Este salão de conferências em Berlim virou sala de aula para refugiados

Crédito: Fast Company Brasil

Claudia Penteado 4 minutos de leitura

No escritório de uma empresa de tecnologia em Berlim, os funcionários agora trabalham em um corredor que dá para uma sala de conferências, onde alunos ucranianos aprendem matemática e redação. A Ecosia, uma empresa com grande impacto social, viu seu escritório vazio quando passou a adotar um modelo de trabalho híbrido. E, assim que refugiados começaram chegar da Ucrânia, ela decidiu usar esse espaço como sala de aula.

“Como tantas outras pessoas, ficamos em choque quando a invasão começou”, diz Christian Kroll, fundador e CEO da Ecosia. “Na manhã seguinte, começamos a pensar em como poderíamos ajudar.” A primeira ideia que tiveram foi fornecer moradia: alguns funcionários ofereceram quartos em suas próprias casas, enquanto outros ajudaram a criar uma plataforma digital para conectar ucranianos a pessoas que poderiam oferecer abrigo. Os líderes da empresa, em princípio, também consideraram disponibilizar o escritório para habitação. Mas quando a equipe conversou com uma ONG que trabalha com refugiados, eles compreenderam que a maior necessidade era, na verdade, salas de aula.

Cortesia: Ecosia

Apesar de a prefeitura de Berlim estar procurando formas de matricular crianças refugiadas em escolas públicas e contratando mais professores, seus esforços não têm conseguido atender à enorme demanda, já que todos os dias novas crianças chegam à capital. Estima-se que 28 mil refugiados ucranianos chegaram a Berlim desde o início da guerra, sendo metade deles crianças. Muitos estão lá apenas temporariamente, enquanto se preparam para se mudar para outra cidade, o que torna uma escola provisória muito mais adequada do que uma matrícula definitiva.

No escritório da Ecosia, que comporta até 90 funcionários, cerca de 40 crianças entre 6 e 10 anos passaram a frequentar aulas de ciências, ucraniano e alemão básico em uma ala do andar. O material didático é fornecido online pelo governo ucraniano e as aulas contam com dois professores voluntários de lá e outros três da Alemanha, que ensinam o idioma para os alunos.    

Crédito: Ecosia

“Quando os primeiros refugiados começaram a chegar a Berlim, vimos que a primeira e mais urgente necessidade – encontrar um lugar para ficar – foi relativamente bem atendida”, diz Faina Karlitski, consultora do BCG, organização que ajudou a criar o projeto Classroom for Ukraine (Sala de Aula para a Ucrânia), parte de um esforço mais amplo chamado Alliance 4 Ukraine. (Aliança para a Ucrânia). “Mas havia todas aquelas mães, abrigadas em quartos de hóspedes na casa de voluntários, sozinhas com seus filhos, preocupadas e pensativas. A maioria das crianças que vieram ao nosso evento de apresentação não brincavam com outras há mais de duas semanas… suas mães não tinham acesso a creche, portanto, não podiam conseguiam planejar e estruturar seus próximos passos no novo país. Então, nossa ideia principal era agir de forma rápida e desburocratizada – criar um espaço que atendesse à necessidade das crianças de socializar com outras, ter uma rotina e receber estímulos.”

A ONG trabalhou com a organização de bem-estar infantil Die Arche para ajudar a montar uma sala de aula temporária no escritório, e as famílias de refugiados souberam da iniciativa através do boca a boca. Hoje, ela já conta com uma lista de espera, mas dentro de pouco tempo as crianças ingressarão em escolas regulares. “Isso acontecerá em breve”, diz Kroll, da Ecosia. “Mas, enquanto isso, precisávamos de algum tipo de solução. E estamos felizes por poder oferecer isso.”

Ele espera que outras empresas façam o mesmo. Karlitski identificou pelo menos 20 escritórios com a mesma estrutura em Berlim que poderiam servir como salas de aula temporárias. “Todos os dias, cerca de dez mães entram em contato conosco para solicitar uma vaga para seu filho, e tudo isso sem publicidade”, conta. A organização agora planeja expandir a iniciativa para outras cidades alemãs.

A Ecosia também defende um maior investimento financeiro. Após o início da invasão, a empresa decidiu investir € 20 milhões em energia renovável para ajudar o país a se tornar menos dependente do petróleo russo. Como uma empresa focada em sustentabilidade – a Ecosia criou um mecanismo de busca que financia o plantio de árvores – seu próprio uso de energia já era renovável. Mas queria investir mais e argumenta que as maiores empresas de tecnologia poderiam se valer de seu tamanho para causar um impacto ainda maior, tanto para a atual crise na Ucrânia quanto para as mudanças climáticas. “Acredito que sempre que há uma crise, todos temos a obrigação de fazer alguma coisa”, diz Kroll.


SOBRE A AUTORA

Claudia Penteado é editora chefe da Fast Company Brasil. saiba mais