar em uma almofada fria e úmida para diminuir a temperatura do ambiente, mas são ineficazes em temperaturas de bulbo úmido acima de 21ºC.

Com tudo isso, vemos cada vez mais evidências de que a mudança climática não é um problema futuro. É um problema que já estamos enfrentando e precisamos encará-lo de frente.


SOBRE O(A) AUTOR(A)

W. Larry Kenney é professor de fisiologia, cinesiologia e desempenho humano; Daniel Vecellio é geógrafo-climatologista e bolsista de p... saiba mais