Para evitar acusações de greenwashing, empresas adotam o green hushing

O termo greenwashing se tornou comum. Mas agora surgiu o "green hushing"’, para se referir a empresas que não divulgam suas ações ambientais

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Talib Visram 4 minutos de leitura

O termo greenwashing – que se refere a empresas que exageram ao divulgar suas ações sustentáveis – agora faz parte do nosso vocabulário. Mas estas alegações falsas geram muita indignação, sem mencionar ações judiciais.

Diante da possibilidade de ter sua reputação manchada e enfrentar problemas legais, algumas organizações passaram a não comunicar suas metas climáticas.

Essa nova prática recebeu o nome de green hushing. A expressão se refere a empresas que propositalmente mantêm silêncio sobre suas metas de sustentabilidade, mesmo que sejam bem-intencionadas e plausíveis, por medo de serem acusadas de greenwashing.

Xavier Font, professor de marketing de sustentabilidade na Universidade de Surrey, no Reino Unido, define este fenômeno como uma “minimização deliberada de práticas de sustentabilidade por medo de que isso faça a empresa parecer menos competente ou que sofra uma consequência negativa”.

O QUÃO COMUM É ESSA PRÁTICA?

O termo existe desde pelo menos 2017. Font havia ouvido a expressão apenas uma vez antes de estudar o tema mais a fundo

Diante da possibilidade de ter sua reputação manchada, algumas organizações passaram a não comunicar suas metas climáticas.

naquele ano. Apesar de muitos de nós nunca termos ouvido falar sobre isso, é algo bastante comum. “O greenwashing é visível. Já o green hushing, por definição, não é. [Mas] acredito que aconteça com mais frequência do que imaginamos”, diz Font.

A prática se tornou mais conhecida em outubro de 2022, quando a South Pole, empresa suíça de consultoria de financiamento de carbono, destacou a tendência em um relatório. Ela descobriu que quase um quarto das 1,2 mil empresas com foco em sustentabilidade não anunciam seus resultados “além do mínimo”.

No relatório, a tendência é classificada como “preocupante”, porque divulgar ações "verdes" tem o poder de inspirar outras pessoas, mudar mentalidades e encorajar abordagens colaborativas.

COMO FUNCIONA?

Em seu estudo, Font, que se concentra na indústria do turismo, descobriu que as empresas não estavam comunicando resultados ambientais aos consumidores. Isso é especialmente estranho em um setor onde há muitas oportunidades de fazê-lo, como em hotéis ou sites.

O estudo se concentrou em 31 pequenas empresas de turismo rural no Parque Nacional de Peak District, na Inglaterra. Font descobriu que elas comunicavam apenas 30% de suas ações de sustentabilidade. O receio era de que, ao divulgá-las, os clientes acreditassem que suas experiências de férias seriam piores.

O problema é que muitos não sabem quando anunciar suas ações. Uma rede de hotéis com a qual ele trabalhou fechou contrato com uma empresa de frutos do mar sustentáveis, mas não sabia se deveria divulgar o fato imediatamente ou se deveria esperar até que pelo menos metade das unidades passassem a usar o produto, ou mesmo todas.

empresas que discutem suas ações climáticas podem ter efeitos indiretos positivos e criar mudanças. Mas não se ficarem em silêncio.

“Se 50% delas usam o produto, é seguro anunciar?”, questionou-se. “Muitas empresas estão optando por não dizer nada por medo de que os clientes vejam o copo meio vazio, não meio cheio”, diz ele.

Para empresas maiores, existem razões legais para não divulgar ações ostensivamente. Nos últimos anos, a Dasani sofreu processos por alegar que suas garrafas de água eram 100% recicláveis e a Kroger por dizer que seu protetor solar não causava danos a recifes de corais.

QUE OUTRAS FORÇAS ESTÃO EM JOGO?

Como na Europa, as empresas norte-americanas estão sofrendo pressão de grupos ambientalistas para acabar com o greenwashing. Mas, nos EUA, elas também precisam se preocupar com a crescente politização da crise climática e da governança ambiental e social (ESG).

Vários estados, especialmente a Flórida, estão retirando investimentos da BlackRock porque a gestora de fundos desenvolveu fortes portfólios ESG. E isso acabou virando mais um motivo para as empresas ficarem em silêncio.

Essa polarização é preocupante, diz Font, porque se infiltra nas crenças dos clientes, fazendo com que as empresas precisem ficar atentas aos mercados em que operam.

QUAIS SÃO AS CONSEQUÊNCIAS?

Como observou o relatório da South Pole, empresas que discutem suas ações climáticas podem ter efeitos indiretos positivos e criar mudanças. Mas não se ficarem em silêncio.

Reprimir o greenwashing é necessário, mas isso não pode ser feito indiscriminadamente. Há uma tendência de atacar empresas, não importa quão boas sejam suas ações ou intenções – o que fez surgir um outro termo na mídia alemã: “greenwashing trueer”, para se referir a pessoas que fazem esse tipo de acusação.

Na França, novas leis irão impor multas às empresas por fazerem alegações enganosas, como serem neutras em carbono, por exemplo. Embora bem-intencionadas, essas leis podem servir para reduzir o greenwashing, mas aumentar o green hushing.


SOBRE O AUTOR

Talib Visram escreve para a Fast Company e é apresentador do podcast World Changing Ideas. saiba mais