Por que se preocupar com a onda de calor que vem devastando os corais

Assim como os humanos, os corais podem suportar um certo grau de estresse, mas quanto mais prolongado for, mais danos ele poderá causar

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Ian Enochs 4 minutos de leitura

Em meados de julho, as águas do sul da Flórida registraram temperaturas acima de 32ºC, e os cientistas já estão observando sinais de branqueamento de corais na América Central e do Sul. Se esse calor extremo persistir, as consequências podem ser devastadoras.

Assim como os humanos, os corais podem suportar um certo grau de estresse, mas, quanto mais prolongado for, mais danos ele poderá causar. Por sua própria natureza, os corais não conseguem se deslocar para áreas mais frias quando as temperaturas da água alcançam níveis perigosos. Para espécies particularmente sensíveis ao estresse térmico, isso pode ser devastador.

Os ecossistemas de recifes de coral saudáveis são importantes de várias maneiras. Infelizmente, as ondas de calor marinhas estão se tornando mais comuns e extremas, o que pode ter graves consequências para recifes já fragilizados ao redor do mundo.

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A IMPORTÂNCIA DOS RECIFES DE CORAL

Os recifes de coral são verdadeiros pontos de biodiversidade. Comumente conhecidos como “florestas tropicais do mar”, abrigam as maiores concentrações de espécies no oceano.

Recifes saudáveis são ecossistemas vibrantes que suportam a vida marinha e a pesca, que, por sua vez, sustentam economias e fornecem alimentos para milhões de pessoas. Além disso, geram bilhões de dólares em atividades econômicas a cada ano, graças ao turismo.

E isso não é tudo: também desempenham um papel importante na proteção das linhas costeiras, praias e infraestruturas, ajudando a atenuar a força das ondas, especialmente durante tempestades e furacões.

Contudo, são extremamente sensíveis ao aumento da temperatura da água. Os recifes abrigam uma alga simbiótica microscópica chamada zooxantela, que realiza fotossíntese e os fornece alimento. Quando a água fica excessivamente quente por um longo período, as zooxantelas deixam os corais, tornando-os pálidos ou brancos – um processo conhecido como “branqueamento”.

Cerca de 40% dos mares enfrentaram uma onda de calor em julho de 2023. As previsões da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos EUA para agosto e outubro indicam temperaturas da superfície do mar bem acima da média em muitas regiões (Crédito: NOAA PSL)

Se o branqueamento persistir, os corais podem perder energia e, em última instância, morrer. Quando morrem ou seu crescimento diminui, esses belos e complexos habitats começam a desaparecer, podendo erodir e se transformar em areia.

Infelizmente, estes habitats estão em declínio em todo o mundo devido a eventos extremos de branqueamento, doenças e diversos outros fatores de estresse causados ​​pela atividade humana. No arquipélago Flórida Keys, a sudeste do estado norte-americano, a cobertura de coral diminuiu cerca de 90% nas últimas décadas.

BRANQUEAMENTO DE CORAIS EM 2023

No Porto de Miami, onde encontramos recifes particularmente resilientes, a doutoranda Allyson DeMerlis documentou o primeiro caso de branqueamento dos corais implantados em seu experimento, em 11 de julho de 2023.

Outros cientistas também relataram branqueamento no leste do Pacífico, em países como Colômbia, El Salvador, Costa Rica e México, assim como ao longo das costas caribenhas do Panamá, México e Belize.

Ainda não testemunhamos uma morte generalizada de corais associada a essa onda de calor marinha específica, o que indica a possibilidade de recuperação caso as temperaturas da superfície da água diminuam em breve.

Temperaturas na superfície do mar no sul da Flórida anormalmente altas em julho de 2023 (Crédito: Coral Reef Watch/ NOAA]

No entanto, as temperaturas estão atingindo níveis recordes, e grande parte do Atlântico e do leste do Pacífico estão sob alerta de branqueamento. Neste momento, as evidências apontam para a possibilidade de um resultado muito negativo.

O El Niño está contribuindo para o problema este ano, mas as tendências de longo prazo do aumento do calor dos oceanos são impulsionadas pelo aquecimento global causado pela atividade humana.

O QUE FAZER PARA PROTEGER OS CORAIS?

Primeiramente, não podemos desistir dos corais.

Recentemente, a cientista Alice Webb, publicou um estudo com base em anos de pesquisa no arquipélago Flórida Keys. Ela modelou a persistência dos habitats de recifes em diferentes cenários climáticos, de restauração e de adaptação.

Um coral transplantado no porto de Miami, saudável no início de 2023 e "branqueado" em julho, por conta do aumento da temperatura da água (Crédito: NOAA/ Universidade de Miami)

Sua conclusão foi de que protegê-los exigirá um esforço conjunto – restauração ativa de recifes, auxiliando os corais a se aclimatarem ou se adaptarem às mudanças de temperatura e, principalmente, redução das emissões de gases de efeito estufa.

O branqueamento em larga escala só começou a ser documentado no início da década de 1980. Quando converso com pessoas que pescam e mergulham nas ilhas que compõem as Flórida Keys desde antes de eu nascer, elas têm histórias incríveis sobre o quão vibrantes os recifes costumavam ser. Viram em primeira mão o quanto as coisas pioraram ao longo do tempo.

Atualmente, não existe uma solução milagrosa única, mas ignorar os danos não é uma opção. Simplesmente há muito em jogo.

Este artigo foi publicado originalmente no The Conversation e reproduzido sob licença Creative Commons. Leia o artigo original.


SOBRE O AUTOR

Ian Enochs é pesquisador ecologista da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos EUA (NOAA). saiba mais