Fundador da Whole Foods agora quer ajudar as pessoas a cuidar da saúde
John Mackey fala sobre a Love.Life, sua nova startup de saúde que combina desde consultas médicas e alimentação saudável a aulas de ioga
A evolução é uma constante na jornada de John Mackey.
O fundador e ex-CEO da Whole Foods deixou seu cargo no ano passado, após 44 anos desenvolvendo seu conceito de mercado e criando uma cadeia de lojas, que foi adquirida pela Amazon em 2017 por US$ 13,7 bilhões. O que começou como uma série de cooperativas de alimentos naturais se transformou em uma rede de mais de 500 supermercados que influenciaram todo o setor.
Agora, ele está embarcando em um novo projeto. A Love.Life é uma startup focada em saúde preventiva e holística, cujo objetivo é cuidar do “corpo, mente e espírito”.
Para dar início às operações, a empresa realizou três aquisições: um restaurante em Miami chamado Love Life Cafe, que Mackey transformou na marca principal da startup; uma plataforma de coaching online chamada Mastering Diabetes; e uma clínica de telemedicina preventiva especializada em doenças crônicas, a Plant Based TeleHealth. A Love.Life planeja inaugurar seu primeiro centro na região de Los Angeles no ano que vem.
Nesta entrevista à Fast Company, Mackey explica como a startup impulsionará o que ele chama de medicina 3.0 e continuará a se expandir por décadas, seguindo um modelo de negócios consciente, capaz de evoluir, aprender e crescer.
Fast Company – O que o motivou a criar a Love.Life?
John Mackey – Meu desejo é contribuir para um mundo mais saudável. A Whole Foods tinha a missão de oferecer alimentos saudáveis, influenciar a forma como as pessoas pensam sobre alimentação e ajudar a promover mudanças no sistema agrícola, em certa medida. Com a Love.Life, temos a oportunidade de ir além.
Quando paramos de envenenar nosso corpo com toxinas e passamos a ingerir alimentos saudáveis, fazer exercícios e praticar relaxamento, ele responde rapidamente.
Quando falamos de saúde, não estamos apenas nos referindo à saúde física, que é o foco da Love.Life com dieta saudável, cuidados médicos avançados e terapias de bem-estar, mas também à saúde mental, pois vivemos em uma sociedade que vem sofrendo cada vez mais com problemas emocionais.
Além disso, estamos enfrentando uma crise espiritual. As pessoas não são mais movidas por um propósito maior. É por isso que considero as terapias psicodélicas que estão surgindo fascinantes, pois podem realmente ajudar a descobrir um significado mais profundo.
Fast Company – Como suas experiências pessoais influenciaram a criação da empresa?
John Mackey – Cerca de 15 anos atrás, na Whole Foods, iniciamos um programa chamado “Imersão Total em Saúde”. Nossa empresa cobria as despesas médicas de todos os funcionários, mas quando analisei os números, percebi que cerca de 10% deles eram responsáveis por 90% dos gastos com cuidados médicos.
Embora houvesse situações pontuais, como acidentes de moto ou partos prematuros, que custavam centenas de milhares de dólares, a maior parte das despesas estava relacionada a doenças crônicas, como diabetes tipo 2 e doenças cardíacas.
O programa contou com a participação de quatro mil funcionários e os resultados foram impressionantes. Não tinha ideia do quão rápido as pessoas poderiam melhorar simplesmente fazendo mudanças no estilo de vida e na dieta.
Cheguei à conclusão de que o corpo humano é surpreendentemente resiliente. Quando paramos de envenená-lo com toxinas e passamos a ingerir alimentos saudáveis, fazer exercícios e praticar relaxamento, nosso corpo responde rapidamente.
Fast Company – Qual é a estratégia da Love.Life?
John Mackey – Temos duas estratégias principais. A primeira é o formato virtual. Temos uma clínica de telemedicina que atende todo o país, além de cerca de 27 ou 28 outros ao redor do mundo. E estamos lançando três programas para membros.
Hoje em dia, com a medicina 2.0, as pessoas vão ao médico apenas quando estão doentes. Com a medicina 3.0, queremos que elas se tornem membros da nossa comunidade e estabeleçam primeiro uma linha de base. Então, pedimos que realizem diferentes tipos de testes. Eu mesmo já fiz todos eles. Fiz teste genético, exame de fezes, etc. Agora, conheço o meu microbioma, sei meu nível de glicose no sangue. Fiz inclusive um exame swab que revela a idade biológica.
A maioria das pessoas fica paralisada pelo medo. Não há como ser criativo quando se está com medo. É preciso superá-lo.
Além disso, adquirimos uma plataforma de coaching online chamada Mastering Diabetes. Criamos recentemente um programa de perda de peso e pretendemos lançar vários outros, como para hipertensão e para diversas doenças autoimunes. A Love.Life terá esse componente virtual, que representa metade da nossa estratégia.
A outra metade envolve a abertura de estabelecimentos físicos. Nosso primeiro centro estará localizado na região de Los Angeles. Será um espaço amplo, com quase 4,2 mil metros quadrados. Terá um restaurante de comida saudável, clínica médica, academia, centro de bem-estar e oferecerá aulas de ioga, pilates e diversos tratamentos restaurativos. Além disso, incluiremos várias práticas de bem-estar, como acupuntura, quiropraxia, fisioterapia e reiki.
Fast Company – Qual é a sua idade biológica?
John Mackey – Minha idade celular é 65 anos. Mas a metabólica é 40,5 anos. Gosto de brincar dizendo que tenho 25 anos a menos do que diz na minha carteira de identidade. Isso me deixa bastante orgulhoso.
Fast Company – A Love.Life será acessível a todos?
John Mackey – A Whole Foods não atendia apenas pessoas ricas ou privilegiadas. Nós simplesmente oferecíamos alimentos da mais alta qualidade e criávamos uma ótima experiência nas lojas, oferecendo um serviço de alto nível para todos.
estamos enfrentando uma crise espiritual. As pessoas não são mais movidas por um propósito maior.
A Love.Life é voltada para quem busca o que oferecemos. Provavelmente, no começo, estará mais concentrada em mercados em que as pessoas são mais conscientes, se preocupam com a saúde e sabem o impacto da alimentação. Toda empresa começa por onde seu público-alvo está.
Fast Company – Como a tecnologia se encaixará na Love.Life?
John Mackey – Vou te contar uma história: há um ano e meio, parei de beber álcool por causa do meu Apple Watch e de um aplicativo que monitora o sono. Comecei a perceber que sempre que ingeria álcool, mesmo que fosse apenas uma taça de vinho, a qualidade do meu sono caía bastante. Minha frequência cardíaca, que normalmente fica em torno de 48 batimentos por minuto quando estou dormindo, subia para 56 ou 58 quando bebia.
Além disso, a duração total do meu sono era reduzida em cerca de uma hora. Ou seja, eu não dormia tanto. Não estou dizendo que nunca mais vou beber, porque provavelmente vou, mas será uma escolha consciente. Sempre me pergunto: “será que eu realmente quero abrir mão de uma boa noite de sono?”. Até agora, a resposta tem sido não.
Fast Company – Você falou sobre propósito. Você sente que o seu mudou ao longo do tempo?
John Mackey – Li um livro incrível [chamado “O Jogo Infinito”] alguns anos atrás, escrito por Simon Sinek, que teve um grande impacto em mim, pois me fez perceber: “durante todo esse tempo, eu estava em um jogo infinito”.
Uma partida de futebol, por exemplo, é finita, tem uma duração certa. Já o jogo infinito não precisa ter fim. Eu criei a Whole Foods para ser exatamente isso. E a Love.Life também. Não verei o fim delas.
Em algum momento, teremos 540 estabelecimentos físicos – algo que pude ver se tornar realidade com a Whole Foods. Mesmo que acredite que vou viver por muito tempo, talvez eu não chegue a ver isso acontecer [com a Love.Life]. Digo que é um jogo infinito porque é um negócio consciente com um propósito maior – capaz de evoluir, aprender e crescer
Fast Company – Que conselho você daria a outros empreendedores?
John Mackey – A maioria das pessoas fica paralisada pelo medo. Esse sentimento as impede de agir, de se encontrar. Não há como ser criativo quando se está com medo. É preciso superá-lo. O grande ponto de virada para mim foi quando decidi simplesmente seguir meu coração.
A Love.Life é uma nova aventura. Estou de volta ao jogo. Pode ser que não dê certo. Mas acredito que dará. Sinto como se fosse algo que preciso fazer. É o que o meu coração me diz. Posso até perder a maior parte da fortuna que conquistei com a Whole Foods. Pode ser que tudo vá por água abaixo.
Mas preciso fazer isso. Porque, se eu chegar ao fim da minha vida, sabendo que poderia ter ajudado milhões de pessoas a viverem uma vida mais saudável e não o fiz porque fui covarde demais, ficaria extremamente desapontado comigo mesmo. Por isso, tenho que tentar.
Esta entrevista foi editada para maior clareza e brevidade.