Patrocinadores da Semana do Clima usam evento para praticar greenwashing
Os principais poluidores plásticos e facilitadores da destruição climática garantiram posições de destaque na lista de patrocinadores
No último domingo (17 de setembro), teve início o tão aguardado evento que reúne executivos, membros de ONGs e autoridades governamentais para “impulsionar a transição, acelerar o progresso e apoiar as mudanças que já estão acontecendo”. A Semana do Clima de Nova York é organizada todos os anos em parceria com a Assembleia Geral das Nações Unidas.
O tema desta edição parece partir da premissa de que o setor corporativo já está liderando a ação climática. Como principal parceira do evento, a Saint-Gobain tem a oportunidade de conduzir discussões, como o “Diálogo sobre Construção Sustentável”, dedicado a “preservar o nosso planeta, fornecendo moradias confortáveis e dignas a todos” e “desenvolver uma resposta abrangente às mudanças climáticas”.
Mas a história da companhia em Nova York é bem diferente. Em 2016, os moradores de Hoosick Falls entraram com uma ação coletiva contra a Saint-Gobain, a 3M e a Honeywell por poluírem o suprimento de água local. Essa ação resultou em um acordo de US$ 65 milhões por danos e monitoramento médico de longo prazo para cerca de 1,8 mil residentes e proprietários de imóveis.
Em 2021, um ex-advogado interno da Saint-Gobain Performance Plastics denunciou a empresa ao Departamento de Trabalho dos EUA, revelando como a companhia enganou reguladores em Bennington, Hoosick Falls e Merrimack sobre o uso de produtos químicos tóxicos.
Apesar disso, ela continua sendo a principal parceira da Semana do Clima. Uma porta-voz disse à “ExxonKnews” que o evento “mobiliza atores comprometidos de todo o mundo para construir um futuro sustentável para o planeta e para as pessoas que vivem nele” e que “está alinhado com o propósito da Saint-Gobain, ‘tornar o mundo um lugar melhor’, e com suas ações".
A porta-voz também destacou que “quase 75% das vendas da empresa estão relacionadas ao desenvolvimento sustentável”, incluindo o desenvolvimento de “tecnologias pioneiras, como a produção de vidro e gesso com emissão zero de carbono”, e seu objetivo de alcançar a “neutralidade de carbono até 2050”.
No entanto, Judith Enck, presidente da Beyond Plastics e ex-administradora regional da Agência de Proteção Ambiental dos EUA, considera esse patrocínio “um insulto” aos residentes de Hoosick Falls, Merrimack e Bennington. “É totalmente inaceitável”, diz ela.
A LISTA CONTINUA
Gostaria de poder dizer que a Saint-Gobain é a única patrocinadora questionável da Semana do Clima deste ano, mas não é. Outra escolha surpreendente foi a McKinsey Sustainability, um braço da empresa global de consultoria McKinsey & Company.
A companhia lucrou substancialmente aconselhando pelo menos 43 dos 100 maiores poluidores corporativos nas últimas cinco décadas – incluindo Exxon, BP, Chevron e Saudi Aramco –, ajudando-os a “levantar dúvidas em relação às mudanças climáticas em prol de sua incessante e voraz busca por mais riqueza”, argumenta uma ação judicial movida contra a empresa.
Apesar de prometerem reduzir sua poluição, empresas têm consistentemente feito lobby contra projetos de lei que visam diminuir o desperdício de plástico.
“As alegações da McKinsey sobre seu compromisso com a proteção ambiental contrastam fortemente com os milhões de dólares que ela ganhou auxiliando seus clientes dos setores de combustíveis fósseis e mineração a produzir argumentos que negam a existência e a gravidade das [mudanças climáticas]”, diz a denúncia.
No site da empresa, a McKinsey repete argumentos enganosos da indústria e nega a urgência de abandonar os combustíveis fósseis. “De acordo com a Perspectiva Global de Energia 2022 da McKinsey, combustíveis fósseis, como petróleo e gás natural, continuarão a desempenhar um papel significativo na matriz energética até 2050, em parte devido à forma como combinam acessibilidade e segurança de abastecimento”, afirma um artigo de fevereiro.
Além disso, está ajudando empresas de combustíveis fósseis e produtos químicos a enganar o público sobre a reciclagem de plásticos. Até 2021, a McKinsey recebeu financiamento da Alliance to End Plastic Waste, um grupo de fachada financiado pelo American Chemistry Council e liderado por executivos de grandes empresas do setor de petróleo e gás, para a sua iniciativa “Repensando a Reciclagem”.
Este projeto destaca investimentos em infraestrutura de reciclagem em países do Sul Global e, de forma implícita, transfere a responsabilidade pela poluição causada pelo plástico para a falta de reciclagem nesses locais. Como uma empresa desse tipo pode não só ser bem-vinda na Semana do Clima, como também associar seu nome e logotipo ao evento?
PepsiCo, Nestlé e Unilever, que estiveram entre as cinco piores poluidoras de plástico no ano passado, de acordo com a auditoria anual de 2022 da Break Free From Plastic, também estão na lista de patrocinadores. Apesar de prometerem reduzir sua poluição, elas têm consistentemente feito lobby contra projetos de lei que visam diminuir o desperdício de plástico.
“Essas empresas são poluidoras de plástico e não deveriam ser copatrocinadoras de um evento como este – na verdade, deveríamos estar protestando na frente de suas sedes contra a forma como estão agravando a crise climática”, argumenta Judith Enck. “É como se a indústria do tabaco fosse patrocinadora de uma conferência sobre doenças respiratórias.”
Este artigo foi publicado originalmente no ExxonKnews, um projeto do Center for Climate Integrity.