Por que a reunião da ONU sobre o plástico terminou de forma decepcionante
As nações que participam do Comitê Intergovernamental de Negociação da ONU só conseguiram concordar em retomar as negociações mais adiante
Os países que negociam um tratado global para conter a poluição plástica não conseguiram chegar a um acordo na quinta reunião do Comitê Intergovernamental de Negociação da ONU (INC-5). Mesmo com mais de 100 nações querendo limitar a produção, um punhado de produtores de petróleo estava disposto apenas a focar no lixo plástico.
Encerrada no domingo (dia 1º), em Busan, na Coreia do Sul, a reunião do INC-5 contou com a participação de representantes de mais de 170 países. O objetivo era chegar a um tratado global juridicamente vinculativo, sendo essa a última reunião prevista.
No entanto, os países continuaram muito distantes de um acordo sobre o escopo básico do tratado e só conseguiram concordar em adiar decisões-chave e retomar as negociações em uma data posterior.
"Está claro que ainda há divergências persistentes", disse Inger Andersen, diretora executiva do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente. Os pontos que provocam as maiores resistências são a limitação da produção de plástico, o gerenciamento de produtos plásticos e de produtos químicos sensíveis, além do financiamento para ajudar os países em desenvolvimento a implementar o tratado.
A divisão ficou clara em um documento divulgado no domingo pelo presidente da reunião, Luis Vayas Valdivieso, que pode formar a base de um tratado, mas continua em aberto sobre as questões mais sensíveis.
"Um tratado que dependa apenas de medidas voluntárias não seria aceitável", disse Juliet Kabera, diretora geral da Autoridade de Gestão Ambiental de Ruanda. "É hora de levar isso a sério e negociar um tratado que seja adequado aos nossos propósitos, e não construído para dar errado."
Um pequeno número de nações produtoras de petroquímicos, como a Arábia Saudita, se opôs fortemente aos esforços para reduzir a produção de plástico e tentou usar táticas burocráticas para atrasar as negociações.
"Nunca houve consenso", disse o delegado saudita Abdulrahman Al Gwaiz. "Há alguns artigos que de alguma forma parecem entrar no documento, apesar da nossa insistência de que não estão dentro do escopo."
China, Estados Unidos, Índia, Coreia do Sul e Arábia Saudita foram as cinco principais nações produtoras de polímeros primários em 2023, segundo a empresa de pesquisa Eunomia.
DECEPÇÃO NA COP 29
Se essas divisões tivessem sido superadas, o tratado teria sido um dos acordos mais significativos relacionados à proteção ambiental desde o Acordo de Paris de 2015.
O adiamento ocorre apenas alguns dias após a conclusão da cúpula COP29 em Baku, no Azerbaijão. Na conferência das Nações Unidas sobre o Clima, os países estabeleceram uma nova meta global para mobilizar US$ 300 bilhões por ano em financiamento climático, um acordo considerado insuficiente por pequenos estados insulares e por muitos países em desenvolvimento.
As negociações também foram retardadas por manobras da Arábia Saudita, que se opôs à inclusão de linguagem que reafirmasse um compromisso anterior de transição para energia limpa. Negociadores disseram que alguns países se valeram de procedimentos para travar as conversas, usando o processo de consenso da ONU.
No caso da discussão sobre o plástico, o grupo ambiental GAIA afirmou que "há pouca garantia de que o próximo INC terá sucesso onde o INC-5 falhou".
"Este resultado ressalta a complexidade de abordar a poluição plástica em uma escala global e a necessidade de mais negociações para alcançar um tratado eficaz, inclusivo e viável", disse Chris Jahn, secretário do conselho do Conselho Internacional de Associações de Química (ICCA), representando os fabricantes de plásticos.
A produção de plástico está a caminho de triplicar até 2050. Microplásticos foram encontrados no ar, em produtos frescos e até no leite materno. Segundo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, que mulheres e crianças são particularmente suscetíveis aos produtos químicos tóxicos incluídos na composição dos plásticos.
Apesar do adiamento, vários negociadores expressaram urgência em retomar as negociações. "Cada dia de atraso é um dia contra a humanidade. Adiar as negociações não adia a crise", disse Juan Carlos Monterrey Gomez, chefe da delegação do Panamá.