Disputa por minerais críticos pode redesenhar o mapa do poder global

Do carro à inteligência artificial, inovações aceleram dependências materiais e reacendem as disputas geopolíticas

minerais críticos para indústria eletroeletrônica
Créditos: Andrey Suslov/ dem10/ Getty Images

Peter Müllner 3 minutos de leitura

A inteligência artificial generativa se consolidou como uma ferramenta capaz de aumentar a produtividade. Mas a tecnologia está longe de madura. Modelos de linguagem avançam rapidamente de uma geração para outra, e especialistas só conseguem especular sobre como a IA afetará o mercado de trabalho e a vida cotidiana das pessoas.

Com frequência, a adoção massiva de uma nova invenção transforma o comportamento humano — e isso leva ao surgimento de novas tecnologias e infraestruturas que passam a depender dessa invenção. Por sua vez, essas tecnologias e infraestruturas exigem materiais novos ou aprimorados — e muitos deles incluem minerais críticos: aqueles que são essenciais para o funcionamento da tecnologia, mas pressionam a cadeia de suprimentos.

A distribuição desigual desses minerais dá poder aos países que os produzem. As mudanças resultantes de poder pressionam relações geopolíticas e impulsionam a busca por novas fontes minerais. Novas tecnologias alimentam a indústria de mineração.

O CARRO E O NASCIMENTO DOS SUBÚRBIOS

No início do século 20, apenas 5 em cada 1.000 pessoas tinham um carro, e a produção anual girava em torno de alguns milhares de unidades. Em 1913, Henry Ford transformou a indústria ao inventar a linha de montagem. A partir daí, uma família de classe média podia finalmente comprar um automóvel.

Com os carros veio maior mobilidade, e muitas pessoas se mudaram para mais longe do local de trabalho. Mas longos deslocamentos aumentaram a poluição e os custos, criando demanda por veículos mais leves e eficientes. Fabricá-los exigia materiais melhores.

Em 1970, todo o chassi e a carroceria de um carro eram produzidos com um único tipo de aço. Em 2017, os veículos já combinavam 10 tipos diferentes de aços altamente especializados. Cada liga contém elementos químicos específicos — como molibdênio e vanádio — extraídos em apenas alguns países.

Hoje, a indústria automotiva depende fortemente de importações. Essa dependência gerou tensões com parceiros comerciais, refletidas em tarifas mais altas sobre o aço.

O CELULAR E A VIDA COTIDIANA

O telefone celular é um exemplo claro de como uma tecnologia cria demanda por minerais e afeta políticas internacionais. Em 1983, a Motorola lançou o DynaTAC, o primeiro celular comercial. Era pesado, caro e tinha bateria para apenas meia hora — poucos tinham um.

Em 1996, a Motorola lançou o flip phone, mais leve, barato e fácil de usar. Ele inaugurou a adoção em massa dos celulares. Mas ainda era apenas um telefone: diferente dos smartphones atuais, servia apenas para chamadas e mensagens.

Em 2007, a Apple redefiniu a comunicação com o iPhone, inaugurando a tela sensível ao toque e integrando um navegador de internet. O telefone virou um hub digital para navegação, busca de informações e construção de identidade social online. Antes dos smartphones, celulares complementavam a vida diária; agora, estruturam toda a rotina.

Sem o smartphone, grande parte das pessoas não consegue cumprir suas tarefas cotidianas. Muitos já experimentam nomofobia — a ansiedade de ficar sem o aparelho.

Quase três quartos de todos os elementos estáveis da tabela periódica estão presentes nos componentes de cada smartphone. São essenciais para materiais altamente especializados que permitem telas sensíveis ao toque, baterias, alto-falantes, microfones e câmeras.

Muitos desses elementos são indispensáveis para pelo menos uma função e têm cadeias de suprimento instáveis — o que os torna críticos.

MATERIAIS CRÍTICOS E A IA

Materiais críticos dão vantagem estratégica aos países que detêm o monopólio de sua extração e processamento. A China, por exemplo, ampliou seu poder graças ao controle sobre as terras raras.

Em abril de 2025, em resposta a tarifas dos EUA, a China suspendeu a exportação de ímãs de terras raras usados em celulares. As tensões geopolíticas que se seguiram mostram o poder embutido no domínio desses minerais.

A adoção em massa da IA provavelmente mudará o comportamento humano e dará origem a novas tecnologias, indústrias e infraestruturas das quais a economia global dependerá.

Todas essas tecnologias exigirão materiais ainda mais otimizados e especializados — e criarão novas dependências minerais. Ao ampliar essas dependências, a IA pode afetar relações geopolíticas e reorganizar o poder global. Enquanto o intervalo entre inovação e dependência material levou um século para os carros e algumas décadas para os celulares, o ritmo acelerado dos modelos de linguagem sugere que, para a IA, a escala será de poucos anos. A pressão já começou.


SOBRE O AUTOR

Peter Müllner é professor de engenharia e ciência dos materiais na Universidade Estadual de Boise. saiba mais