Quem ainda conta calorias? A onda agora é contabilizar sua emissão de CO2
Consumidores bem-informados podem pressionar as empresas a serem mais transparentes
Você se lembra da febre de contagem de calorias que surgiu na década de 1990 e no início dos anos 2000? O que começou como uma mania do universo das dietas acabou se tornando uma política pública nos EUA.
Em 2010, grandes cidades como Nova York e Filadélfia exigiram que os restaurantes listassem a contagem de calorias nos cardápios. Em 2018, a FDA começou a exigir que cadeias de restaurantes e estabelecimentos alimentícios publicassem as quantidades de calorias.
No Reino Unido, desde abril de 2022, passou a ser exigido que as informações sobre calorias sejam exibidas nos cardápios. Estima-se que essas regulamentações possam gerar um benefício de £5,5 bilhões graças à redução dos custos com saúde e ao aumento da participação no mercado de trabalho.
As regras são de grande ajuda para uma maior conscientização do consumidor: quando as pessoas têm acesso a melhores informações, conseguem fazer escolhas mais saudáveis. E as empresas têm mais dificuldade de se livrar das responsabilidades pelas suas próprias decisões ruins.
Agora, no esforço para frear a mudança climática, os consumidores estão sendo instruídos com um conjunto diferente de informações nos produtos: contagens de carbono.
"Não se trata de saber se todo mundo sabe o que é um grama de carbono. Trata-se de desenvolver a competência cultural e o letramento em torno do carbono de forma semelhante à que fizemos em relação às calorias", explica um executivo da Numi Tea.
Fundada em 1999 pelos irmãos Ahmed Rahim e Reem Hassani, a Numi vende chás de origem sustentável inspirados no tradicional chá de tília que eles bebiam quando eram crianças, no Iraque. A embalagem inclui um rótulo que indica a pegada de carbono e contabiliza as emissões na embalagem, no transporte e na preparação.
Listar todas essas partes da cadeia de valor foi importante porque "as maiores fontes de nossas emissões de gases de efeito estufa são o transporte e o uso do produto. O simples fato de ferver a água pode consumir o dobro da quantidade de energia necessária para colocar o chá no saquinho e levá-lo à sua porta, dependendo da fonte de energia", comparam os irmãos Hassani.
A Just Salad, uma cadeia de restaurantes fast-casual de Nova York, adotou medidas semelhantes. Todo o seu cardápio é rotulado de acordo com a emissão de carbono; em outras palavras, os rótulos indicam a quantidade de carbono gasta para produzir cada prato.
O processo de avaliação das emissões em um nível detalhado resultou em mudanças nos ingredientes usados em suas saladas, e eles agora oferecem um cardápio "climático".
Fora do setor de alimentos, podemos citar a Allbirds, fabricante de calçados e roupas sustentáveis que rotula cada um de seus produtos com uma etiqueta de pegada de carbono que inclui tudo, desde o desenvolvimento do produto até o descarte.
"Baseamos a mensagem e a narrativa em torno dessa pegada por produto, porque ela se alinha com a etiqueta que você vê em nossas embalagens. O que isso significa, na prática, é que, em 2030, essa etiqueta produto será inferior a um quilo de CO2 por produto", diz Hana Kajimura, gerente de sustentabilidade da Allbirds.
Pesquisas demonstraram que os consumidores subestimam a pegada de carbono dos alimentos, e a rotulagem pode ajudar a evitar isso. Quanto mais as pessoas souberem das consequências de escolher batatas fritas em vez de frutas, ou fast fashion em vez de moda sustentável, mais elas vão refletir sobre suas escolhas.
É claro que há custos para as empresas, tanto em termos de sinalização quanto de reputação. Mas, a longo prazo, isso pode levar a mudanças positivas em várias áreas além da conscientização do consumidor.
Por exemplo, a identificação das pegadas de carbono das empresas as educa e, ao fazê-lo, leva a um maior rigor e a padrões mais rígidos nos processos comerciais.
Trata-se de desenvolver a competência cultural e o letramento sobre carbono como fizemos em relação às calorias.
A rotulagem não é uma panaceia, é claro. Nas mãos erradas, é uma forma de as empresas estimularem o público a priorizar as responsabilidades individuais, de modo que deixemos de fazer perguntas mais duras sobre as empresas.
Foi isso que a BP (British Petroleum Company) fez quando popularizou o termo "pegada de carbono". Em vez de se concentrar na descarbonização de suas próprias operações, em 2004 a BP criou uma calculadora online de pegada de carbono, dando a entender sutilmente que a redução era responsabilidade do consumidor, e não da empresa.
É importante reconhecer que, por mais assíduos que sejam os consumidores na redução de sua pegada individual de carbono, não há muito que eles possam fazer.
Exigir transparência e honestidade quando se trata de emissões de carbono é o primeiro passo não apenas para nos educarmos, mas também para criarmos mecanismos governamentais e corporativos para uma mudança mais profunda e duradoura.
Adaptado de "The Profiteers: How Business Privatizes Profits and Socializes Costs" (Como as empresas privatizam os lucros e socializam os custos), de Christopher Marquis, publicado pela PublicAffairs.