Conheça o laboratório da Amazon que pode mudar como reciclamos plásticos
Centro de pesquisa busca criar um tipo de plástico mais limpo de produzir – e mais fácil de reciclar

Todo mundo conhece a Amazon pelas suas embalagens – caixas e envelopes com o famoso logo sorridente. Mas, em um galpão discreto em uma área ainda industrial de Seattle, nos EUA, um grupo de cinco cientistas do Laboratório de Inovação em Materiais Sustentáveis da empresa está trabalhando para criar uma embalagem mais sustentável.
“Nossa meta de longo prazo é tornar o plástico tão simples de reciclar quanto o papel”, afirma Alan Jacobsen, diretor de ciências de materiais e energia do laboratório. “Você não precisa saber se o plástico é tipo um, dois, três ou quatro. Basta jogar fora, e pronto.”
A empresa afirma que pretende compartilhar os avanços da pesquisa e da tecnologia com outras companhias. Se funcionar, o projeto pode mudar radicalmente a produção de embalagens e os sistemas de reciclagem.
Em outubro do ano passado, a Amazon anunciou ter trocado todos os enchimentos plásticos por papel, como parte de seu compromisso com a redução de plástico. O papel é mais ecológico e tem taxas de reciclagem muito mais altas.
Mas, para certas aplicações, ainda não é uma opção viável – especialmente para embalagens de alimentos, “por causa das propriedades físicas do material”, explica Jacobsen.
Nesses casos, a solução sempre foi recorrer ao plástico. Mas Jacobsen e sua equipe estão desenvolvendo uma alternativa: os biopolímeros – plásticos biodegradáveis feitos a partir de materiais biológicos, resíduos ou conteúdo reciclado.
Só que não basta criar, testar e produzir esse novo material. A Amazon quer garantir que ele também seja fácil de reciclar – e é aí que tudo fica mais complicado. A infraestrutura atual de reciclagem não consegue diferenciar bem os tipos de plástico. Quando há dúvida, o destino costuma ser o aterro sanitário.
O objetivo do laboratório é eliminar esse problema. A ideia é criar biopolímeros feitos de diferentes fontes – inclusive plásticos reciclados – que possam ser facilmente identificados, separados e reaproveitados.
CÂMERAS QUE AJUDAM A IDENTIFICAR RESÍDUOS
A Glacier, uma startup que recebeu investimentos da Amazon no ano passado, desenvolveu um robô capaz de identificar e separar mais de 30 tipos diferentes de materiais, tornando os fardos recicláveis mais precisos e reduzindo o desperdício.
Um cliente da região Centro-Oeste dos EUA instalou uma câmera com IA da Glacier para monitorar o lixo que saía de sua instalação, garantindo uma última chance de recuperar materiais recicláveis. Rapidamente, descobriram que dois terços do “vazamento” – ou seja, materiais recicláveis que acabavam indo parar no lixo – vinham de garrafas de bebidas.
Com essa informação em mãos, a empresa conseguiu ajustar seus processos. “Agora, estão no caminho de recuperar 15 milhões a mais dessas garrafas PET por ano, que antes iam direto para o aterro”, conta Areeb Malik, cofundador da Glacier.

A Amazon pretende instalar um desses robôs em seu laboratório em junho. A ideia é que, à medida que novos biopolímeros forem sendo criados, o sistema aprenda a reconhecê-los como recicláveis – sem correr o risco de descartá-los por engano.
“Queremos garantir que, quando esses materiais estiverem no mercado, eles sejam automaticamente identificados por esses sistemas”, explica John Shane, engenheiro de materiais que está há três anos no laboratório da Amazon.
“Vamos gerar conjuntos de dados que poderão ser compartilhados com a Glacier, que por sua vez poderá repassá-los aos seus clientes.” A partir dessas informações, outras empresas poderão criar embalagens mais fáceis de reciclar e que sejam facilmente reconhecidas pelos robôs.
PROJETANDO SUBSTÂNCIAS PARA QUEBRAR OS PLÁSTICOS
Mesmo que a tecnologia da Glacier escale e consiga identificar mais plásticos recicláveis, a infraestrutura de hoje nem sempre é capaz de transformar esses materiais em novos produtos. É aí que entra a EsterCycle, empresa que está apostando na reciclagem química.
“Os plásticos são formados por longas cadeias de moléculas chamadas polímeros”, explica Julia Curley, fundadora da EsterCycle. “Nós quebramos essas cadeias em seus componentes básicos – como desmontar um conjunto de blocos de Lego peça por peça. Depois, essas peças podem ser usadas para produzir novos plásticos.”

Esse processo é especialmente importante no caso dos plásticos compostáveis, muito usados em embalagens de alimentos. Ao quebrar esse tipo de material, a EsterCycle gera “blocos de construção” que podem ser vendidos para diferentes fabricantes.
“A ideia é que esses blocos possam ser integrados diretamente nas linhas de produção que já existem, sem precisar mudar nada”, diz Curley.
NOVAMONT INVESTE EM RECICLAGEM COM IA
Desde 1990, a italiana Novamont tem se dedicado ao desenvolvimento de produtos biodegradáveis e compostáveis e está exatamente no perfil das empresas que poderiam adotar os novos blocos de construção molecular sustentáveis.
Um de seus principais produtos, o Mater-Bi, já é amplamente utilizado em sacolas de compras e embalagens. Inicialmente era fabricado com poliésteres derivados de combustíveis fósseis, mas a empresa vem ampliando aos poucos o uso de matérias-primas renováveis na composição do material.
A proposta é que a Novamont, assim como outras empresas do setor, consiga incorporar os biopoliésteres de forma fluida em seus processos de produção. Após o uso, o objetivo é que as sacolas entrem novamente na cadeia de reciclagem.

Para isso, a Novamont conduz testes em parceria com um modelo de inteligência artificial da Glacier, para garantir que os sacos sejam corretamente identificados e separados nas centrais de triagem.
O cenário ideal, segundo a empresa, envolve o uso da tecnologia EsterCycle, capaz de quebrar quimicamente o material, permitindo que ele seja reinserido na cadeia produtiva da própria Novamont – fechando, assim, um ciclo de produção verdadeiramente circular.
Pode ser um pouco desconcertante tentar conciliar as inovações que surgem do Laboratório de Inovação em Materiais Sustentáveis e a paixão genuína que a equipe demonstra por uma cadeia de suprimentos livre de combustíveis fósseis com o fato de a Amazon ser uma das maiores varejistas do mundo.
No entanto, nosso vício em consumir – e o compromisso da Amazon em atender a essa demanda – indica que esse ciclo dificilmente será interrompido tão cedo. Garantir que ele não venha embalado em plástico derivado de combustíveis fósseis é uma questão crucial.