O que está atrasando a substituição de combustíveis fósseis por energia limpa?
Inércia regulatória, disputas políticas e falta de investimento estão travando a transição energética em boa parte do mundo

Pelas manchetes, talvez não pareça, mas há boas notícias na luta global contra as mudanças climáticas. Há 10 anos, a maneira mais barata de atender ao crescimento da demanda por energia era construir mais usinas a carvão ou gás natural. Mas isso mudou.
Hoje, a energia solar e a eólica não só são melhores para o planeta, como também já são mais baratas que os combustíveis fósseis – e fazem menos mal à saúde.
Mesmo assim, projetos de energia renovável ainda encontram obstáculos, inclusive nos países em desenvolvimento que mais crescem. Sem dúvida, é possível superar essas barreiras e ampliar o uso de energia limpa – mas isso depende de cooperação internacional.
Com o avanço das tecnologias, a energia solar e a eólica ficaram mais baratas do que o carvão e o gás natural na maior parte do mundo. Só em 2024, a geração global de energia renovável economizou US$ 467 bilhões em custos com combustíveis fósseis.
Com a queda de preços, mais de 90% da nova capacidade de geração elétrica adicionada no mundo no ano passado veio de fontes limpas, de acordo com a Agência Internacional de Energia Renovável. No fim de 2024, a energia limpa já representava 46% da capacidade elétrica global, com um recorde de 585 gigawatts adicionados.
BENEFÍCIOS DA TRANSIÇÃO ENERGÉTICA À SAÚDE
Além de mais baratas, as energias renováveis também são melhores para a saúde. Queimar carvão, petróleo e gás libera partículas e gases tóxicos, que podem causar doenças graves. Um estudo recente estima que a poluição causada por combustíveis fósseis provoca cerca de cinco milhões de mortes por ano no mundo – com base em dados de 2019.
A queima desses combustíveis também é a principal fonte de gases de efeito estufa. Eletrificar casas, carros e equipamentos – e alimentá-los com energia renovável – reduziria esses poluentes e ajudaria a conter o avanço da crise climática.
Mas, apesar dos benefícios econômicos e à saúde, a transição energética avança devagar devido à inércia regulatória, disputas políticas e falta de investimento.
Nos Estados Unidos, por exemplo, grandes projetos de energia levam em média 4,5 anos só para serem licenciados. Aprovar novas linhas de transmissão pode levar 10 anos ou mais. Como boa parte dos novos projetos é de energia solar, esses atrasos acabam travando a transição energética.

Nos países em desenvolvimento, o desafio é ainda maior. A Agência Internacional de Energia prevê que essas economias responderão por 85% do aumento da demanda energética entre 2025 e 2027. Mesmo assim, o avanço das energias limpas é lento. O principal motivo é o alto custo de financiamento.
Em muitos desses países, construir parques eólicos e solares é mais caro do que financiar usinas a carvão ou gás. Esses projetos fósseis têm décadas de mecanismos financeiros e regulatórios consolidados para reduzir riscos aos credores.
Isso inclui garantias de pagamento do governo, contratos estáveis e acordos de receita de longo prazo que dão segurança aos financiadores. Já no caso de projetos de energia renovável, governos e credores ainda têm pouca experiência.
Migrar a matriz energética global para fontes renováveis permitiria cortar cerca de metade das emissões atuais.
Como consequência, esses projetos tendem a ter menos garantias, o que aumenta o risco para os credores e eleva as taxas de juros. Isso torna os projetos renováveis mais caros no início, mesmo que, ao longo de sua vida útil, eles sejam mais baratos.
Para reduzir o custo do financiamento, governos e bancos de desenvolvimento podem adotar medidas que tornem esses projetos mais seguros para investidores, como manter políticas estáveis e usar recursos públicos ou seguros para cobrir parte dos riscos.
Quando os investidores têm a confiança de que serão pagos, os juros caem significativamente – e a energia limpa rapidamente se tornaria a opção mais barata.
Sem cooperação internacional para reduzir o custo do financiamento, países em desenvolvimento correm o risco de ficar de fora da transição energética e acabar presos, por décadas, a mais emissões de combustíveis fósseis, agravando ainda mais a crise climática.
O CAMINHO À FRENTE
Para evitar os piores efeitos das mudanças climáticas, os países concordaram em reduzir suas emissões de gases de efeito estufa nas próximas décadas. Cumprir esse objetivo não será simples, mas tornou-se bem menos difícil agora que a energia renovável se mostra mais acessível, a longo prazo, do que os combustíveis fósseis.
Migrar a matriz energética global para fontes renováveis e eletrificar edifícios e o transporte local permitiria cortar cerca de metade das emissões atuais. A outra metade vem de setores onde a redução é muito mais complexa — produção de aço, cimento e produtos químicos, aviação e transporte marítimo, além de agricultura e uso da terra.

Soluções estão sendo desenvolvidas, mas ainda precisam de tempo para amadurecer. Boa governança, apoio político e financiamento acessível serão igualmente essenciais nesses setores.
A transição para a energia renovável oferece grandes benefícios econômicos e de saúde, além de reduzir os riscos climáticos — desde que os países consigam superar obstáculos políticos internos e cooperar para ampliar o financiamento destinado às economias em desenvolvimento.
Este artigo foi republicado do “The Conversation” sob licença Creative Commons. Leia o artigo original.