O que o México tem a ganhar com uma presidente que é cientista climática

Claudia Sheinbaum participou da elaboração de relatórios internacionais sobre o clima. Agora, ela lidera um dos maiores países petrolíferos do mundo

Créditos: Jorge Aguilar/ Unsplash/ Freepik

Adele Peters 4 minutos de leitura

No México, a mudança climática nunca foi tão evidente. Nas últimas semanas, uma onda de calor violenta provocou a morte de dezenas de pessoas. Macacos bugios caíram mortos das árvores, vítimas de insolação. Quase dois terços do país enfrentam seca e a Cidade do México está a poucas semanas de ficar sem água.

Em uma vila de pescadores chamada El Bosque, o aumento do nível do mar obrigou os moradores a abandonar suas casas. Em outubro de 2023, quando o furacão Otis – o mais forte da história do país – atingiu Acapulco, os prejuízos causados foram de bilhões de dólares.

A recém-eleita presidente do México, Claudia Sheinbaum, está muito atenta a esse problema e ao tanto que precisa ser feito para resolvê-lo: além de política, ela também é cientista climática.

Seu currículo não convencional é “muito significante, porque ela entende como a agenda internacional [climática] foi construída”, avalia José Luis Samaniego, diretor executivo da organização ambiental sem fins lucrativos WRI México. “Ela é especialista em questões de mudanças climáticas relacionadas à energia e, portanto, entende as suas implicações.

Crédito: agência.gov

Sheinbaum, que até o ano passado era prefeita da Cidade do México, tem doutorado em engenharia de energia e concluiu seus estudos no Laboratório Nacional Lawrence Berkeley, na Califórnia. 

Ela contribuiu para os relatórios do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, que ganhou um Prêmio Nobel em 2007 (ao lado de Al Gore) por seu trabalho para aumentar a compreensão da crise climática.

Como prefeita, ela impulsionou a instalação de mais painéis solares nos telhados da capital mexicana e a melhoria da infraestrutura de bicicletas e do transporte público. Como presidente, planeja ampliar o uso de energia renovável. Isso inclui aproveitar o enorme suprimento de energia geotérmica do país para produzir hidrogênio verde.

REDUÇÃO DE COMBUSTÍVEIS FÓSSEIS

Como a maioria dos países, o México não tem agido rápido o suficiente para reduzir as emissões. O Climate Actio Tracker (Rastreador de Ação Climática), projeto que estuda a ação climática nacional, atribui às políticas do país uma classificação “gravemente insuficiente”. O país ainda não definiu uma meta para atingir emissões líquidas zero.

No ano passado, a geração de eletricidade a partir de combustíveis fósseis atingiu um recorde. Isso se deve, em parte, ao fato de que a seca persistente fez com que a produção de energia hidrelétrica do país caísse drasticamente.

A nova presidente, que até o ano passado era prefeita da Cidade do México, tem doutorado em engenharia de energia.

Mas o antecessor de Sheinbaum, Andrés Manuel López Obrador, também investiu pesadamente em combustíveis fósseis, apesar do enorme potencial do país para outras energias renováveis, inclusive a solar.

“A população mexicana já está sofrendo com eventos climáticos extremos e está sujeita a continuar sofrendo, a menos que sejam priorizadas políticas e ações para se afastar dos combustíveis fósseis, em uma transição justa e equitativa”, diz Maria Jose de Villafranca Casas, analista do México para o New Climate Institute, uma das organizações sem fins lucrativos por trás do Climate Action Tracker.

“A expectativa é que as projeções de emissões sob as políticas atuais continuem a aumentar até 2030 e mesmo depois disso, a não ser que as políticas existentes sejam aplicadas e novas políticas sejam introduzidas.”

Cidade do México (Crédito: Wikimedia Commons)

Ainda não está claro com que rapidez Sheinbaum pretende agir. Como pupila do ex-presidente, ela defendeu os investimentos dele em combustíveis fósseis. Mas também declarou que seu objetivo é fazer com que o México tenha 50% de eletricidade sem carbono até 2030.

É um grande salto, mas alguns cientistas calculam que o país precisaria chegar a 86% de energias renováveis até 2030 para ser capaz de manter o aquecimento global abaixo de 1,5ºC – a meta do acordo climático de Paris.

“Há uma crença generalizada, sem muito fundamento, de que Claudia seria apenas uma continuação da administração anterior, mas acho que ela será muito mais eficiente do que López Obrador. E isso vai ampliar radicalmente a atenção que damos ao meio ambiente e às energias renováveis no México”, diz Villafranca Casas.

 A mudança é positiva não apenas para o México, é claro, mas para o mundo todo. Vale lembrar que o país foi o nono maior emissor de gases de efeito estufa do planeta em 2022.


SOBRE A AUTORA

Adele Peters é redatora da Fast Company. Ela se concentra em fazer reportagens para solucionar alguns dos maiores problemas do mundo, ... saiba mais