Navio de carga movido a vela emite 90% menos poluição – e chega mais rápido
Novo cargueiro reduz emissões em 99% em comparação ao transporte aéreo e em 90% em relação aos porta-contêineres tradicionais

À primeira vista, ele parece mais um iate de corrida do que um navio de carga. Mas esse novo cargueiro movido 100% a vela começará em breve a transportar produtos da Europa para os Estados Unidos – e pode até fazer isso mais rápido do que navios tradicionais.
A Vela, startup francesa responsável pelo projeto, adaptou tecnologias do universo das regatas para deixá-lo o mais veloz possível. O novo navio é um trimarã – ou seja, possui três cascos –, o que melhora o desempenho e a estabilidade na água. Seu formato largo também permite instalar velas maiores.
Assim como nos barcos de corrida, o mastro é feito de fibra de carbono e as velas usam um tecido de alto desempenho, projetado para suportar grandes tensões. O navio também conta com sistemas de navegação típicos de regatas, capazes de identificar as melhores rotas e condições de vento durante a travessia do Atlântico.
Nada disso “é apenas para impressionar”, afirma Michael Fernandez-Ferri, cofundador da Vela. “Tudo foi pensado para garantir mais velocidade.”
A Vela faz parte de um grupo ainda pequeno, mas crescente, de startups que querem tornar o transporte marítimo à vela uma alternativa viável. Um cargueiro à vela da francesa TOWT fez sua primeira travessia do Atlântico no ano passado e um navio híbrido – que combina vela e diesel – completou sua primeira viagem em outubro.
A nova embarcação da Vela foi pensada para atender uma fatia específica da cadeia global: empresas que produzem itens de alto valor, como cosméticos de luxo e medicamentos, e que buscam formas de descarbonizar seu transporte.

Para muitas delas, o transporte aéreo costuma ser uma das maiores fontes de emissões. Migrar para o transporte marítimo – mesmo usando navios movidos a diesel – já ajudaria, mas isso raramente é possível porque cargueiros tradicionais são pouco previsíveis.
Navios convencionais enfrentam grandes atrasos nos portos. “Os porta-contêineres ficaram cada vez maiores e hoje só conseguem atracar em alguns portos específicos”, explica Fernandez-Ferri. “Esse virou o grande gargalo da indústria.”
O novo cargueiro à vela é bem menor – cerca de 67 metros, contra até 400 metros dos maiores porta-contêineres. Ele transporta 600 paletes europeus, muito menos que as centenas de milhares carregadas por grandes navios.
Mas o tamanho reduzido permite acessar terminais menos movimentados e evitar longas filas. O carregamento e o descarregamento também são bem mais rápidos – um porta-contêiner, dependendo do tamanho, pode levar até uma semana só para ser descarregado.
O projeto inspirado em regatas também permite que ele atravesse o oceano com velocidade semelhante à de um navio tradicional. E, como economiza tempo nos portos, o prazo total de entrega diminui, garantindo mais previsibilidade.
Para cargas que podem valer até US$ 1 milhão por palete, isso também aumenta a segurança: elas permanecem no navio até serem transferidas para um local seguro.
SISTEMA REDUZ EMISSÕES EM 99%
O novo navio tem mais de 230 metros quadrados de painéis solares que alimentam uma bateria a bordo. Dois hidrogeradores também produzem energia enquanto ele navega. Essa eletricidade mantém os sistemas de refrigeração – importantes para medicamentos – e o restante dos equipamentos funcionando.
A propulsão é praticamente toda feita pelo vento, exceto durante as manobras nos portos. Com isso, as emissões caem 99% em comparação ao transporte aéreo e 90% em relação aos porta-contêineres tradicionais.
Além disso, o barco é silencioso e não gera poluição, já que não usa água de lastro nem libera resíduos de combustível. Seu casco é feito de alumínio – mais leve que o aço usado em cargueiros comuns e mais fácil de reciclar no fim da vida útil.
O primeiro navio da Vela está sendo construído nas Filipinas, em um estaleiro especializado em embarcações de alumínio com três cascos. Se tudo correr como planejado, ele começará a fazer entregas daqui a um ano para empresas como Takeda Pharmaceuticals, a fornecedora de dispositivos médicos Echosens e a fabricante de cosméticos Greentech.

A empresa levantou € 40 milhões em 2024 e, após a primeira viagem comercial, pretende captar mais recursos para construir outros quatro navios. Com uma frota de cinco embarcações, poderá oferecer partidas semanais – o suficiente para atender seus clientes.
Futuramente, a Vela pretende licenciar sua tecnologia para que parceiros criem rotas em outras regiões do mundo. “Imaginamos um futuro em que operadores locais usam nossa tecnologia para levar o transporte à vela ao seu máximo potencial”, diz Fernandez-Ferri.